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Liége Rocha: As mulheres e as transformações da última década

Parte 1
Para avançar nas mudanças é fundamental a participação das mulheres e para continuar na caminhada das transformações é necessário fazer um balanço destes dez anos dos governos Lula e Dilma, como propõe as teses do nosso 13º Congresso.
Por Liége Rocha*

O balanço que aqui pretendo apresentar diz respeito às conquistas das mulheres nos governos democráticos e no âmbito do Partido nesta última década, como também os desafios que temos a enfrentar.

A realidade da mulher brasileira vem se modificando a olhos vistos com o seu ingresso massivo no mercado de trabalho, nas universidades e nos espaços públicos, anteriormente considerados de domínio masculino. Têm uma expectativa de vida superior a dos homens, convivem com a queda da taxa de fecundidade e chefiam quase 40% das famílias brasileiras. Conquistaram o direito de escolher uma carreira profissional, se querem ou não casar e com quem, se com homem ou com mulher, se querem ou não ter filhos e quando. Representam a maioria do colégio eleitoral, por isso podem decidir uma eleição. Mas ainda sofrem preconceitos e discriminações.

Em outubro de 1988, 25 anos atrás, aconteceu a promulgação da Constituição Brasileira, considerada uma das mais avançadas no mundo, no que diz respeito à garantia dos direitos da mulher. Mas as vozes femininas através dos anos clamavam que não bastava estar na lei, mas era necessário estar na vida das mulheres.

Com a eleição de Lula em 2002, um dos seus primeiros atos como presidente foi, no dia 1º de janeiro de 2003, criar a Secretaria de Políticas para as Mulheres, reivindicação já expressa no seminário “Políticas Públicas Sob a Ótica de Gênero”, realizado em 1994, no Rio de Janeiro, durante o processo preparatório para a 5° Conferência Mundial sobre a Mulher, promovida pela ONU, que aconteceu em 1995, em Beijing-China.

A criação da SPM/PR possibilitou a garantia da transversalidade de gênero nas políticas públicas implementadas pelos vários ministérios, expressas no Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, aprovado na I Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, e atualizado nas outras duas edições da CNPM, que mobilizaram mais de 500 mil participantes.

Foram várias as realizações da SPM e governos de Lula e Dilma, uma das primeiras foi a reestruturação do CNDM – Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, importante instrumento de controle social que, desde sua criação em 1985, estava alocado no Ministério da Justiça, passando então para a estrutura da Secretaria.

Além do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres a SPM elaborou o Programa Nacional de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher e, cumprindo seu papel articulador no governo e efetivando a transversalidade de gênero nas políticas públicas, esteve junto ao Ministério da Saúde no Plano Nacional pela Redução da Mortalidade Materna, na elaboração da Notificação Compulsória para a violência contra a Mulher, na construção da política” Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos: Uma Prioridade do Governo”. Contribuiu com a elaboração do Programa Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, assim como o Programa Nacional de Enfrentamento à Violência Contra o Idoso. Em todas as discussões em nível do governo federal a SPM imprimiu a ótica de gênero nas políticas públicas.

Acatando sugestão de um consórcio de entidades do movimento feminista brasileiro a SPM coordenou todo o processo de elaboração da Lei Maria da Penha, instrumento importante de combate a violência contra a mulher e que neste ano completa sete anos de existência.

Instituiu através Portaria a Comissão Tripartite para revisar a legislação punitiva sobre o aborto (2005) e, após a II Conferência, articulou o Fórum Nacional de Instâncias de Mulheres dos Partidos Políticos que, entre outras atividades vem desenvolvendo a campanha “Mais Mulheres no Poder” a cada ano eleitoral, divulgando plataforma para os candidatos com as reivindicações das mulheres. Este Fórum participou ativamente no processo da discussão da reforma política, tendo integrado a Comissão Tripartite, instituída através de Portaria da SPM, de junho de 2009, para revisão da Lei 9.504/1997. Integraram esta Comissão 3 comunistas: Vanessa Grazziotin, uma das representantes do Parlamento; Raquel Guisoni, representando o CNDM – Conselho Nacional dos Direitos da Mulher e Liège Rocha, representando o Fórum Nacional de Instâncias de Mulheres dos Partidos Políticos.

A mini-reforma, aprovada em 2009, que além de garantir 5% dos recursos do Fundo Partidário para a promoção das mulheres na política e 10% do tempo de TV da propaganda partidária para as mulheres, determina que os partidos têm que preencher na sua lista de candidaturas um mínimo de 30% e máximo de 70% por sexo. Elegemos, em 2010, pela primeira vez na história do Brasil uma presidenta mulher, Dilma Rousseff, mas apenas atingimos 9% de mulheres eleitas na Câmara Federal e somente 12,3% no Senado.

Nas últimas eleições de 2012, só foram eleitas 13% de vereadoras em todo o país. Como podemos falar de democracia se mais da metade da população brasileira está sub-representada nos espaços de poder e decisão?

A Presidenta Dilma tem dado continuidade aos programas sociais impulsionados pelo governo Lula, como Luz para Todos, Bolsa Família, que beneficiam diretamente às mulheres, e, no primeiro ano de sua gestão, criou o Programa Rede Cegonha visando diminuir as altas taxas de mortalidade materna, vem desenvolvendo campanha de combate ao câncer e mama e de colo de útero. No corrente ano lançou, através da SPM, a campanha “Mulher Viver sem Violência” e a implantação da Casa da Mulher Brasileira, em todas as capitais, onde serão oferecidos um conjunto de serviços para as mulheres.

Foram várias as conquistas nestes 10 anos, mas ainda temos desafios; superar a sub-representação das mulheres, de conquistar a equidade no mundo do trabalho, de minimizar a sobrecarga da dupla jornada de trabalho, de ver a Lei Maria da Penha ser implementada de fato para que não haja mais mulheres vítimas de violência, de que não tenhamos mais mortes maternas, que o Estado laico seja uma realidade para que possamos ter os direitos sexuais e reprodutivos garantidos e respeitados.

* Liége Rocha é Secretária Nacional da Mulher e Membro Comitê Central.