André Tokarski: O povo na rua é capaz de grandes vitórias
Ao apresentar as teses do 13º Congresso do PCdoB, na Conferência Municipal do partido no Recife, André Tokarski (foto), presidente nacional da União da Juventude Socialista (UJS), destacou questões importantes como a transição democrática, a crise do capitalismo, a integração da América Latina, os rumos do Brasil e o papel do partido na construção de um novo projeto nacional de desenvolvimento.
Publicado 09/10/2013 09:18 | Editado 04/03/2020 16:56
Leia abaixo a íntegra do discurso.
"Nosso Congresso tem as suas teses divididas em dois grandes temas. O primeiro tema trata da atualização do balanço do partido sobre os dez anos de governos democráticos a partir da eleição de Lula e seus dois mandatos e o governo da presidenta Dilma e poder analisar as condições concretas de transformações, as mudanças empreendidas no País.
E dentro desse tema olhar também para a situação de nossa vida partidária, analisar o PCdoB enquanto um partido político que tem programa e tem projeto para o nosso país e, diga-se de passagem, ser um dos poucos, senão o único partido político, que hoje dedica parte importante do seu tempo a discutir projetos para o nosso país.
E isso é fruto do processo político do congresso do PCdoB de poder reunir sua militância desde os processos das conferências de base para debater a situação do país e o programa socialista, o projeto que o partido apresenta para o país e poder fazer disso uma atividade política principal de sua vida partidária.
O segundo tema analisa a crise sistêmica do capitalismo, olha para o mundo hoje, olha para as alternativas de construção da nova luta pelo socialismo, do papel que tem a América Latina e o Brasil em especial nesse processo. É esse o segundo grande tema das nossas teses para discussão no 13º Congresso do partido.
Eu não vou, obviamente, fazer aqui uma apresentação detalhada das teses porque cada um deve ter lido e participado de debate em sua OB. Mas, vou sublinhar aqui questões principais que chamam a atenção nesse debate do congresso do PCdoB.
Transição democrática
Começo destacando a importância do atual momento, que para nós comunistas é um marco histórico. O PCdoB foi seguramente a organização política mais perseguida e prejudicada pela ditadura militar do país. Nós tivemos grandes quadros que tombaram na luta pela democracia do nosso país e foi seguramente a organização política que mais sofreu nas mãos dos torturadores perdendo quadros importantes para a construção do nosso partido e da luta pela democracia e pelo socialismo. E nós vivemos hoje essa transição democrática ainda que com resquícios do processo político fruto da redemocratização do país depois da ditadura militar.
A eleição de Lula em 2002 inaugurou um novo ciclo de avanços importantes na consolidação dessa transição democrática. É a primeira vez que um operário é eleito de forma direta com uma composição partidária de forças democráticas, nacionalistas, de defesa da soberania e que guardam também nesse projeto a defesa de um projeto popular para o Brasil. Esse é um marco histórico do qual nós não podemos abdicar de fazer uma análise.
E a partir daí se inicia um processo importante de transição de um processo de uma herança maldita, uma herança de oito anos de neoliberalismo no país, de uma política entreguista das elites governadas pelos tucanos na presidência de Fernando Henrique Cardoso. Essa é a herança: um país sem projeto nacional, em crise, com altas taxas de desemprego, acelerando a privatização e entregas de nossas riquezas nacionais. É nesse contexto que assume a presidência Luiz Inácio Lula da Silva, em 2003, com a participação dos comunistas decisiva na vitória e na condução desse projeto político iniciado com a eleição de Lula.
Nós analisamos que a eleição de Lula e esse projeto guardam um sentido democrático, um sentido de defesa da nossa soberania e, principalmente, um sentido de realizar mudanças e transformações sociais importantes no país. Nós podemos fazer esse balanço de forma vitoriosa e também de maneira vitoriosa com a participação dos comunistas à frente de projetos e de conduções importantes dentro desses dez anos de governos democráticos e populares.
Povo nas ruas
No início de 2003, nós realizamos a 9ª Conferência Extraordinária do PCdoB onde o partido chamava sua militância, já naquela época, para um mergulho profundo nos movimentos sociais, dizendo que nós só faríamos as transformações profundas no país com muita mobilização e com muito povo na rua. Então, o partido já diz isso desde 2003: "Não basta participar do governo. É preciso consolidar nossa influência no movimento social, no movimento sindical, no movimento de juventude e a partir de ampla mobilização social impulsionar as mudanças e as transformações que o Brasil fez e precisa fazer ainda para avançar mais".
E o chamado feito pelo partido já na 9ª Conferência permanece atual em especial quando nós analisamos as recentes mobilizações de junho que têm um saldo político positivo – sem entrar no mérito se tem o sentido de transformação, se tem expressões conservadoras e autoritárias, que nós sabemos que teve -, e recuperam um sentido importante para a luta dos comunistas que é a mobilização popular e o povo na rua é capaz de conquistar vitórias e nós tivemos vitórias com o movimento que tomou as ruas.
E o movimento é vitorioso por ter conquistado efetivamente a redução das passagens, conquistado objetivamente vitórias importantes que recuperam esse sentido do povo em luta, mobilizado, realizando transformações e conquistando mais direitos.
Esse é um tema importante para o qual o partido chama a atenção na tese, dizendo que para esse próximo período político que o Brasil atravessará não basta ter uma coalizão, não basta realizar uma ampla aliança heterogênea porque nós sabemos que a aliança que compõe essa base de governo, que tem o PCdoB, que tem o PT, que tinha até há pouco tempo o PSB, que tem o PDT, PMDB, PP, forças de um amplo espectro político-ideológico, mas que nós precisamos reunir um bloco que passa pela atuação parlamentar nas câmaras municipais, nas assembleias, no Congresso Nacional, em aliança com os movimentos sociais, com um papel fundamental dos partidos de esquerda, em especial o papel do PCdoB, nesse processo de mobilização dos setores mais avançados da sociedade.
Reformas estruturais
Para dizer o quê? Que para o Brasil continuar avançando é preciso, é fundamental, realizar as reformas estruturais e democráticas; que sem as reformas estruturais e democráticas nós corremos o risco de um retrocesso porque as elites continuam exercendo muito poder em nosso país, em especial o grande oligopólio midiático. Então, o PCdoB foi o primeiro partido político a levantar a necessidade de uma reforma democrática dos meios de comunicação.
O PCdoB foi no ano de 2011 covardemente atacado na crise do Ministério do Esporte. Sem qualquer prova o partido e dirigentes importantes, como nosso ex-ministro Orlando Silva, foram covardemente atacados e achincalhados em cadeia nacional sendo que hoje não se provou nada, não ficou pedra sobre pedra e ao mesmo tempo não houve qualquer tido de retratação pública da imprensa em relação às acusações feitas.
Na verdade, não foram acusações. A imprensa brasileira acusa e julga ao mesmo tempo, sem qualquer direito de defesa e para avançar a democracia nós queremos também ter o direito de liberdade de expressão; queremos ter também o direito dos movimentos sociais, dos trabalhadores, da juventude apresentar sua opinião nos meios de comunicação e hoje nós temos um grande oligopólio midiático que é um entrave para o avanço da democracia no Brasil. Então, a reforma dos meios de comunicação é umas reformas democráticas que o partido tem levantado.
Reforma política
Junto dessa, a reforma política, que é a mãe de todas as reformas democráticas. Não esse arremedo que passou no Senado Federal, que piora, inclusive, as condições atuais de participação política, mas sim uma reforma política que possa colocar, fundamentalmente,os partidos políticos em condições iguais de disputa e não a prevalência absurda do poder financeiro que hoje, nós sabemos, domina as campanhas eleitorais, pois 95% do financiamento das campanhas eleitorais é feito pelas empresas privadas.
E eu pergunto: Empresa vota, empresa tem direito a voto no Brasil? Então, por que as grandes empresas, os bancos, as grandes empreiteiras são os principais doadores de campanha? A UNE, junto com a UBES, CNBB, OAB está empreendendo uma grande campanha, a qual o partido também já se somou.
Eu acho que a tarefa de nossa militância nesse processo do congresso é se somar à iniciativa do Projeto de Lei de Iniciativa Popular na coleta de assinaturas por uma reforma política democrática, onde as mulheres possam participar e ter espaço nas casas parlamentares, onde a juventude possa ter também mais espaço no Congresso, nas câmaras, nas assembleias legislativas, o que não vem ocorrendo com o atual sistema partidário.
Nós estamos assistindo a tentativa de criação de mais três partidos (só o Solidariedade e o PROS obtiveram registros no TSE) e nós sentimos um vazio profundo de ideias, de projetos, na criação desses partidos.
São mais de 30 partidos no Brasil (atualmente, são 32 partidos), mas quais são mesmo os partidos que tem projeto político para o país? Nós precisamos empreender, portanto, uma reforma política democrática que dê condições de os partidos apresentarem suas propostas e suas ideias, fortalecer e democratizar a participação do Congresso Nacional, em especial, que é fundamental na correlação de forças para as transformações e para os avanços que o Brasil quer realizar.
Novo ciclo de desenvolvimento
E isso é parte do que nós já discutimos no congresso passado do partido ao aprovar o Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento e atualizar o nosso Programa Socialista, programa que trata da necessidade das reformas estruturais e democráticas no Brasil para que nós possamos inaugurar um novo ciclo de desenvolvimento e o partido faz isso chamando um binômio de mais democracia, aprofundar a democracia no Brasil para realizarmos e aprofundarmos também o novo ciclo de desenvolvimento que possa superar os gargalos estruturais que enfrenta o nosso país.
O Brasil ainda convive com taxas de crescimento medianas. Se nós compararmos com países em desenvolvimento como a China, que cresce 8%, 9%, 10% ao ano, o Brasil ainda está distante da capacidade do desenvolvimento, da geração de empregos, da geração de novas tecnologias, da distribuição das riquezas que nós precisamos empreender nesse projeto político para o próximo período.
Crise do capitalismo
As recentes denúncias de espionagem e o discurso que fez nossa presidenta na abertura da Assembleia Geral da ONU colocam algumas questões fundamentais para esse próximo período. A primeira delas é a necessidade da defesa da soberania do nosso país e mostra o papel político e econômico que o Brasil tem no mundo hoje.
E aí nós podemos fazer a transição para o segundo tema que trata da crise do capitalismo e perspectiva da luta pelo socialismo hoje. Hoje a crise do capitalismo atinge níveis históricos, uma crise prolongada, acentuada, uma crise que acontece no centro das potências capitalistas.
Não é crise na periferia. É uma crise nos Estados Unidos, na Europa. O desemprego na Espanha já atinge mais de 50% da juventude. A Grécia caminha a passos lentos para a recuperação econômica e a França também entra de forma acentuada nessa crise sem perspectivas. A Europa que durante séculos foi para o mundo ocidental uma referência da organização, da capacidade do mundo se organizar, uma referência de como a sociedade deveria se organizar não encontra respostas concretas para sair da crise do capitalismo.
E nós temos de aproveitar esse processo histórico e olhar para a América Latina. Quem cita essa referência é o escritor e intelectual português Boaventura Sousa Santos, que diz que o canto de esperança do mundo hoje, das transformações sociais e da construção de uma nova sociedade é a América Latina.
Nós precisamos olhar para o Brasil e para o nosso processo político de luta pelo socialismo olhando para os nossos irmãos latino-americanos. Porque, durante muitos anos a história do Brasil, a história contada do nosso país foi uma história virada de costas para a América Latina, olhando só para a Europa, para os Estados Unidos e esquecendo da necessária integração econômica, política e solidária que nós precisamos empreender na América Latina.
E mais do que isso, eu chamo atenção para a realidade, para que nós possamos compreender que o Brasil não vai empreender sozinho as transformações sociais, políticas e econômicas no mundo. E o nosso processo histórico guarda mais relação com a integração com a América Latina do que com qualquer outro continente do mundo, desde o início da colonização europeia, desde as lutas pela libertação nacional e a formação dos países que hoje são a América Latina.
Nós enfrentamos no mesmo processo histórico as ditaduras militares nas décadas de 1960 e 1970, convivemos no mesmo período também com as lutas pela redemocratização, na década de 1980, e não à toa com a vitória eleitoral de Hugo Chaves em 1998, na Venezuela; a vitória de Lula, no Brasil, em 2002, que fortalece esse processo. Nós vivemos na América Latina, e em especial na América do Sul, o principal processo político de transformação social e de perspectiva concreta da luta pelo socialismo no mundo. Sem olhar para outras experiências muito importantes, como é o caso da experiência chinesa.
O que quero dizer é que o nosso processo político de luta pelo socialismo, de transformações sociais, está referenciado na aliança que o Brasil precisa empreender com os países da América do Sul, com os países da América Latina, porque é aqui que nós vamos poder construir essa nova luta pelo socialismo que se expressa, por exemplo, nas transformações que vive a Venezuela, nas transformações que vive o Uruguai, a Argentina, Cuba, e poder apresentar para o mundo,portanto, dentro desse contexto de crise do capitalismo, que é possível, mais do que possível, é necessário, realizar projetos políticos com a ampla participação popular e democracia e, ao mesmo tempo, combinado com desenvolvimento social, distribuição de renda, inclusão, geração de empregos, valorização da educação, da cultura e da tecnologia e de uma integração solidária.
Processo eleitoral 2014
Até o processo eleitoral de 2014, nós vamos viver no Brasil a intensificação da luta política que está diretamente vinculada, obviamente, com os resultados, com a condução do processo de eleição presidencial do país em 2014.
Nesse contexto, onde há a possibilidade de ampliação da luta popular a partir das mobilizações de junho, nós comunistas devemos ser a força condutora que busca realizar uma ampla aliança entre os movimentos sociais, entre as forças políticas mais avançadas, entre os setores médios da sociedade, que querem empreender reformas democráticas, e conseguirmos enfrentar e superar as necessidades de avanços que o Brasil precisa ter.
Porque não basta nós reelegermos Dilma em 2014, é preciso colocar no centro da disputa política uma agenda que empreenda as reformas democráticas, uma agenda que seja capaz de superar os gargalos ainda que o Brasil enfrenta, apesar dos avanços.
A participação dos comunistas nesse processo será fundamental e decisiva e, portanto, essa é a importância de nós realizarmos em profundidade os debates do nosso 13º Congresso e a participação de cada um/a é o diferencial que mostra a força viva do PCdoB, valorizando a participação militante e as ideias que cada camarada, cada militante do partido apresenta nesse debate, seja nas intervenções nas conferências, seja na Tribuna de Debates, seja apresentando emendas a esse texto que nós vamos enriquecer e, com certeza, acabar esse processo de forma vitoriosa, continuando os comunistas a dar grandes contribuições para os avanços democráticos que o Brasil precisa fazer e para luta do nosso povo.
Viva a Conferência Municipal do partido no Recife. Viva nosso 13º Congresso Nacional!
Audicéa Rodrigues
Do Recife