Haroldo: A solução pelo hip-hop
Durante os últimos dias, a cidade de São Paulo saiu de sua rotina de agitação e correria. Conhecida por ser uma cidade que não dorme, São Paulo novamente parou diante da violência de alguns grupos: de um lado, uma facção criminosa chamada PCC, que, de sua
Publicado 14/07/2006 11:52
Diante de toda essa confusão, dois fatos chamaram-me a atenção: o primeiro, a forma com que nas periferias, mesmo em meio às violências e boatos, a rotina pouco se alterou. As escolas públicas abrindo normalmente, quase sem alunos, é verdade, mas permaneceram abertas e as costumeiras reuniões no bar depois do futebol de domingo. Os rituais permaneceram os mesmos, apenas terminaram mais cedo, e o medo nem era por causa da violência causada pelos chamados criminosos, mas por acharmos que poderíamos ter cara de suspeito. Uma imagem que muito difere do observado nos bairros da classe média, onde quase todas as escolas particulares fecharam e onde quase não se observava o trânsito de pessoas ou carros.
Numa análise rápida e simples, esses fatos revelam aspectos preocupantes para todos: será que nós, moradores das periferias, estamos acostumados com a violência, enquanto que as outras classes, ainda assustadas com isso, estão se escondendo dentro de suas casas, em baixo de suas camas? Se a idéia estiver certa, estamos diante de uma nova questão.
Que a periferia vive isolada, culturalmente e financeiramente, e que este isolamento tem feito com que ela crie suas próprias manifestações culturais, já sabíamos, mas que este isolamento tem nos tirado o censo de valores comuns a sociedade como a valorização da vida – afinal matar e morrer pelo crime é normal – remete ao pensamento de que com o tempo, a periferia poderia criar seus próprios valores, e assim, por já possuírem seu território e terem seu povo, começar a questionar a soberania do Estado.
Com isso viveríamos um tempo de guerra civil, com confrontos mais densos que os vividos ultimamente, e novamente veríamos mais inocentes mortos, do nosso lado e do lado do Estado e das classes que o controlam.
Sei que o pensamento parece um trecho extraído de páginas de história em quadrinhos, dessas com pouca produção e feita em casa por pequenos grupos, mas o fato é que até pouco tempo, a idéia de que uma facção criminosa se organizaria a ponto de parar o estado de São Paulo, estava no mesmo patamar, ocupando a mesma estante dos quadrinhos citados anteriormente.
O segundo fato esta relacionado às declarações do presidente Lula, quando este afirma que se o investimento em Educação fosse maior, nos anos anteriores, hoje, provavelmente, estivéssemos colhendo frutos diferentes. Este discurso liberal traz diversas aberturas, afinal é bem provável que se os investimentos em Educação fossem maiores, hoje teríamos um número menor de crimes que envolvem armas de fogo e um número maior de crimes do colarinho branco. Que a Educação deve ser melhorada, isso é um fato, mas atribuir a ela a culpa pela criminalidade é limitar o debate de uma questão ampla. A falta de educação não é o principal problema do crime e sim a má distribuição de renda no país e a mente perversa dos capitalistas que exploram até crianças na sua ânsia por mais capital. Quanto a isso, precisamos de técnicas, necessitamos de estratégias que nos levem ao centro do poder, ao olho do furacão, para que, estando lá dentro, modifiquemos estas estruturas. Para atingir estes objetivos devemos estar estruturados, sintonizados, pensando de forma coletiva e acima de tudo, lembrarmos que a luta pelas questões raciais estão acima de partidos políticos e Ong´s.
Contudo, não devemos esquecer da Educação. Pelo contrário, devemos, cada vez mais, procurar meios para que todos da periferia tenham acesso a um ensino de qualidade. A um ensino digno, verdadeiro e gratuito, que elucide ao invés de confundir, e nessa relação o movimento Hip-Hop tem muito a contribuir. Para isso precisamos apenas que as portas das escolas sejam abertas.
O Hip-Hop transmite em suas mensagens os fatos do cotidiano. Mostra em suas letras palavras de resistência, luta e revolução. Poderíamos passar a inserir estas idéias no ensino fundamental e médio de nossas escolas públicas, usar a arte do graffite nas aulas de educação artística, as técnicas do MC nas aulas de português, as habilidades do break na educação física, o DJ nas aulas de história, passando o contexto das músicas, enfim, as possibilidades são inúmeras.
Isso motivaria os alunos, faria com que freqüentassem a escola por mais tempo. Aproveitaríamos que muitos simpatizam com a cultura, para ajudá-los a descobrir o prazer em estudar e os benefícios decorrentes desta prática, bem como ensinaríamos a usar o conhecimento em prol da revolução.
E a solução virá pelo hip-hop.
Haroldo Luis Nascimento – morador do Capão Redondo, zona sul de São Paulo e estudante de administração na faculdade Zumbi dos Palmares (Afrobras).