Otimismo com PIB é exagerado, avalia economista da Unicamp
Para Marco Rocha, cenário ainda é de profunda incerteza. Ele alerta que efeito estatístico em dados não correspondem a um dinamismo real da economia.
Publicado 17/08/2020 18:54 | Editado 17/08/2020 20:01
As instituições financeiras consultadas para o Boletim Focus, pesquisa semanal do Banco Central com projeções econômicas, vêm melhorando desde junho a previsão para o Produto Interno Bruto (PIB, soma dos bens e riquezas produzidos em um país). Nesta segunda-feira (17), mais uma vez houve otimismo, com a estimativa passando de queda de 5,62% para retração de 5,52%.
O motivo é que acreditam que houve uma reação da economia em maio e junho, meses que coincidem com o início da reabertura nos estados e municípios, mesmo com os números da pandemia ainda aumentando.
Segundo o IBC-Br, indicador divulgado pelo BC e considerado a “prévia” do PIB, houve crescimento de 1,3% em maio e de 4,89% em junho. Mesmo assim, a economia encolheu 6,28% no primeiro semestre e 10,94% no segundo trimestre de 2020.
Os economistas da pesquisa Focus também fazem boas projeções para 2021, quando preveem crescimento de 3,5%. O otimismo do mercado indica que acreditam que a reabertura da economia seguirá sem interrupções, ainda mais com a perspectiva de vacina para o ano que vem.
No entanto, o economista Marco Rocha, professor da Unicamp, considera a euforia excessiva em um cenário dramático, em que muitas empresas fecharam as portas e outras estão sem condições de fazer investimentos. Ele alerta ainda que números como os de maio e junho – crescimento após queda profunda – causam um efeito estatístico que não corresponde a um dinamismo real da economia.
“Você falar que está recuperando a economia porque cresceu 1% após ter caído 10% é uma ilusão. Não está se recuperando. Está estagnada, dentro de um buraco. Esse efeito estatístico, quando é divulgado pela mídia, parece uma coisa positiva. Mas pode comemorar no máximo que a economia parou de se contrair. A mesma coisa em relação ao ano que vem, que dizem que vai crescer 3,5%, mas eu acho muito. Vamos supor 2%. Crescer 2% após uma queda de 10% não significa uma movimentação real da economia. Ocorre porque a contração desse ano foi muito aguda”, comenta.
Rocha destaca também que o desemprego ainda deve subir muito, uma vez que a taxa está mascarada em razão da pandemia. “Há vários efeitos que estão ocorrendo no índice de desemprego. O desalento aumentou e o número de pessoas incapacitadas para uma vaga de emprego também. Provavelmente, você está tendo pessoas que não estão podendo voltar ao mercado porque estão tendo que cuidar de crianças, cuidar de idosos. Você está tendo mudanças na estrutura de empregos que mascaram as taxas”, afirma.
Além disso, o economista lembra que o cenário ainda é de enorme incerteza em razão da crise sanitária. Os casos e mortes continuam subindo e, mesmo que muitos aparentem ter perdido o medo, há um contingente não desprezível de brasileiros que seguem cautelosos.
“O governo está apostando, o mercado financeiro está apostando, que o isolamento social continuará a ser abandonado. Pressupõem que as pessoas não estão indo para a rua por causa das regras de isolamento. As pessoas não estão indo por medo de uma doença que mata mil pessoas por dia”, ressalta Rocha. O economista também não descarta novos fechamentos de cidades.
“As projeções se baseiam em esperar que o ritmo da economia continuará. Mas ninguém sabe o que vai acontecer em relação ao comportamento da Covid-19. Essa recuperação, provavelmente, vem do afrouxamento do isolamento. Para continuar, as coisas têm que seguir como estão. Mas, se houver uma aceleração, pode haver lockdown, o que levaria a novas contrações do PIB”, diz.