Acordo da COP-16 adia decisões sobre clima; Bolívia protesta
A COP-16 (16ª Conferência das Partes das Nações Unidas sobre Mudança Climática) adotou neste sábado (11/12), apesar da oposição contundente da Bolívia, um acordo que adia a decisão sobre um segundo período de vigência do Protocolo de Kioto e aumenta a ambição dos cortes de emissões de gases causadores do efeito estufa.
Publicado 11/12/2010 15:48
Ao longo das duas semanas de discussões na COP-16, em Cancún, no México, o quadro apontava que nações como Japão ou Rússia poderiam impedir um acordo consensual. Mas a missão coube a um país latino-americano, a Bolívia, que afirmou que o texto abre caminho para a substituição do Protocolo de Kyoto no futuro.
Apesar dos protestos da delegação boliviana, a COP-16 aprovou na madrugada deste sábado, pelo horário local, o texto que adia a decisão sobre um segundo período de compromisso do Protocolo de Kyoto.
O tratado, que estabelece metas de redução das emissões de gases do efeito estufa para países desenvolvidos, expira no final do ano que vem, quando será realizada a COP-17, em Durban, na África do Sul. Até lá, os países terão, segundo o acordado, de manter conversações na tentativa de não se criar um hiato quanto o tratado expirar.
"Estamos contra essa decisão e invocamos que não existe consenso para sua aprovação. Essa decisão não é um passo à frente, é um passo atrás, porque o que se está fazendo aqui é adiar sem data limite a discussão sobre o Protocolo de Kyoto e se abrindo caminho para um regime muito mais flexível e voluntário e não um sistema que mantém metas para os países do Anexo 1", argumentou o negociador boliviano, Pablo Solón.
Apesar da manifestação boliviana, a presidente da COP-16, embaixadora Patrícia Espinosa, defendeu que o texto resultou de muito debate entre os países e afirmou que a solitária posição boliviana apenas constaria das atas da conferência.
Os representantes da Bolívia voltaram a protestar e disseram que as regras da ONU que exigem consenso para aprovação de documentos estavam sendo ignoradas. "Consenso quer dizer que não pode haver nenhum Estado que apresente expressamente sua objeção. O que vai ocorrer aqui é um atentado contra as regras que existem no marco das Nações Unidas. Se todas as delegações aqui presentes permitem que esse atropelo ocorra, vão permitir que se apliquem as regras que melhor convêm à maioria formada no momento. Vamos recorrer a todas as instâncias internacionais para preservar a regra do consenso", inclusive na Corte Internacional de Justiça de Haia, disse a Bolívia.
Solón reiterou que a Bolívia "não quer o veto". "O veto não é um mecanismo democrático. O veto se dá no Conselho de Segurança onde se decide o futuro da humanidade com guerras".
"A Bolívia é um país pequeno com princípios, um país que não vende sua soberania e que fala pelos povos do mundo", assinalou.
De acorco com o embaixador boliviano, o presidente boliviano, Evo Morales, está a par do caso e respaldou a posição de rejeição ao consenso adotada pela delegação. Para o governo da Bolívia, o acordo "abre as portas" para a substituição no futuro do Protocolo de Kioto (1997), único instrumento vinculante que até o momento obriga os países desenvolvidos a reduzir suas emissões de gases poluentes.
La Paz também rejeita que a ampliação da possibilidade de aumentar o uso de novos mecanismos de mercado, como se fossem "uma varinha mágica", assim como um papel temporário do BM (Banco Mundial) para agir como novo "Fundo Verde" de concessão de ajuda aos países em desenvolvimento.
Os apelos, contudo, não surtiram efeito. "A regra do consenso não significa unanimidade. Não posso – e você compreenderá – ignorar a posição de 193 Estados parte. Assim que a decisão da conferência foi tomada", disse Espinosa.
Além do compromisso de manter as negociações sobre uma prorrogação do Protocolo de Kyoto, a COP-16 também aprovou o texto da negociação paralela conhecida como LCA (ações de longo prazo), que considera compromisso de países em desenvolvimento e também dos Estados Unidos, que nunca ratificaram o tratado de Kyoto. Mas que apoiaram os textos construídos em Cancún. Assim como o outrora temido Japão, que assinalou seu apoio para que o texto fosse "adotado totalmente como está".
O acordo
Esse acordo assinado na cidade japonesa de Kioto estabelece os objetivos obrigatórios de redução de emissões a 37 países desenvolvidos – entre eles, Japão, membros da UE (União Europeia), Austrália, Canadá e Rússia -, mas não os Estados Unidos, que nunca ratificaram o acordo, nem a China, por ser considerada economia emergente.
O acordo conseguido em Cancún abre caminho para criação de um Fundo Verde Climático (GCF, na sigla em inglês) dentro da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, que contará com um conselho de 24 países.
Tal documento também reconhece a necessidade de "mobilizar US$ 100 bilhões por ano a partir de 2020 para atender às necessidades dos países em desenvolvimento".
Em relação à transparência, um assunto que interessava particularmente aos Estados Unidos, o texto de compromisso determina que as ações de redução das emissões com apoio internacional sejam submetidas a medição, reportagem e verificação (MRV), de acordo com pautas estabelecidas pela Convenção.
O documento aprovado permite o início de um sistema de Consultas e Análise Internacional (ICA, na sigla em inglês) "de maneira não intrusiva nem punitiva e respeitosa à soberania nacional", que serão realizadas por especialistas.
Também se adia a um momento futuro a decisão sobre se haverá ou não uma segunda fase do Protocolo de Kioto e pede-se aos países aumentar seu "nível de ambição" no que diz respeito aos cortes das emissões de gases poluentes.
Os compromissos da primeira fase do Protocolo envolviam a redução de 11%-16% das emissões relativas aos níveis de 1990 para o período 2008-2012, enquanto agora se propõe que eles subam a uma porcentagem de 25%-40% em 2020.
Com agências