Um tirano vaidoso

Em reportagem exclusiva publicada pelo The Intercept, conversas em aplicativos de mensagens desnudam o ex-Juiz Sérgio Moro e o conectam diretamente à peça de acusação do Ministério Público no caso do Triplex, que condenou Lula, e revelam o modus operandi da “República de Curitiba”.

Foto: Lula Marques

Não é novidade para setores da esquerda, aqueles que nunca deram credibilidade para a Operação Lava Jato, que o ex-juiz Sérgio Moro tem atuação parcial, motivação política e conduziu a Operação Lava Jato de forma a se beneficiar de seus resultados. A defesa do ex-presidente Lula já reiterou por diversas vezes os vícios do processo que condenou o maior presidente da história do país e denunciou os atropelos de garantias a ampla defesa, bem como a falta material de provas que sustentem a condenação.

O então juiz Sérgio Moro ganhou notoriedade quando se transformou no último refúgio das elites na empreitada inquisidora contra o Partido dos Trabalhadores. O super juiz, paladino da justiça, na sua caçada contra a corrupção arrancou suspiros da classe média ávida por um herói, capaz de purificar a classe política e devolver dias melhores para um extrato da população desesperançada com a crise econômica e a ameaça de perder seus pequenos privilégios.

A Operação Lava Jato fez um verdadeiro ‘strike’ na classe política, o suposto combate a corrupção da Pretrobras, amplificado pela grande mídia quase 24 horas, por dia jogou toda a população contra o sistema político existente. O vale-tudo para derrubar Dilma Rousseff em um golpe parlamentar produziu a decadência da política como um todo e abriu espaço para os aventureiros, demagogos e autoritários. Além do estrago na política, a operação comandada por Sérgio Moro destruiu a indústria nacional, derrubou a economia, e abriu espaço para a privatização da Petrobras, nossa maior empresa de tecnologia.

O magistrado de primeiro grau de Curitiba parece nunca ter se incomodado com suas ligações políticas, sendo recorrente a sua aparição em festas, cerimônias, eventos, palestras ao lado de políticos de oposição ao governo Dilma Rousseff, que depois do golpe ascenderam ao poder. Sérgio Moro circulava com desenvoltura no meio político, e foi até capaz de desfilar em tapete vermelho no lançamento de seu primeiro panfleto eleitoral, o filme “A lei é para todos”,  longa-metragem que relata o combate a corrupção na Petrobras e tem Moro como seu protagonista, em meio a políticos, e novas celebridades do meio jurídico, como o juiz Marcelo Bretas.

Sempre esteve claro que Moro estava vislumbrado com o poder. Sérgio Moro nunca foi juiz e sim político. Usou de seu poder como magistrado – poder não eleito – para fazer política e se beneficiar diretamente dos resultados da sua atividade jurídica. A sua ambição se revelou clara ao integrar o governo de Jair Bolsonaro, governo este que só ascendeu ao poder graças a atuação decisiva de Moro, como mostram as conversas reveladas pelo The Intercept.

Ao se revelar um político, Moro também expõe qual tipo de estratégica política que lhe é preferida para a chegada ao poder. As ambições do ex-juiz vão muito além da operação lava-jato. Destruindo a classe política, Sérgio Moro abriu caminho para a chegada da extrema-direita ao poder e se aliou ao mais nefasto espectro político para matar o seu desejo e massagear a sua vaidade, tornando-se uma das bases de sustentação do bolsonarismo.

Ao receber de Dallagnol uma reverência pelo apoio popular que o Juiz tinha nos protestos pelo impeachment de Dilma Rousseff em 2016, Moro rebateu “Parabéns a todos nós”. O ex-juiz mais conhecido como Russo agia como o chefe. Quando os procuradores do Ministério Público queriam se certificar de algum procedimento recorriam ao chefe. “Conversei com o Russo” diz Dallagnol em mensagens, sinalizando conversa com Sérgio Moro.

A Operação Lava Jato cometeu muitas violações da Constituição na condução dos processos, entre elas grampos sem autorização do STF, vazamento de processos sigilosos para imprensa e agora o mais grave deles vem a tona nas revelações do The Intercept, a tirania persecutória.

Nos princípios básicos da separação de poderes desde Montesquieu, é garantido ao juiz a imparcialidade, o distanciamento das partes interessadas buscando proferir um julgamento na letra da lei e nos limites estabelecidos pela constituição. Ao juiz que é dado o poder de acusar e julgar ao mesmo tempo, está ali configurada a tirania. Todo príncipe que ousou ser um tirano nas monarquias constitucionais reuniu em torno de si toda a magistratura. Moro sabe muito melhor disso do que eu, afinal teria que dedicar sua vida ao estudo da magistratura.

Sérgio Moro em seu conluio ilegal com Deltan Dallagnol, procurador do Ministério Público no poder de oferecer a denúncia contra o ex-presidente Lula, beneficia de maneira ilegal uma das partes interessadas no processo, interfere na peça de acusação que ele próprio vai julgar, orienta a acusação com indicação de testemunhas, e até mesmo dita o ritmo do processo. O tirano vaidoso choca no ninho o estado de exceção, tira do jogo o principal jogador – líder em todas as pesquisas de opinião – e depois vai participar do governo de seu adversário. Uma jogada de mestre, não fosse tamanha vaidade e ambição.

Com as revelações do The Intercept agora Sérgio Moro ficará desmoralizado perante toda a opinião pública, a sua capa de herói paladino da justiça não será suficiente para esconder toda a sua atuação tirana no comando da "Lava Jato", e o que preocupa, um tirano no Ministério da Justiça comandando a Polícia Federal com o poder de achincalhar ainda mais a classe política. O modus operandi de Sérgio Moro e da "Lava Jato" é o reflexo do poder autoritário que está no governo, é o discurso produzido pelos mesmos atores políticos que se beneficiam eleitoralmente da caçada contra uma corrupção que nunca acaba.

A negação da política é campo fértil para o crescimento do fascismo, a tirania da justiça misturada com um poder Executivo igualmente autoritário pode causar estragos irreversíveis para a nossa já cambaleante democracia. Que se reestabeleça toda a verdade com a anulação da condenação política de Lula. Diante dessas revelações se faz ainda mais necessário um rearranjo das forças políticas de oposição ao governo Bolsonaro e uma atitude urgente do STF como garantidor da Constituição. Defender a política é defender a democracia representativa como última instância da resolução dos nossos conflitos, não há democracia que conviva com a tirania.

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
Autor