Um elo esquecido: Engenharia Consultiva

Consolidar polos de Engenharia Consultiva é objetivo que deveria ser incluído no Nova Indústria Brasil, com medidas a cargo das instâncias de Governo

Fazia-se necessário. O planejamento industrial é base para processo de desenvolvimento. Reverter o baixo crescimento setorial e a desindustrialização é fundamental. A Neoindustrialização baseada em Missões alicerça a economia que se quer. Um caminho adequado para reconstruir o país.

Tenho lido os documentos oficiais e participado de debates. Muito se escreve sobre a importância do conhecimento na manufatura 4.0 e o papel das universidades. Também, sobre a importância dos institutos de pesquisa no desenvolvimento. Ainda, mais relevante, sobre a indústria como meio de efetivar o processo inovativo, torná-lo real. Infelizmente, pouco ou quase nada encontro sobre o papel da engenharia consultiva.

Engenharia Consultiva é a área que ajuda a definir normas, padrões e parâmetros para a efetiva implantação de produtos e processos. O conhecimento gerado nas universidades e mesmo desenvolvido nos institutos não é transplantável facilmente para a prática das empresas, precisa ser bem definido em seus indicadores práticos.

Organizar os projetos, permitindo um planejamento adequado e uma efetiva implantação da inovação é o objetivo. Suas atividades vão desde estudos de pré-viabilidade, estudos de mercado, estudos de viabilidade técnico-econômica e socioambiental, projetos básicos, projetos executivos e de detalhamento, até serviços de suporte, vinculados à implantação de empreendimento ou serviços de suporte na área de qualificação, qualidade, metrologia e certificação. É uma atividade de consultoria que tem como foco atingir perfis de demanda específicos. A velocidade da renovação tecnológica traz a necessidade de constante atualização e de mecanismos ágeis de informação e de adequação.

O perfil de demanda deste segmento de serviços está fortemente atrelado ao ciclo de investimentos e à criação de infraestrutura básica. Sua demanda tem uma forte concentração em períodos em que se pronunciam mudanças de ordem técnica, como adaptação a novas exigências de um mercado ou quando se está gestando um novo período de crescimento da economia. É exatamente o que caracteriza o que se quer com o plano estatal elaborado para a indústria.

Se analisarmos a evolução recente do Brasil notar-se-á que o setor de engenharia consultiva teve ligação direta com o ciclo de investimento, bem como com o planejamento oficial do desenvolvimento do País. Por exemplo, no final dos anos sessenta e primeiro qüinqüênio dos anos setenta vê-se estruturar de forma significativa o setor, enquanto nota-se uma queda brusca nos anos oitenta e início dos 90 dada a estagnação da economia.

O chamado período do Milagre e o início do II PND permitiram a estruturação de grandes empresas no setor, com operação a nível nacional. A recessão dos anos 80, as profundas oscilações entre crescimento e queda de atividade na década dos 90, fez com que o setor fosse reduzindo suas atividades e que várias empresas ou desaparecessem, ou sofressem processos de grande enxugamento.

Mais recentemente, a crise da indústria neste século, principalmente na segunda década, traz novamente um forte impacto negativo no setor e nas poucas empresas de porte que estão estruturadas.

A proposta da neoindustrialização aparece como uma oportunidade concreta para seu soerguimento. No entanto, para isso é fundamental enfrentar os principais problemas que o setor apresenta, ou seja, a fragilidade da estrutura de capital das empresas nacionais para contrata­ção de projetos de porte, a estruturação de mecanismos de financiamento adequados às características do setor, a carência de recursos humanos qualificados para a atividade e, não esqueçamos, o chamado custo Brasil.

Aspecto que não deve ser ignorado é que o setor não desapareceu dos projetos que foram realizados. Infelizmente, se faz presente nos principais projetos através de empresas internacionais. O próprio financiamento é um fator dificultador da participação nacional. É um empecilho que necessita de maior atenção, por exemplo, do BNDES.

Outro ponto a notar é que nas grandes concorrências, as empresas locais ainda entram em áreas de menor complexidade, sendo que os que exigem maior especialização têm sido realizado por empresas extra locais de caráter internacional.

As instituições do conhecimento, universidades, centros tecnológicos e escolas técnicas, não respondem totalmente pela formação de recursos humanos para as empresas brasileiras do setor. Precisam adequar seus métodos e currículos.

Os conhecimentos práticos são fundamentais e se exige uma articulação com as empresas de consultoria internacionais e associações para atendimento das mesmas. O problema é como firmar efetivamente essas parcerias. O Estado, através de seu poder de indução poderia dar uma contribuição efetiva nessa direção.

Consolidar polos de Engenharia Consultiva é objetivo que deveria ser incluído no Nova Indústria Brasil, com medidas a cargo das instâncias de Governo, desde uma política de incentivo às empresas locais até a utilização do seu poder de compra e contratação. Mas, além disso, como facilitador das parcerias necessárias e das articulações nacionais e internacionais.

Notas

  1. Analise mais detalhada da evolução histórica do setor pode ser encontrada em: SICSU, A. B.; DIAS, Adriano Batista. Caminhos da Engenharia Consultiva em Pernambuco: Uma Primeira Abordagem. In: Abraham Benzaquen Sicsú; Denise Dunke de Medeiros. (Org.). Qualidade e Inovação em Serviços: Contribuições da Engenharia de Produção. Recife: Editora Universitária UFPE, 2003,  p. 103-113.
  2. No início dos  anos 2010 houve uma oportunidade efetiva para a retomada do setor. No entanto, a crise institucional gerada com a Operação lava Jato fez com que se paralisassem as tratativas que vinham sendo feitas nessa direção.
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