Revolução, por que não?

Pertenço a uma geração – a dos anos 60 – que conviveu com a idéia de revolução. É verdade que, de acordo com a pessoa ou o grupo, alterava-se o entendimento sobre a natureza e o alcance dessa revolução. Política para alguns, cultural ou meramente comportamental para outros.

Mas em todos – até mesmo naqueles que não se dedicavam à militância política – mantinha-se um pressuposto de ação coletiva, sob o influxo de uma idéia totalizante voltada para a transformação do mundo que, por iníquo, apresentava-se intolerável àquela juventude carregada de sonhos.

No deserto neoliberal que se instaurou no Brasil a partir fim dos anos 80, o impulsos de ação coletiva cederam espaço à perversa competição individual por ganhos pessoais dentro de um sistema inquestionável, e o termo revolução, quando usado, passou a designar circunstâncias e intenções particularizadas, desconectados de um projeto conjunto de superação civilizacional e, portanto, sem qualquer risco para o novo status quo do capital. Ouvia-se falar de revolução disso, revolução daquilo, as mudanças importantes dentro do sistema eram sempre revoluções. Digamos, o termo revolução tornou-se algo ordinário (no sentido de medíocre, vulgar), desidratado da substância política capaz de lhe conferir força e consequência.

O neoliberalismo esboroou-se, mas muitos dos seus pressupostos fincaram raízes e resistem à crise. Mantém-se, portanto, o desafio de resgatar uma cultura de transformação social capaz de robustecer o caminho ao avanço civilizacional representado pela construção do socialismo no Brasil. E tal resgate significa repor não apenas certos conceitos, como também suas designações. Então é preciso vincar que os que defendem a alternativa socialista defendem uma revolução. Revolução é fenômeno histórico, seus matizes (e quando se dará e como se dará) são determinados pelas circunstâncias concretas em que é gestada. Mas a transformação que se pretende será sempre revolução. E isso não pode ser escamoteado, deve ser dito.

Não defendo nenhum pregacionismo em relação à idéia e ao termo revolução. Nada de principismo, doutrinarismo., Defendo, isto sim, que não o abandonemos para a designação de banalidades, que restauremos seu sentido mais original e historicamente sustentado, o sentido da transformação política de fundo que altere a natureza e os objetivos sociais, econômicos, culturais de uma sociedade (ainda que coexistam, em forças da esquerda nacional, diferentes concepções dessa revolução).

Abrir mão dessa terminologia pode significar algo mais extenso e profundo que a mera escolha de palavras e conceitos segundo as necessidades de amplitude política. Pode significar renúncia – ainda que tácita, ou parcial – dos objetivos maiores do projeto socialista. Assim como os comunistas, a despeito da debacle no Leste europeu no início dos anos 80, não abriram mãos de cores e símbolos, de referências teóricas e objetivos estratégicos, não se deve relegar o termo e a idéia da revolução ao baú do esquecimento, sob qualquer tipo de pretexto.

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