Opção preferencial pelo limbo*

A militância ativa é essencial na esquerda: equilibrar o debate teórico e a ação popular contra a superficialidade digital e a centralização nas direções é um desafio urgente.

Foto: Rafael Smaira/Midia NInja

Há momentos na luta política em que ganha peso decisivo a atitude militante.

Para o bem ou para o mal.

Como agora, em que a prática consequente não pode prescindir, sob nenhuma hipótese, de duas condições essenciais: a peleja no terreno das ideias e a ação junto ao povo.

Mas, estranhamente, no contingente atuante nos partidos situados à esquerda há uma espécie de “alergia” tanto ao debate teórico e político aprofundado, como à atividade na base da sociedade.

A resultante pode ser o que Lênin chegou a chamar de “praticismo cretino” e uma vulnerabilidade absurda face a comunicação digital instantânea, superficial, fragmentada, distorcida e predominantemente reacionária.

Nos anos 80 e 90, o livreiro Tarcísio Pereira, proprietário da histórica Livro 7, no Recife, dizia vender mais livros em tempo de crise porque crescente era o público interessado em melhor compreender a complexidade das oscilações econômicas, o fio da História e os conflitos políticos presentes e que tais.

Hoje, frequentemente se revelam dados estatísticos indicativos de que no Brasil se lê menos.

Na verdade, mais e mais gente se informa pelos meios digitais, fragmentariamente e sem maior profundidade, e muito do que se sabe se perde na polarização própria do que se tem chamado de “guerra cultural”, no tom predominantemente determinado pela direita.

Concomitantemente, a militância se vê atraída pelas instâncias “gerais”, seja postos de direção nas entidades dos movimentos sociais, seja nos partidos, seja também na esfera dita institucional, que envolve cargos de mando ou de assessoria na máquina administrativa ou em conselhos setoriais.

Entretanto, mais do que nunca são necessários vínculos efetivos com a base da população – nos ambientes de trabalho, nas escolas, nas concentrações habitacionais.

Para ouvir, sentir, compreender, debater e mobilizar à luz de uma linha política consequente.

No que tange especificamente ao partido político idealizado por Lênin, duas são a instâncias organizativas indispensáveis: o Comitê Central, ou seja, a direção nacional, que há de ser teórica e politicamente competente, coesa, disciplinada e influente; e a rede (de milhares) de Organizações de Base vinculadas aos trabalhadores e ao povo.

Órgãos dirigentes estaduais, municipais e distritais são, em essência, meramente intermediários entre o centro dirigente nacional e as bases.

Daí ser nociva a concepção de que essas instâncias de direção locais ou regionais – seja no partido político, seja nos movimentos sociais – se bastam a si mesmas.

Quem assim pensa e se comporta faz, na prática, uma nefasta opção preferencial pelo limbo – onde quase nada se cria e pouco se faz.

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