Maria Olympia – Uma Vereadora Comunista em Curitiba
Com apenas 21 anos, a professora e operária foi pioneira como representante dos comunistas na Câmara Municipal da terra das araucárias.
Publicado 18/05/2023 19:47 | Editado 12/06/2023 14:24
Resgatar a memória de mulheres que ousaram romper com o silêncio e se colocaram na vida social e política da comunidade é realçá-las não mais como coadjuvantes, mas como desbravadoras e protagonistas das suas próprias histórias, que contribuem no sentido de transformações políticas e culturais na sociedade.
Trago a esta coluna uma modesta exposição sobre a primeira e, até hoje, única vereadora comunista eleita na cidade de Curitiba, com apenas 21 anos de idade. Foi no ano de 1947, 254 anos depois da instalação da Câmara de Vereadores/as. A pioneira Maria Olympia Carneiro Mochel, professora formada pela extinta Escola Normal, operária também, foi eleita por voto direto pelo Partido Social Trabalhista (PST), em 1947, para uma das 20 cadeiras que o Legislativo tinha naquela época. Olympia teve que concorrer pelo PST porque o Partido Comunista havia, pouco antes, sido colocado na ilegalidade pelo governo do general Dutra. A disputa se deu entre 179 candidaturas, dentre as quais apenas três mulheres: Olga da Silva Blaster (professora), Maria da Conceição Suarez (tenente-enfermeira da FEB) e a jovem professora Maria Olympia, eleiita com 436 votos.
Maria Olympia nasceu em 9 de janeiro de 1926. Empregou-se como operária na Fábrica de Viaturas Hipomóveis de Curitiba, tendo sido demitida por questionar o modelo de produção e as más condições de trabalho. Segundo informações da professora Elba Gomide Mochel, que foi casada com o fllho mais velho de Maria Olympia, seu trabalho na fábrica era realizar visitas nas casas dos operários que faltavam ao emprego, depois fazendo os encaminhamentos deles a médicos, além de ouvir queixas das famílias operárias. Dessa forma, atuando nos bairros mais pobres de Curitiba, teve seu trabalho reconhecido pelos trabalhadores, o que a levou a ocupar essa primeira cadeira parlamentar em Curitiba, combatendo o tão falado conservadorismo da cidade. Ela destacou-se por seus posicionamentos em defesa da soberania e de propostas para atendimento às famílias dos bairros mais vulneráveis de Curitiba. Foi a segunda secretária da Comissão Executiva da Câmara Municipal.
A eleição dessa jovem deu-se no ano de 1947, durante o governo do general Dutra, com o fechamento do Partido Comunista e o rompimento das relações diplomáticas entre o Brasil e a União Soviética, como uma forma do Estado de realizar o controle da democracia e da classe operária em ascensão. Nesse ano o Partido Comunista elegeu diversos/as vereadores/as, a exemplo do escritor e humorista Aparício Torelli, o Barão de Itararé, entre outros/as comunistas. Era o período que gerou o termo “Partidão”, por seu grande contingente de cerca de 200 mil filiados.
Nas eleições de 1933, as brasileiras puderem ir às urnas pela primeira vez. Em 1935, quando da disputa para vereadores/as, as mulheres já tinham conquistado o direito de votar e serem votadas, mas nenhuma concorreu. Somente 12 anos depois, findo o Estado Novo, com a reabertura dos Legislativos, é que ocorre um novo pleito, e a militante Maria Olympia é eleita com a força dos (as) comunistas.
Ela foi casada com o engenheiro agrônomo e líder comunista Joaquim Mochel, maranhense, que a apresentou ao partido comunista. No mesmo ano de sua eleição, ela se tornou noiva de Joaquim. Ele estudava Agronomia na capital paranaense, foi membro do Comitê Municipal do Partido e seu secretário político. Joaquim concorreu ao cargo de deputado estadual, apoiado no prestígio do senador constituinte Luiz Carlos Prestes, mas não chegou a ser eleito. Anita Carneiro, irmã de Maria Olympia, foi presidenta da Associação dos Professores de Curitiba e também era filiada ao PC do Brasil.
A enfermeira, hoje professora aposentada da Universidade Federal do Maranhão, Elba Gomide Mochel, que nos concedeu recente entrevista, informou que, dos cinco filhos da vereadora, três se formaram em medicina e um em engenharia e um em odontologia. O filho mais velho, médico, marido de Elba, faleceu em acidente de motocicleta quando estava se dirigindo para estudos de pós-graduação na cidade de São Paulo; ele tinha apenas 39 anos, tal situação trágica abalou profundamente Maria Olympia e sua família.
Ao terminar o mandato de vereadora, Olympia e a família mudaram-se para São Luiz, a capital do Maranhão, com dois filhos pequenos, nascidos em Curitiba; os outros três nasceram em São Luiz. Nesse estado, ela se formou em medicina, especializando-se em psiquiatria e, mais uma vez como desbravadora, foi a primeira médica psiquiatra formada pela UFMA e possivelmente do estado.
Curiosamente, eu moro na rua David Carneiro, historiador paranaense que dá o nome a uma via muito arborizada em Curitiba. David era tio de Maria Olympia, e irmão do pai dela, Raul Carneiro, médico pediatra e professor da UFPR. A mãe de Olympia chamava- se Anna Schweble, e, no relato de Alice Mochel (neta de Anna), evidencia-se sua felicidade por ter convivido com a avó, que destaca: “ela foi uma mulher trabalhadora, honesta e íntegra, além de amorosa”, tendo estado por mais de 20 anos com a família. Anna teve ainda mais duas filhas e faleceu aos 96 anos.
Neste ano de 2023, em 06 de março, a Câmara Municipal de Curitiba (CMC) homenageou Maria Olympia, dando seu nome à Escola do Legislativo de Curitiba, cuja finalidade é promover a formação de servidores/as e vereadores/as. A solenidade teve a presença de uma filha de Olympia, a médica Alice Mochel, penúltima dos cinco filhos que, segundo a própria Alice, era a que tinha maior proximidade com a mãe. A vereadora Maria Leticia (PV), procuradora da Mulher e segunda secretária da CMC, destacou que batizar a Escola com o nome da primeira vereadora não é mera convenção, constitui-se em fator de relevância e de valorização das mulheres, tendo como referência uma mulher pioneira, que inaugurou a presença feminina no Parlamento Municipal, com apenas 21 anos de idade.
A ex-vereadora faleceu em 25 de janeiro de 2008, aos 82 anos, apenas nove meses após a morte do seu companheiro.
A direção da Organização de Base da Matriz do PCdoB em Curitiba, que abrange 18 bairros, homenageou em 2022 a vereadora, batizando a OB com o nome de Maria Olympia Carneiro Mochel. Para o PC do Brasil, que, desde seu 2º Congresso em 1925, tem levantado a bandeira contra a opressão das mulheres, também em todos os Congressos Partidários foram realizados informes sobre o tema, intensificando-se no período recente com a inclusão, no Estatuto, de um subcapítulo sobre o Partido e as Mulheres, afirmando que a luta contra a discriminação das mulheres tem prioridade na atuação do Partido, e que difundir essa história de lutas é imprescindível.
Nosso país ocupa a 142ª posição no mundo quanto à participação das mulheres no parlamento. Indicar o nome da primeira vereadora comunista para nominar a OB do Centro da capital paranaense é reconhecer sua marca histórica, o legado do Partido Comunista e abraçar a luta para que Mulheres do PCdoB sejam eleitas, transpondo a vergonhosa subrepresentação feminina em uma cidade onde as mulheres representam 52,33% da população de 2 milhões de habitantes, que tem uma Câmara com 38 cadeiras, na qual somente oito ocupadas por mulheres.
https://www.turistoria.com.br/maria-olimpia-carneiro-mochel-a-pioneira
Entrevista com a professora Elba Gomide Mochel em 15 de maio de 2023.
Mensagem enviada por watssap pela Dra. Alice Mochel em 07 de junho de 2023.