Em busca de um discurso
Vi essas cenas mais de uma vez. Soube depois que se tratava de uma rotina quase semanal nos primeiros tempos. Senhores elegantes, às vezes senhoras, a desembarcar das classes executivas e a sair pelas áreas vips do aeroporto Juscelino Kubistchek. Três a quatro carros pretos reluzentes, ladeados de batedores militares, em modernas Harley-Davidson.
Publicado 22/05/2013 18:49
Um tratamento de conforto e segurança digno dos grandes chefes de estado que, naquele tempo muito menos, costumam nos visitar. A caravana não se dirigia ao Supremo, tampouco ao Congresso Nacional, muito menos ao Itamarati ou ao Planalto. O seu ansiado destino era muito mais importante, para eles e para a época: o Ministério da Fazenda. A sua origem,
Washington, D, C., onde fica a sede do Fundo Monetário Internacional, o famigerado FMI.
Sobre o assunto, escrevi um texto para o Portal Vermelho, em março de 2010, ano da disputa Dilma x Serra. Naquela época, como nesta semana, na posse de Aécio Neves na presidência de PSDB, em reunião do tucanato de alta plumagem, o partido discutia o que vem discutindo desde 2002: qual a melhor forma de se apresentar ao eleitorado brasileiro, por falta de um projeto para o Brasil. Ainda na dúvida se faz o velho discurso elitista para as classes A e B ou se adquire algum cacoete para conseguir chegar e falar às classes C e D. Agora, o mais provável candidato traz uma vez mais a velha e duvidosa proposta de mostrar o partido com a cara das realizações de FHC. E qual seria esse discurso tão sedutor?
Seria do "grampo do BNDES", as escutas telefônicas ilegais que mostravam FHC e ministros discutindo o leilão da Telebrás? Seria o da venda da Vale do Rio Doce aos amigos do tucanato, por cerca de um décimo do valor? Ou o de outras tantas privatarias, de amplo domínio público? Ou, quem sabe, o da habilidosa conquista de um segundo mandato mediante compra de votos parlamentares?
Voltemos ao Ministério da Fazenda e aos agentes do FMI. Corria os fins dos anos 90 e esses agentes eram autorizados a, sem a menor cerimônia, remexer gavetas, fichários e pastas, onde estivessem as contas de Pedro Malan, o todo poderoso ministro da Fazenda de FHC. Eles queriam saber se estávamos seguindo os rigores de suas normas de proteção para os capitais e lucros dos seus não poucos investimentos no País. Precisavam checar se estávamos aplicando rigorosamente o Plano Real, o plano econômico criado por Rubem Ricupero durante o governo Itamar Franco.
Esse cuidado e essa movimentação aumentaram muito, pouco antes da reeleição de FHC, como outro dia relembrou o atento Delfim Neto. O Brasil estava prestes a quebrar pela terceira vez sob o comando de FHC/Malan que insistiam em levar até as eleições a irresponsável equivalência do dólar com o real. Falência que não se concretizou por interferência direta de Bill Clinton, que, face o aumento do ‘perigo’ Lula, induziu o FMI reforçar o caixa brasileiro em mais quase uma centena de bilhões de dólares.Uma fortuna que, colocadaem mãos quebradeiras , exigia o olho do dono e a humilhante bisbilhotice dos elegantes senhores e senhoras de Washington, D. C. Conhecemos o resto da história, desde o momento imediato à reeleição: o valor do real passou a ter a responsabilidade dos marcos e do espírito do Plano Real, sob as vistas estrangeiras constrangedoras, a cuidar do seu rico dinheirinho.
Inda bem que, mesmo de forma indireta e a custo de juros altíssimos, pagos pela economia do povo brasileiro, teve alguém para cuidar de significativa parte do patrimônio nacional. Um episódio da nossa história que barrou nosso caminho célere para as trevas em que se meteram Espanha, Grécia, Portugal, Irlanda, presas indefesas da voracidade do grande capital internacional.
A história dos mandatos tucanos, pois, na presidência do País, seria um desastre para a construção de um discurso com um mínimo de credibilidade e de sedução do eleitor.