Cinema Paradiso
Não há como esquecer o refúgio identificado como Cinema Paradiso, com que o menino Totó se encantava, onde aprendeu a arte de amar o cinema e a projetar filmes, tarefa de Alfredo em toda a sua vida (Contém Spoilers)
Publicado 04/10/2021 15:55 | Editado 04/10/2021 15:56
Surpreendentemente repleto de simbolismos, um dos maiores filmes a que assisti, e por mais de uma vez. “Cinema Paradiso” tem trilha sonora do grande maestro e compositor italiano Ennio Morricone, que faleceu no ano passado, aos 91 anos de idade, autor de mais de 500 trilhas sonoras compostas para o cinema. Melodias que eternizam personagens em nossa memória afetiva, como os de Salvatore “Totó” e Alfredo nesta marcante obra, ganhadora de Oscar (1990), e dirigida por Giuseppe Tornatore.
A trama é, ao mesmo tempo, aparentemente singela, pungente e cômica. O pano de fundo da história é o amor, tolhido e obstaculizado por tantos fatores da vida social, além de uma declaração emocionante de afeto pelo cinema, que tantas vezes serviu e serve de canal para a fluidez de um sentimento tão fundamental para a sobrevivência da Humanidade. Amor de um filho pelo pai, o de um homem por uma mulher, o de uma mulher por outra mulher, o dos habitantes de uma cidadezinha italiana por sua modesta mas entusiasmante sala mostradora de histórias de vida.
Os mais destacados atores são o saudoso Philippe Noiret – que interpreta o projecionista de filmes Alfredo – e Salvatore Cascio , o Totó, de cativante e engraçada atuação, sempre no pé de Alfredo, deste recebendo grande parte da educação para a vida, que não mais lhe podia dar o pai, sumido na II Guerra.
Não há como esquecer o refúgio identificado como Cinema Paradiso, com que o menino Totó se encantava, onde aprendeu a arte de amar o cinema e a projetar filmes, tarefa de Alfredo em toda a sua vida. Mas havia um fator de censura nas exibições cinematográficas: o padre do lugar, embora boa gente, era muito conservador, via antes cada filme e obrigava Alfredo a cortar todas as cenas sensuais, em especial as de beijo.
Em um acidente de incêndio na película que se projetava (era um celuloide altamente inflamável até os anos 50), que se espalha pela sala, Alfredo se queima e perde a visão. De tanto frequentar o cinema e a sala de projeção, Totó assume a função de Alfredo, para garantir a principal atividade de entretenimento de Giancaldo, a pequena cidade siciliana ao sul da Itália.
Em sua adolescência, Totó sofre uma paixão não resolvida por Elena, filha de família rica que se mudara para Giancaldo e que proíbe o namoro – o fator de classe interferindo no amor entre os jovens. Totó, ainda jovem, abandona a cidade, seguindo os conselhos de Alfredo – “Vá e não volte, Totó!” Alfredo não queria que Totó revisitasse os antigos “fantasmas” da juventude.
Surpreendido com a notícia da morte de Alfredo, Totó retorna a Giancaldo, agora já bem mais velho, como cineasta de renome em Roma. Totó adulto é interpretado por Jacques Perrin. Ao chegar, não tem como fugir de um “revival” dos numerosos momentos marcantes de sua infância e juventude na cidadezinha. E recebe das mãos da mãe, já bem velhinha, um presente deixado por Alfredo, o qual, depois de aberto por Totó, conduz a um dos mais belos desfechos de filme de toda a história do cinema. Que não revelaremos, para não quebrar o encanto.
Uma verdadeira obra-prima que nos chama a percorrer mesmo em pensamento aquela cidade italiana. Um filme que mergulha no mundo da fantasia para tentar colocar algo sobre o espaço vazio deflagrado pela angústia, mostrando, sobretudo, que é possível e necessário retomar o a vida, mas que deixa também uma nostalgia pela longa ausência de Totó na pequena cidade, uma promessa feita a Alfredo de que sairia da cidadezinha para não mais retornar. Recomendável para todos e todas que apreciam o belo, a esperança, o amor.
Fotografia bela em sinergia com a enternecedora trilha sonora de Ennio Morricone fazem-nos embarcar de volta a velhos tempos do cinema como centro de lazer e de divulgação e educação cultural de um povo, como era o “Paradiso”. Totó agora o via semidestruído, pronto para ser demolido a dar lugar a um estacionamento. Ao contrário das salas de cinema de hoje, quase todas embutidas e pasteurizadas dentro de shopping-centers, com elevados preços de ingresso. Mas filmes como “Cinema Paradiso” nos levam de volta à magia de tempos idos, em que, ao lado de um projecionista escondido em sua salinha, bem podia haver um (a) jovem aprendiz, empolgando-se a cada cena de beijo na tela.
- Cinema Paradiso
- Data de lançamento: 2 de março de 1990 (Brasil)
- Diretor: Giuseppe Tornatore
- Música composta por: Ennio Morricone
- Canção original: Cinema Paradiso
- Direção de arte: Andrea Crisanti
- Prêmios: Prêmio David di Donatello de Melhor Música, vários prêmios Incluindo o Oscar de melhor filme estrangeiro (1990)