A clarinada do “não me toques ou “soldado é superior ao tempo”
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Publicado 12/05/2021 14:37
O jornalista Janio de Freitas publicou, no último domingo, 9, na Folha de São Paulo, contundente artigo (“Fuga do general Eduardo Pazuello é covardia”), abordando o que chama de “clarinada do não me toques”, atitude que protege militares da prestação de contas por atos ilícitos que cometeram. Vem de longe, essa praxe, segundo Janio, desde os generais que sustentaram a ditadura varguista, os que golpearam a democracia em 1964 e 1968 e validaram torturas e assassinatos, para ficarmos nos exemplos mais notórios. Ninguém da turma dos quartéis assumiu, nem assume, qualquer responsabilidade por tudo isso.
A praxe do escapismo, da “clarinada do não me toques”, continua. Os militares se julgam à margem das críticas. Agora estão governando o país. Fazem e desfazem. Nos quartéis e em declarações, arrotam valentias, mas sempre que chamados às falas, se ouriçam e infundem ameaças de reação. Um general de Exército – Luiz Eduardo Ramos – toma vacina escondido num estacionamento. Outro, Eduardo Pazuello, general de Divisão, está se borrando de medo com a convocação pela CPI da Covid-19. Já foi submetido a pelo menos dez sessões de treinamento. O governo designou o Advogado Geral da União, André Mendonça, e o ministro Onix Lorenzoni, da Secretaria-Geral da Presidência, para orientá-lo. Nem isso foi suficiente para lhe infundir coragem. É controversa a história da quarentena a que se impôs por ter mantido, segundo informou, contato com assessores contaminados pelo vírus. Fala-se que pensou em comparecer fardado à CPI, para intimidar seus inquiridores, ou manter-se em silêncio, beneficiado por um eventual habeas corpus, sob a alegação de não produzir provas contra si mesmo. Pobre Pazuello, nada disso vai funcionar. Seu silêncio, se ocorrer, transmitido para o Brasil pela TV senado, será a tácita admissão de culpas e sua completa desmoralização. Incríveis, os militares brasileiros.
A paúra de Pazuello me fez recordar os tempos ginasianos, no Colégio Militar de Curitiba, quando ouvíamos, com insistência, que “soldado é superior ao tempo”. Não usávamos guarda-chuva, apenas um plástico envolvendo os quepes. Que bravura! E aqueles militares no Conselho de Sentença da auditoria militar que julgava Dilma Rousseff? Para as fotos, protegeram os rostos com as mãos, não queriam ser identificados. Quanta valentia!
A verdade é que Pazuello não se livrará de depor na CPI. Lá estará – mesmo sob condução coercitiva (sob vara, dizia-se antigamente), como admitem membros da comissão – para explicar-se sobre sua desastrosa gestão no Ministério da Saúde. E o fará sabendo de suas fragilidades. É militar do serviço de Intendência do Exército, atividade de apoio encarregada de suprimentos (uniformes, equipamentos individuais, munições, alimentos), de lavanderia, banho e transporte. Seus integrantes não são os mais brilhantes da força. Pazuello passou a vida em quartéis, recebendo e dando ordens. Seu traquejo não passa desse pobre ramerrame. Lembram-se do “aqui um manda, outro obedece”? Não adianta treiná-lo. Não é talhado ao debate, à interlocuções intelectualmente mais sofisticadas como as que encontrará na CPI. O Governo está em pânico. Aguardemos para conferir se, desta vez, a clarinada do “não me toques” vai funcionar.