Leci é pioneira no debate sobre a diversidade sexual na MPB

Personalidades de diferentes campos celebram o legado de Leci Brandão. Veja quem destacou sua defesa da diversidade no Portal Vermelho

Leci discursa durante a Parada do Orgulho LGBT+ de 2018.

Neste 12 de setembro de 2024, o Portal Vermelho foi o espaço para que várias figuras públicas fizessem suas homenagens à sambista e deputada estadual Leci Brandão (PCdoB-SP), que completou 80 anos. Com uma trajetória marcada pelo compromisso com a cultura popular, a defesa da igualdade racial, dos direitos das mulheres e da população LGBT+, Leci é referência na política e na música brasileira. A representatividade LGBT+ das homenagens foi expressa por Toni Reis, militante histórico, e as deputadas Daiana Santos (PCdoB-RS) e Dani Balbi (PCdoB-RJ).

Leci Brandão não tem nenhuma dificuldade em usar linguagem neutra. Sempre cumprimenta “todos, todas e todes”, numa demonstração do seu respeito pelas pessoas não-binárias, que não se identificam com o masculino ou com o feminino. Mas ela silencia quando se depara com as asneiras do bolsonarismo e da extrema direita. Prefere não se envolver e alimentar discussões estéreis criadas para desviar a atenção das pessoas dos verdadeiros problemas.

Leci reconhece com carinho a homenagem que Erick Cesar faz como cantor cover em shows nas casas noturnas LGBT+

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Seu Quilombo da Diversidade, como gosta de chamar seu gabinete ou “sua mandata parlamentar”, já eram referências, quando várias outras mandatas ocuparam espaço nos legislativos, obrigando os homens héteros, brancos, grisalhos e ricos, a conviverem com mulheres e homens transexuais, assim como com novas pautas, demandas e a infinidade de letrinhas da sopa LGBTQIAPN+. A própria presença de mulheres feministas já causou enormes constrangimentos a deputados abusivos e despreparados.

O pioneirismo é uma marca de Leci em várias questões. Segundo a historiadora Rita Colaço, ela foi a primeira artista da MPB a falar com naturalidade sobre sua homossexualidade. Isso aconteceu no jornal Lampião da Esquina, nº6, de novembro de 1978, nas páginas 10 e 11. A capa da edição anunciava Leci com uma representante da música popular “entendida”, como as pessoas LGTB+ se tratavam na época da ditadura. A entrevista, que tornou-se motivo para perseguições até em sua escola de samba Mangueira, começa assim:

De três anos para cá, além de indiscutível substância artística, a compositora Leci Brandão ganhou também a fama de ser uma das porta-vozes musicais daquilo que ela mesma chama de “povo guei brasileiro”. No LP “Coisas do Meu Pessoal”, a música ligada ao tema era “Ombro Amigo”; no seguinte “Questão de Gosto” os homossexuais foram homenageados com “As Pessoas e Eles”. […] Nas duas páginas seguintes o leitor poderá sentir o peso da sinceridade dessa artista que não hesita em conversar abertamente sobre a sua tríplice — e nem sempre fácil — condição de mulher, negra e homossexual.

Leci sempre cantou o que quis, inclusive para falar de amor. Ela abordou a temática homoafetiva, mas mantinha certa discrição em casa por pensar na mãe, “uma mulher nascida em 1922, com outra cabeça”. Ouça abaixo as músicas mencionadas na reportagem do Lampião:

“As pessoas e eles”, em Questão de Gosto (1976)
“Ombro Amigo” faixa que abre Coisas do meu pessoal (1977)

No álbum Leci Brandão (1985), primeiro álbum gravado em São Paulo, é lançado um dos maiores sucessos de sua carreira, a canção “Zé do Caroço”, proibida na ditadura. Nele também, é possível ouvir a música “Assumindo”, canção que retrata uma mudança comportamental dos casais homoafetivos “Mas no meio dia de sol / Ou sob a meia lua / Vocês já andam de mãos dadas no meio da rua”:

Leci diversidade

A diversidade, sempre presente na trajetória de Leci Brandão, foi lembrada por Toni Reis, diretor-presidente da Aliança Nacional LGBT+. Ele destacou o pioneirismo de Leci ao levantar a bandeira da liberdade de orientação sexual em tempos de repressão. “Você foi a primeira pessoa que levantou a bandeira que nós podemos ser felizes com as nossas orientações sexuais”, afirmou Toni, reconhecendo o papel libertador da artista na comunidade LGBTQIA+.

Daiana Santos, deputada federal pelo PCdoB-RS, celebrou a presença de Leci como um ícone de inspiração, tanto na política quanto na cultura. “Celebro a tua existência e digo que é muito feliz viver neste mesmo tempo que tu e seguir os teus passos”, disse Daiana, emocionada ao falar sobre o impacto de Leci em sua própria jornada política.

A deputada estadual Dani Balbi (PCdoB-RJ) também somou sua voz às homenagens, ressaltando o legado político e cultural de Leci. Dani, uma mulher trans, destacou a contribuição de Leci na luta pela superação das injustiças sociais e fortalecimento da identidade negra no Brasil, além de sua atuação em defesa da população LGBT+. “Você é uma grande guerreira do povo brasileiro e eu tenho muita honra de ser sua camarada”, concluiu.

Esses depoimentos reforçam o quanto Leci Brandão transcende a figura de artista para se consolidar como uma referência política, feminista e defensora incansável da diversidade, inspirando diferentes gerações na construção de um Brasil mais inclusivo e justo. Aos 80 anos, Leci continua sendo um farol de resistência e esperança para milhões de brasileiros.

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