Debates na TV, pra quê?
A influência midiática e digital nas campanhas eleitorais prioriza a forma sobre o conteúdo, transformando debates e sabatinas em jogos de aparências e superficialidade
Publicado 29/08/2024 15:35
Desde o histórico confronto entre Kennedy e Nixon nas eleições presidenciais dos EUA, em 1960, em que se atribuiu em boa parte a vitória do democrata ao desempenho superior ao adversário em debate na TV, essa passou a ser uma das principais referências das campanhas eleitorais.
Inclusive no Brasil, mesmo quando engatinhavamos no formato televisivo.
Muita coisa evoluiu desde então.
E as campanhas foram incorporando cada vez mais o elemento midiático se sobrepondo à abordagem direta do eleitor.
O debate Lula x Collor, em 1989, recebeu da rede Globo, no dia seguinte, no Jornal Nacional, versão manipuladamente favorável ao candidato da direita, ao final vitorioso nas urnas.
No último pleito presidencial, visível era o esforço de Bolsonaro, no confronto direto com Lula, em pronunciar frases desconectadas do contexto e praticar gestos ofensivos diante das câmeras, como que de encomenda, para edição e divulgação imediata nas redes sociais.
É onde a forma importa mais do que o conteúdo, o eleitor é submetido a um jogo de aparências e privado da percepção da essência de cada candidatura.
E os tais “analistas” da grande mídia, deliberadamente, completam esse jogo de artifícios dando mais atenção a frases de efeito e a gestos histriônicos do que ao conteúdo.
Tudo a ver com a dominante comunicação digital, superficial e instantânea, que mais explora as aparências e a emoção do que o conteúdo — em sintonia com um ambiente da chamada guerra cultural, onde navega em plena ofensiva extrema direita.
Em certa medida, as tais “sabatinas” a que são submetidos os candidatos nas diversas mídias se prendem ao mesmo conceito.
Ao G1, arguido pela jornalista Natuza Nery, o deputado Guilherme Boulos foi insistentemente pressionado a explicar em detalhes sua posição sobre os acontecimentos na Venezuela, como se esta fosse uma questão crucial para a governança da capital de São Paulo.
Às forças que pelejam nessas eleições com um olho na cidade e o outro nos destinos do país cabe explorar competentemente, e a seu modo, todas as possibilidades da campanha conjugada nas ruas, nos salões e nas redes.