Leci Brandão diz que TV Globo a tirou do carnaval por falar de favelas
A sambista e deputada estadual Leci Brandão, que trabalhou durante anos na transmissão do carnaval, revelou em podcast o pedido para falar menos das comunidades
Publicado 22/08/2024 12:55
A ícone do samba e deputada estadual Leci Brandão (PCdoB-SP) participou do podcast “Carnaval Sem Julgamento”, na última segunda-feira (19).
Na entrevista, ela explicou como o carnaval se mistura com a sua vida e com a história do Brasil. A cantora ainda falou como a festa popular dos sambódromos com os sambas-enredo faz o povo pensar em temas latentes da sociedade.
Leci também passou por seu repertório musical e como se dá o processo de composição de samba e samba-enredo, assim como sobre o seu histórico junto à escola de samba Mangueira.
Na oportunidade ainda comentou sobre um desfile histórico que a marcou enquanto comentarista, o Kizomba, Festa da Raça, da Vila Isabel, em 1988.
No programa apresentado por Bruno Chateuabriand e Paola Novaes, a sambista falou que acompanhou o carnaval de 2024 à distância por problemas de saúde.
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Ao ser questionada por Novaes sobre a importância da introdução das referências às favelas nas transmissões do carnaval, Leci revela que foi tolhida nos comentários pela direção da TV Globo por fazer se referir às comunidades.
“Eu lembro que eu fui afastada. De 84 a 93 eu comentei o carnaval no Rio e fiquei sabendo por um amigo meu do jornalismo que disse: você fala muito em comunidade, Leci, tenta falar menos comunidade, porque isso está incomodando. Tem gente da direção que acha que você está falando demais. Eu falei, por mim tudo bem. E [por causa da] palavra comunidade me tiraram do comentário do carnaval, nunca vou esquecer isso, foi em 93. Eu comentei de 84 no Júri da Paixão e fui até 93. Aí saí do carnaval e em 2001 me chamaram de novo. Eu comentei em 2001 e a partir de 2002 eu fui convidado para vir para São Paulo”, explica.
Ao ser convidada para retornar aos comentários, o diretor da Globo que a convidou reiterou o pedido que a afastou das transmissões do Rio: o de não falar muito nas comunidades.
Sob a luz dos dias atuais a situação salta aos olhos, pois, nas últimas décadas, falar sobre o processo de criação do carnaval nas comunidades se tornou essencial para as transmissões, o que revela o pioneirismo de Leci.
“O que mais ele [o diretor] me chamou a atenção foi para que eu tentasse não falar muito da comunidade. Para que eu tentasse um comentário mais desvinculado disso. Para mim foi um pouco difícil, porque o que que eu fazia, três ou quatro meses antes, eu tinha um caderno espiral com 200 folhas, com esse caderno eu ia aos barracões e ensaios técnicos para poder anotar o nome das pessoas, saber o que elas faziam, como é que elas iam sair. Era uma coisa mais de tentar humanizar o desfile. Aí mudei a minha a minha forma de comentar, ou seja, falava das pessoas, mas tentava não falar da comunidade para não causar problema”, lamentou a sambista.
O entrevistador Bruno Chateaubriand ressaltou que Leci esteve a frente do seu tempo ao pontuar a importância das comunidades das escolas de samba.
“A senhora que trouxe essa palavra para o samba, as comunidades das escolas de samba. Ao mesmo tempo hoje a sua fala se encaixa totalmente nas narrativas que são solicitadas, não só pela bolha do samba, mas pela sociedade que acompanha esse processo lindo ao longo do ano. Então triste daqueles que falaram para a senhora não falar comunidade”, exaltou o apresentador.
Confira a íntegra da entrevista: