As regiões metropolitanas e o parlamento comum

A formação desordenada das metrópoles brasileiras exige soluções integradas; o Parlamento Comum emerge como resposta para a gestão dos desafios metropolitanos.

Rio de Janeiro (RJ), 14/02/2023 - Vista da comunidade do Morro Azul tendo ao fundo parte de um conjunto de prédios modernistas, em Laranjeiras, zona sul da cidade | Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

O processo de formação das maiores cidades brasileiras gerou uma tal ocupação de seus territórios, com crescimento desordenado, que sua mancha urbana, em geral, ultrapassou os limites do município núcleo, adentrando no território de municípios vizinhos e formando nossas regiões metropolitanas.

Isso ocorre em um intervalo de tempo extremamente curto, invertendo completamente o panorama demográfico das cidades e metrópoles brasileiras em pouco mais de 60 anos. O percentual da população residente nas cidades por ocasião do censo demográfico de 1950 era da ordem de 36,2% e, nos últimos censos, alcançou o patamar de 85%, em nosso país.

Além disso, tal crescimento não veio acompanhado da devida estruturação desse espaço geográfico de forma a acolher em condições dignas tão elevado contingente de pessoas, que nasceram nesse local ou que a ele chegaram em busca de oportunidades.

Diante da incapacidade do poder público de assegurar moradia, transporte, saneamento básico, acesso ao mercado de trabalho e a serviços básicos como saúde e educação, entre outros, além do elevado e crescente preço da terra no contexto urbano, essa população passou a ocupar as periferias das grandes cidades.

Na maioria dos casos, essas periferias ultrapassam os limites físicos da cidade polo e passam a ocupar o território dos municípios vizinhos, evidenciando o fenômeno do transbordamento. Muitos desses municípios, de porte bem menor, são desprovidos de uma infraestrutura capaz de atender, adequadamente, às necessidades básicas da população.

Dessa forma passam, da escala urbana à metropolitana, graves  problemas como a exclusão, a pobreza e a desigualdade social, a crise habitacional, a segregação espacial, a degradação ambiental, além da violência urbana (agora em âmbito regional), entre outros. Face a tais dilemas, considerando que cabe ao poder público cuidar do bem-estar das pessoas, que resposta oferece a gestão pública?

Dentro dos limites da jurisdição de cada município, no universo do tradicional pacto federativo à moda brasileira, as respostas a esses desafios se configuram como ações fragmentárias e marcadas pela lógica localista, que se mostram insuficientes ao enfrentamento de tamanhos problemas.

Afinal, como podem a Prefeitura e a Câmara Municipal, que já não conseguem dar conta de assegurar a universalização do direito constitucional ao bem-estar de seus próprios munícipes, ainda terem que cuidar da agenda de municípios vizinhos?

Entretanto, quando esses problemas são comuns a todos e interferem, igualmente, na vida de todos, é preciso que sejam buscadas soluções compartilhadas.

As chamadas funções públicas de interesse comum, conforme trata a Constituição Federal, em seu artigo 25, inciso III, exigem a efetiva ação do Estado, sob pena de se cometer a violação ao preceito constitucional que atribui, ao poder público, o dever de cuidar do bem-estar das pessoas.

No âmbito da municipalidade, diante de semelhantes desafios, o Poder Legislativo, uma vez legitimado pelo voto do eleitorado, respeitando os limites da jurisdição de cada município, pode e deve produzir e aperfeiçoar, nos espaços metropolitanos, instrumentos capazes de tratar, junto à sociedade, da agenda comum, a partir da ação articulada com o conjunto das Câmaras Municipais envolvidas.

Como exemplo, um instrumento dotado de capacidade política para tal é o Parlamento Comum da Região Metropolitana, fórum supra institucional formado pelo Poder Legislativo Municipal, reunindo o conjunto de Câmaras Municipais para atuar, em sintonia com a sociedade organizada no âmbito desse território, para aprovar e fazer implementar a Agenda Metropolitana.

O Parlamento Comum da Região Metropolitana, como espaço democrático articulado entre vereadores e vereadoras, é uma experiência concreta. Teve sua criação no ano de 2001 na Região Metropolitana de Natal e tem assegurado o direito a voz e voto no Conselho de Desenvolvimento Metropolitano de Natal, coordenado pelo Governo do Estado.

Existe, a partir dessa experiência, em outras regiões metropolitanas brasileiras. Precisa ser retomado, para contribuir com a tarefa institucional de cuidar das pessoas, no espaço metropolitano.

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