Milei defende prisão para maiores de 13 anos na Argentina

Debate sobre a redução da idade de imputabilidade dos menores avança no regime de extrema-direita apesar da contradiçnao com a Convençnao sobre Direitos da Criança

Governo da Argentina quer baixar para 13 anos a idade de cobrança de menores

A ministra da Segurança Nacional do governo de Javier Milei, Patricia Bullrich, apresentou nesta sexta-feira (28) o projeto de lei “Regime Penal Juvenil”. Esta é a reforma que o governo argentino enviará “nos próximos dias” ao Congresso para reduzir a idade de imputabilidade dos menores de 16 para 13 anos.

A proposta de reduzir em três anos a idade a partir da qual se pode julgar e privar da liberdade adolescentes que cometem um delito é motivo de debate social, especialmente em casos de insegurança que envolvem menores e resultam em vítimas e familiares clamando por justiça. Mas agora a política oficializou sua posição: o governo quer imputar menores a partir dos 13 anos.

“É impossível combater os criminosos sem leis que protejam as forças federais de segurança e a justiça na proteção dos argentinos de bem. Por isso, por decisão do presidente Milei, as equipes conjuntas do Ministério da Segurança e do Ministério da Justiça trabalharam na redação do Projeto de Redução da Idade de Imputabilidade, com o objetivo de acabar com a impunidade, deter a porta giratória e responder às demandas da população”, explicaram Bullrich e o ministro da Justiça, Mariano Cúneo Libarona.

Os especialistas opinam sobre o objetivo oficial de baixar a idade de imputabilidade dos menores destacando uma contradição com a Convenção sobre os Direitos da Criança.

O desenvolvimento infantil

“Atualmente, quando a inimputabilidade é decretada, como no caso do funcionário de um posto de gasolina em Rosario assassinado por um menino de 15 anos, o juiz encerra o caso imediatamente. Com este projeto, será necessário um relatório ambiental, psicológico e interdisciplinar para avaliar se um inimputável, ou seja, um menor de 13 anos, está em perigo. Não fazer isso, como ocorre agora, é abandonar alguém que não é punível, mas pode estar em risco ou representar um risco para outros”, explicou Fernando Soto, diretor nacional de Normativa e Enlace Judicial, que participou da redação do texto.

Por outro lado, os detratores da proposta destacam uma contradição com o que exige o Comitê Internacional dos Direitos da Criança, que monitora a Convenção sobre os Direitos da Criança. “É o tratado internacional mais ratificado na história do mundo e foi incorporado ao nosso sistema constitucional como lei suprema”, disse Rodrigo Morabito, juiz da Câmara de Responsabilidade Penal Juvenil de Catamarca.

Em 2019, o comitê emitiu a Observação Geral N°24, que afirma que “as evidências documentadas em Desenvolvimento Infantil e Neurociência indicam que a maturidade e o pensamento abstrato ainda estão evoluindo entre os 12 e 13 anos, pois a parte frontal do córtex cerebral ainda está se desenvolvendo”. Morabito, que também é membro da rede de juízes da Unicef, reforça que “é improvável que a essas idades compreendam as consequências de suas ações ou entendam os procedimentos penais”.

Impacto da medida

Outro ponto do debate é como a redução da idade para 13 anos, permitindo a privação de liberdade em estabelecimentos especiais, mudaria o destino dos adolescentes e das potenciais vítimas. Morabito argumenta que “endurecer a política penal não melhorou a qualidade de vida dos cidadãos nem reduziu os índices de criminalidade, que aumentam conforme crescem a população e os níveis de pobreza”.

O juiz também ressalta a importância de intervenções precoces em adolescentes inimputáveis, afirmando que “os sistemas de proteção integral de direitos devem trabalhar fortemente com jovens que cometem transgressões menores, uma vez que geralmente evoluem para delitos mais graves”.

Dados e Estatísticas

Em 2023, a Argentina registrou um aumento de quase 8% nas causas envolvendo menores de 18 anos, com mais de 26 mil episódios de roubos, furtos, agressões, abusos e assassinatos. Na província de Buenos Aires, foram 23.846 causas iniciadas em 19 departamentos judiciais, e na Capital Federal, 2.197 expedientes foram analisados pela Justiça Nacional de Menores.

Embora o impacto de alguns casos possa ser mais estridente, o maior percentual de delitos cometidos por menores está relacionado a crimes contra a propriedade. Em Buenos Aires, esses casos representam 28% do total de denúncias.

Regime Penal Juvenil

O texto, denominado “Regime Penal Juvenil”, define a idade de responsabilidade penal e estabelece medidas punitivas de acordo com o crime cometido. De acordo com o novo projeto de lei, as penas podem chegar a 20 anos de prisão.

Principais Pontos do Regime Penal Juvenil

  1. Faixa Etária: Adolescentes de 13 a 18 anos.
  2. Direitos e Garantias: Os direitos e garantias reconhecidos na Constituição Nacional e nos instrumentos internacionais serão assegurados.
  3. Locais de Detenção: Menores infratores serão mantidos em estabelecimentos especiais ou seções separadas de estabelecimentos penitenciários, sob a direção de pessoal qualificado.
  4. Adaptação por Distrito: Segundo Bullrich, “uma vez incorporado ao Código Penal, cada distrito adaptará isso aos seus códigos processuais; deverão decidir que tipo de locais de detenção utilizarão para os menores”. A ministra explicou que nem todas as províncias estão na mesma situação e, por isso, devem decidir onde os menores que cometem delitos serão alojados.

Medidas Complementares

Os pais serão informados sobre a imputação e outros atos processuais. O juiz e o Ministério Público fiscalizarão continuamente a tutela efetiva dos direitos das vítimas, que receberão atendimento psicológico e assistência jurídica gratuita. No caso de pena condicional, serão implementadas medidas complementares, como aconselhamento, orientação, participação em programas educacionais, formação cidadã, capacitação profissional, assistência médica ou psicológica, obrigação de buscar emprego, comparecimento ao tribunal, proibição de consumo de álcool e drogas.

Penas Previstas no Regime Penal Juvenil

  • Penas de 3 a 6 anos: Se não houver morte da vítima, violência grave contra pessoas ou lesões graves em crimes culposos, a pena pode ser substituída por medidas como advertência, proibição de aproximação da vítima, proibição de dirigir veículos, proibição de frequentar determinados lugares, prestação de serviços à comunidade, monitoramento eletrônico.
  • Máximo de Penas: 20 anos: Ao cumprir 2/3 da pena, o tribunal pode decidir continuar com medidas alternativas. O cumprimento das penas será verificado pelo juiz ou pelo fiscal, e a vítima também poderá verificar se desejar. Em caso de descumprimento não justificado de uma pena alternativa, o juiz a substituirá por uma mais severa. Para penas não superiores a três anos, o menor infrator poderá ter liberdade condicional, sujeita a certas condições.

Outros Pontos do Regime Penal Juvenil

Nos casos de menores não imputáveis (por exemplo, menores de 13 anos), o juiz investigará a existência e circunstâncias do ato ilícito e a suposta participação de terceiros, realizando avaliação psicológica e relatório ambiental. Em caso de risco de reincidência, poderá ordenar a internação para readaptação social. Um supervisor será designado para acompanhar o menor, realizando entrevistas regulares e ajudando a resolver problemas de saúde. A demora injustificada no processo será considerada falta grave pelo juiz, e o fiscal poderá dispensar total ou parcialmente a ação penal em casos de crimes com pena inferior a seis anos, desde que não haja outras circunstâncias agravantes.

Este projeto de lei, que ainda precisa ser aprovado pelo Congresso, promete provocar um intenso debate na sociedade argentina, balanceando a necessidade de segurança pública com a proteção dos direitos dos menores.

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