Parlamentares se unem na luta contra a venda da Sabesp
Em audiência na Câmara paulistana, vereadores, deputados, especialistas e movimentos sociais denunciam os riscos da privatização do saneamento
Publicado 29/11/2023 07:30 | Editado 30/11/2023 18:57
Nesta segunda-feira (27), uma audiência pública na Câmara Municipal de São Paulo serviu como grito de alerta para a população paulista sobre “Os impactos da privatização da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo – Sabesp”. Às vésperas de uma grande greve dos trabalhadores paulistanos em defesa do saneamento e da Sabesp pública, os deputados federais Orlando Silva (PCdoB-SP), Joseildo Ramos (PT-BA) e Juliana Cardoso (PT-SP) promoveram o evento no legislativo paulistano para discutir a relação da capital com a estatal de saneamento.
Em entrevista ao Portal Vermelho, o deputado federal Orlando Silva compartilhou suas preocupações e perspectivas sobre o processo de privatização da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp). O parlamentar destacou a importância de um debate público aberto sobre o tema, ressaltando a lucratividade e eficiência da empresa estatal. O debate tem sido travado pelo governador que tenta aprovar a venda da empresa a toque de caixa, evitando audiências nas Comissões da Assembleia Legislativa.
Empresa Lucrativa e Eficiente
Orlando Silva enfatizou que a Sabesp é uma empresa lucrativa, registrando um impressionante lucro de mais de 3 bilhões de reais no último ano. “Ela atende a cerca de 30 milhões de pessoas através de 10 milhões de contas, e desempenha um papel crucial no fornecimento de saneamento básico, respondendo por metade dos investimentos do setor no Brasil”, disse ele.
Diante desses números, o deputado argumentou que não há justificativa plausível para a privatização da Sabesp, especialmente considerando experiências recentes, como a privatização de uma linha do metrô, que resultou na precarização dos serviços e no sofrimento dos usuários.
Orlando acusa o governador de tentar atropelar a constituição estadual. Além disso, lamentou a falta de diálogo com os sindicatos, afirmando que o governador “sequer se dignou a conversar para discutir o futuro dos trabalhadores diante da privatização iminente”. “A companhia, que responde por metade dos investimentos em saneamento básico no país, é formada por mais de 10 mil trabalhadores, incluindo mais de 12 mil especializados na área”.
O deputado ressaltou a gravidade da situação, alertando que a privatização da Sabesp coloca o Brasil em rota oposta às tendências globais. “Enquanto no mundo há uma reversão de processos de privatização, no Brasil, o governador do estado de São Paulo insiste em seguir uma agenda privatista, desconsiderando até mesmo a constituição do estado”, criticou.
Orlando apontou para uma tendência global de reversão de processos de privatização, citando o exemplo da França, onde 106 empresas privatizadas foram reestatizadas. No contexto brasileiro, o deputado destacou os casos de Tocantins e do Amazonas, que, após avançarem na privatização, enfrentaram consequências negativas.
Desrespeito à Constituição e diálogo com prefeitos
Fotos de: Richard Lourenço/Câmara
O deputado criticou veementemente a postura do governador, alegando que a privatização da Sabesp está sendo realizada à revelia da Constituição Estadual. Ele argumentou que tal processo só poderia ser autorizado por uma emenda constitucional, destacando a ausência de consulta à população.
Quanto ao diálogo com prefeitos, Orlando Silva expressou confiança de que a maioria deles é contrária à privatização. “A Sabesp, ao gerar lucros significativos em grandes cidades, possibilita o subsídio cruzado, beneficiando municípios menos rentáveis. A manutenção da Sabesp como empresa estatal é crucial para garantir a estabilidade e a qualidade dos serviços em todo o estado”, afirmou.
Orlando destaca a importância do debate público sobre a privatização da Sabesp e ressalta a necessidade de respeitar os princípios constitucionais. “A luta contra a privatização emerge não apenas como uma questão política, mas como um esforço coletivo em defesa do acesso universal a serviços de saneamento básico de qualidade”.
Foi o deputado federal que conduziu a audiência pública com o objetivo de aprofundar o debate a partir do encontro de políticos aliados da Sabesp pública, especialistas e lideranças de movimentos sociais. Em seu discurso incisivo, o parlamentar alertou para os graves riscos que a sociedade paulista enfrenta ao perder um dos seus maiores patrimônios.
Privatização e precarização
O deputado enfatizou que as experiências recentes de privatização, como no Serviço de Energia da Enel e no metrô, revelam que a promessa de melhoria nos serviços após a privatização é apenas retórica. Ao contrário, o que se observa é a precarização do serviço público, motivo pelo qual ele destacou a importância da luta e do debate em defesa do patrimônio público.
O discurso contundente do deputado Orlando Silva reflete a preocupação com a privatização da Sabesp e a importância de mobilizar a sociedade e os trabalhadores na defesa desse patrimônio público vital para o estado de São Paulo. O debate está lançado, e a luta pela preservação do saneamento básico como um direito público fundamental ganha força.
Frente Nacional
José Faggian, presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sintaema), também falou ao Vermelho sobre as expectativas em torno da audiência promovida pela Câmara Federal, com o intuito de ampliar o debate e impedir a privatização do saneamento, em especial da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp).
A audiência de hoje, conforme destacado por Faggian, é parte de uma frente nacional em defesa do saneamento público, abrangendo não apenas a Sabesp, mas também a preocupação com os prejuízos da privatização do saneamento em nível nacional. “A expectativa é a de enriquecer o debate, fornecendo elementos essenciais para engajar a sociedade nessa discussão crucial”, afirmou.
Faggian revelou que a grande expectativa está voltada para a terça-feira, marcada por uma greve geral que unirá diferentes setores, incluindo professores do município e do estado, trabalhadores da Sabesp, Metrô, CPTM, todos unificados contra a privatização do saneamento. “O objetivo é realizar um amplo movimento na cidade e no estado de São Paulo, culminando em um ato expressivo na Assembleia Legislativa do Estado (Alesp)”, disse.
Epicentro da resistência
Faggian reconheceu os desafios enfrentados na Alesp, considerando a maioria de deputados governistas favorável ao projeto de privatização. Contudo, ele destacou a importância da articulação nos municípios para barrar a venda. “A mobilização na Câmara Municipal e em outros municípios é crucial para impedir o avanço do projeto. Apesar da dificuldade na Alesp, ainda há uma parcela de deputados não totalmente convencidos, e a existência de ações judiciais, como a argumentação pela necessidade de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), oferece esperança para a oposição à privatização”, pondera.
Faggian sublinhou a importância estratégica de São Paulo no cenário da privatização da Sabesp, visto que metade da empresa está situada na capital paulista. A criação de uma comissão de estudos sobre a privatização da Sabesp na Câmara Municipal sugere espaço para um debate amplo, e, segundo o presidente do Sintaema, a atual postura da Câmara é, ao menos por enquanto, desfavorável à privatização. “O desfecho depende de diversos fatores, como a participação da população e da sociedade nesse momento crucial para o futuro do saneamento básico no estado de São Paulo”.
Acordo nas Sombras
A vereadora Sílvia, da Bancada Feminista do Psol, protagonizou um discurso incisivo destacando os perigos da privatização da água e do saneamento básico. Sua fala enfatizou a importância da mobilização contra os acordos entre o governo Tarcísio e o prefeito Ricardo Nunes, que, segundo ela, ameaçam comprometer o bem precioso que é a água.
A vereadora Sílvia também mencionou as mais de 200 cidades no mundo, incluindo metrópoles como Berlim e Paris, que estão revertendo a privatização do sistema de água e saneamento básico, enquanto o governo paulista segue em direção oposta.
A parlamentar criticou duramente o acordo realizado nas sombras entre o governador e o prefeito, destacando a adesão do município de São Paulo à privatização da Sabesp sem passar pela Câmara dos Vereadores. Sílvia alertou para experiências negativas de privatização, citando o exemplo do Rio de Janeiro, onde a qualidade da água piorou, as taxas aumentaram e as pessoas foram afetadas por doenças.
Prejuízo e roubo
A vereadora Luana Alves (Psol), fez uma intervenção revelando detalhes cruciais sobre o contrato entre a Sabesp e o município de São Paulo. Ela destacou os esforços da bancada em tentar criar uma frente parlamentar em defesa da Sabesp, enfrentando, no entanto, obstruções dos republicanos, partido do governador Tarcísio. Apesar das dificuldades, a vereadora ressaltou que agora há uma comissão de estudos atuante, evidenciando a persistência na resistência à privatização.
Para ela, privatizar uma empresa pública lucrativa, construída coletivamente com investimento público em tecnologia e funcionários públicos, é um tipo de roubo contra os cidadãos. A preocupação de Luana é clara: privatizar a Sabesp é precarizar serviços e extrair mais lucro em detrimento do bem-estar da população.
A vereadora elucidou aspectos do contrato entre a Sabesp e o município de São Paulo, destacando dois pontos cruciais. Primeiramente, ressaltou que 7,5% do faturamento da Sabesp, aproximadamente 600 milhões de reais neste ano, são destinados diretamente aos cofres municipais. Em segundo lugar, sublinhou que a Sabesp é obrigada a destinar 13,5% do total de seu faturamento, equivalente a mais de 1 bilhão e meio de reais, para obras de infraestrutura no município.
Luana questionou a lógica de uma empresa privada aceitar baixar uma porcentagem do lucro para o município em que atua, algo que não ocorre em lugar nenhum. Além disso, alertou que, em caso de privatização, o contrato com São Paulo é extinto, revertendo toda a infraestrutura para o município.
A vereadora encerrou sua fala destacando que o projeto de privatização proposto por Tarcísio é juridicamente frágil e não pode prosseguir sem passar pela Câmara Municipal de São Paulo, que representa 47% do saneamento do estado.
Interesses privados e dilapidação
O vereador Eliseu Gabriel (PSB) alertou para os interesses privados por trás da venda da Sabesp. Suas palavras destacaram os riscos iminentes e os possíveis impactos na cidade. Eliseu apontou que a cidade de São Paulo, que representa praticamente metade do faturamento da empresa, pode ser decisiva para impedir a concretização desse processo.
O parlamentar abordou a tentativa do prefeito em criar Unidades Regionais de Serviços de Abastecimento de Água Potável e Esgotamento Sanitário (URAE), evidenciando a preocupação da gestão municipal em buscar alternativas para evitar a privatização.
Eliseu fez uma comparação salarial, destacando que os salários dos dirigentes da Sabesp são substancialmente inferiores aos que seriam praticados em uma empresa privada do mesmo porte. Ele utilizou o exemplo da Enel. Na experiência da Enel, houve demissões em massa e a substituição de trabalhadores qualificados por terceirizados, resultando em problemas de manutenção e serviço na cidade de São Paulo.
O vereador classificou a tentativa de privatização como uma jogada de interesses privados vergonhosa, sem justificativa clara quanto à melhoria do serviço ou redução de tarifas. Ele destacou a importância da mobilização não apenas da população, mas também de setores empresariais que, segundo ele, sofreriam com os impactos negativos da privatização. São pequenas empresas fornecedoras que gravitam em torno da Sabesp. Segundo ele, o setor privado deixa de recorrer a elas para produzir ele mesmo os insumos que precisa. Ele ressaltou a necessidade de explicar às pessoas ligadas a essas empresas os possíveis desdobramentos, visando a conscientização sobre os riscos envolvidos.
Manobras do prefeito
O vereador Toninho Véspoli (Psol) fez uma analogia com a experiência enfrentada na cidade de São Paulo após o apagão, onde a Enel foi responsabilizada por parte das quedas de energia. Ele mencionou que representantes sindicais eletricitários relataram que 35% das falhas eram devido à precarização e sucateamento da rede elétrica. O vereador ressaltou que a mesma lógica poderia ser aplicada à Sabesp, alertando para a possibilidade de uma rede sucateada ser devolvida ao Estado após a privatização.
“Isso significa privatização, é lucro máximo, sucateamento depois para o povo pagar a conta,” enfatizou Véspoli. O vereador criticou a postura do prefeito da cidade de São Paulo, que teria aberto mão de aproximadamente 1,6 bilhão de reais anualmente devido à privatização da Sabesp.
Ele questionou a decisão do prefeito de aderir à Unidades Regionais de Serviços de Abastecimento de Água Potável e Esgotamento Sanitário (URAE) sem discussão pública e acusou tal atitude de ser parte de negociações políticas.
Véspoli expressou sua indignação com o processo de privatização, ressaltando que até mesmo Milton Leite, presidente da Câmara Municipal, considera o assunto escandaloso e acredita que a discussão deveria passar pela casa legislativa. O vereador classificou como absurda a situação em que o prefeito abre mão de recursos significativos sem uma ampla discussão na sociedade.
Meca dos privatistas
O deputado estadual Emídio de Souza, líder da Frente Parlamentar de Combate à Privatização da Sabesp na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), abordou a longa trajetória de privatizações em São Paulo, que remonta aos anos 90, citando exemplos como CPFL, Eletropaulo, CESP, Banespa e concessões de estradas. Ele enfatizou que essa tendência persiste até os dias atuais, com recentes vendas de parques estaduais e outros ativos pelo governo de João Dória.
O deputado desmontou os argumentos usados pelos defensores da privatização da Sabesp. Contrapondo-se à narrativa de que a empresa é ineficiente, não dá lucro e não inova, Emídio destacou a eficiência da Sabesp, uma empresa que se tornou referência na América Latina. Ele ressaltou os lucros significativos da empresa, que alcançou R$ 3.2 bilhões em 2022, com 75% reinvestidos em saneamento e 25% retornando ao Estado de São Paulo como acionista majoritário.
Emídio alertou para as possíveis ameaças à Sabesp em caso de privatização, mencionando estratégias de maximização de lucros, como demissões em massa e aumentos tarifários. Ele também desmentiu o argumento da universalização, destacando que a empresa já está em processo de alcançar esse objetivo, mesmo sem a privatização. O deputado enfatizou que a lógica por trás da privatização não se sustenta diante das condições sólidas da Sabesp.
O parlamentar convocou a população para uma mobilização ativa, destacando a importância da presença nas ruas, independentemente das barreiras impostas pelo governo. Ele também ressaltou a necessidade de ações jurídicas, citando ações em andamento no Supremo Tribunal Federal e no Tribunal de Justiça de São Paulo. Além disso, Emídio destacou a importância de pressionar parlamentares indecisos e os que temem manifestar oposição à privatização.
Relevância nacional
A deputada Fernanda Melchionna, representando a deputada Sâmia Bonfim, ambas do PSOL do Rio Grande do Sul e São Paulo, respectivamente, expressou sua solidariedade à luta contra as privatizações em São Paulo. Durante um discurso engajado, a parlamentar destacou a relevância nacional da batalha paulista, ressaltando que a resistência em São Paulo pode influenciar estados e municípios que enfrentam desafios semelhantes.
Fernanda iniciou seu pronunciamento enfatizando as mobilizações em curso no Rio Grande do Sul, unindo categorias importantes na luta contra diversas formas de privatização. Ela mencionou a resistência à privatização da Companhia Riograndense de Saneamento (CORSAN) e ressaltou a importância de manter instituições como a DEMAE, empresa municipal de água referência, fora do alcance privatizador.
A deputada ressaltou a relevância da luta em São Paulo como um exemplo que transcende as fronteiras do estado. Ela destacou o impacto potencial da mobilização paulista na alteração das relações de força em outros estados e municípios, que enfrentam desafios semelhantes.
A parlamentar criticou os resultados das privatizações, mencionando o caso lamentável da Enel em São Paulo. Ela também destacou a experiência no Rio Grande do Sul com a privatização da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE). A deputada alertou para o risco de demissões em massa, aumento de tarifas e piora na qualidade dos serviços.
A deputada manifestou sua solidariedade e o comprometimento em continuar apoiando a luta em São Paulo. Ela encorajou uma forte mobilização, reconhecendo a transcendência e a importância da resistência do povo paulista contra as privatizações. A deputada reiterou a união entre os estados na defesa do patrimônio público e na busca por um modelo que priorize os interesses da população.