PF encontra planos de golpe em celular de Mauro Cid
No aparelho do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro também havia mensagens de incentivo do coronel Jean Lawand para desrespeitar o resultado da eleição presidencial
Publicado 17/06/2023 18:41 | Editado 19/06/2023 12:37
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF) retirou, nesta sexta-feira (16) o sigilo do relatório da Polícia Federal com análise do conteúdo encontrado no celular do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), preso desde 3 de maio por suspeita de fraudar a carteiras de vacinação contra a Covid, incluindo a do ex-presidente. As informações são da Folha de S.Paulo.
As mensagens recuperadas mostram diálogos entre oficiais do Exército discutindo o uso das Forças Armadas contra o resultado das eleições que elegeram Lula. Parte do material foi revelado pela revista Veja.
Veja a íntegra do material encontrado pela PF:
Um dos interlocutores de Mauro Cid foi o coronel Jean Lawand Junior, nomeado recentemente como representante diplomático do Brasil nos Estados Unidos. Em áudios transcritos pela PF, Lawand pede que Mauro Cid convença Bolsonaro a dar a ordem para o uso das Forças Armadas, afirmando que se os oficiais não cumprirem, “acaba o Exército Brasileiro”.
“Cidão, pelo amor de Deus, cara. Ele [Bolsonaro] dê a ordem que o povo tá com ele, cara. Se os caras não cumprir, o problema é deles. Acaba o Exército Brasileiro se esses cara não cumprir a ordem do, do Comandante Supremo. Como é que eu vou aceitar uma ordem de um General, que não recebeu, que não aceitou a ordem do Comandante. Pelo amor de Deus, Cidão. Pelo amor de Deus, faz alguma coisa, cara. Convence ele a fazer”, revela um dos áudios transcritos pela PF.
Advogado Ives Gandra Martins consultado sobre intervenção das Forças Armadas
No celular de Mauro Cid, foram encontrados diálogos com o advogado e professor Ives Gandra Martins, com a teser de que o artigo 142 da Constituição permitiria uma intervenção das Forças Armadas em caso de conflito entre os Três Poderes. O advogado foi contatado por um major do Exército, que fez perguntas sobre as situações em que as Forças Armadas poderiam ser acionadas para garantir os poderes constitucionais.
Em sua resposta por e-mail, Ives Gandra menciona o golpe militar de 1964 para validar sua tese, mas nega ter contribuído para ideias golpistas. Ao UOL, ele disse que o conteúdo encontrado no celular de Cid foi preparado em 2017.
Material aponta possibilidade de golpe “dentro das quatro linhas” da Constituição
Outro documento de origem desconhecida enviado por Mauro Cid de um celular para outro, detalhava a possibilidade de realizar um golpe “dentro das quatro linhas” da Constituição. O texto argumenta que um juiz “não pode aplicar a lei de forma injusta, ou seja, contra A Constituição, em especial de modo contrário ao Princípio da Moralidade Institucional […] Do contrário, teremos uma atuação ilegítima”.
Na sequência, o autor enumera decisões tomadas por ministros do STF e TSE julgadas por ele como “ativismo judicial” com “aparente ‘legalidade”, mas “contrárias ao Princípio da Moralidade Institucional”.
O texto, então, sugere: “Diante de todo o exposto e para assegurar a necessária restauração do Estado Democrático de Direito no Brasil, jogando de forma incondicional dentro das quatro linhas, com base em disposições expressas da Constituição Federal de 1988, declaro o Estado de Sítio; e, como ato contínuo, decreto Operação de Garantia da Lei e da Ordem”.
Relatório da PF aponta associação criminosa investigada no inquérito das milícias digitais
A Polícia Federal afirma que tanto o material encontrado no celular de Cid indica a tentativa de materializar objetivos antes defendidos nas redes sociais por uma associação criminosa investigada no inquérito das milícias digitais. O inquérito investiga Cid, Bolsonaro, Anderson Torres e outros bolsonaristas envolvidos em eventos antidemocráticos como a live de 29 de julho de 2021 em que Bolsonaro atacou as urnas eletrônicas, no vazamento do inquérito sigiloso do ataque hacker ao TSE e na organização do 7 de setembro de 2021 e 2022.
“A milícia digital reverberou e amplificou por multicanais a ideia de que as eleições presidenciais foram fraudadas, estimulando aos seus seguidores “resistirem” na frente de quartéis e instalações das Forças Armadas, no intuito de criar o ambiente propício para uma intervenção federal comandada pelas forças militares”, diz a PF.
O relatório de 66 páginas foi produzido pela Diretoria de Inteligência da Polícia Federal e encaminhado ao ministro do STF. Nele, o delegado Fábio Shor afirma que os investigadores identificaram arquivos relacionados a uma possível tentativa de execução de um golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito envolvendo Mauro Cid.
Defesa de Bolsonaro nega participação
A defesa de Bolsonaro alega que os diálogos encontrados no celular de Cid mostram apenas que o ex-presidente “jamais participou de qualquer conversa sobre um suposto golpe de Estado” e que o celular do ex-assessor havia se tornado muitas vezes em uma “simples caixa de correspondência” para as “mais diversas lamentações”.
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com informações de agências
Edição: Bárbara Luz