Líder jovem denuncia avanço de neofascistas contra democracia boliviana
Dirigente do partido do governo Arce, Rodrigo Bustillos diz que o bloqueio por tempo indeterminado promovido pelo governador Camacho e sua turba se configura uma ditadura sobre a região
Publicado 25/11/2022 18:08 | Editado 25/11/2022 20:13
Um dirigente do partido do governo de Luis Arce descreveu com fatos a crise política que avança sobre a região mais rica da Bolívia, o departamento de Santa Cruz, onde milícias terroristas promovem bloqueios econômicos violentos. O objetivo é fazer oposição de direita ao governo progressista e desestabilizá-lo, com apoio de empresários e setores de mídia.
“O que está acontecendo neste momento no Estado é uma ditadura sobre a região, por meio de um bloqueio indefinido promovido pelo governador Luis Fernando Camacho e por suas hordas neofascistas”, denunciou Rodrigo Bustillos, assessor do Movimento Ao Socialismo (MAS), no Conselho Municipal de Santa Cruz de la Sierra, em entrevista exclusiva a Leonardo Wexell Severo.
A justificativa inicial para toda esta turbulência seria a antecipação da realização de um censo populacional que aumenta a participação de Santa Cruz no Orçamento nacional e na representação parlamentar.
Acontece que o Executivo, o Legislativo e o Judiciário estão atendendo uma a uma as reivindicação destes grupos, como a antecipação do Censo de População e de Moradia, “não havendo, portanto, nenhuma justificativa para a continuidade do protesto”.
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O Censo só iria ocorrer em 2024, segundo Bustillos, porque a extrema direita realizou o golpe de Áñez – que se encontra presa pelos assassinatos e inúmeros crimes praticados. Além disso, posteriormente aconteceu a epidemia de coronavírus.
Golpismo
Liderança do partido do presidente Luis Arce e do ex-presidente Evo Morales, Bustillos informou que os autodenominados “cívicos” da União Juvenil Cruzenhista são os mesmos que defenderam a queima da Whipala – o símbolo indígena oficial do país – durante o golpe de Jeanine Añez contra Evo em 2019.
“São milícias manejadas por grandes grupos corporativos empresariais, industriais e midiáticos – como as emissoras Unitel e Rede Uno – que nos têm cativos há mais de 30 dias por paralisações e bloqueios indefinidos com os quais tentam impor sua agenda por cima dos interesses da coletividade. É uma ação inconsequente que busca degenerar a democracia, que significa uma deterioração da economia com graves prejuízos, principalmente para os mais humildes e desprotegidos”, acrescentou.
Liderança da juventude do MAS, Bustillos explicou que, “na prática, o bloqueio representa uma violação da oligarquia ao conjunto da população, como o seu direito de ir e vir, ao trabalho e à educação, havendo uma censura terrível a tal extremo que se alguém discorda deles é convertido em inimigo de Santa Cruz”.
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“A situação chega a tal ponto, que se a pessoa é de outro Estado passa a ser pressionada a regressar por não ser daqui. Para esses bandos, a perseguição e o preconceito não têm nenhum limite”, acrescentou.
Prejuízo por bloqueio ultrapassa US$ 1 bi
O líder juvenil ressaltou que setores produtivos que discordaram da visão desta casta oligárquica, receberam como resposta pneus incendiados em frente à sua entidade empresarial. Ele frisou que “o bloqueio está causando perdas que já ultrapassam um bilhão de dólares, o que fez com que vários setores sociais iniciassem a se organizar e mobilizar, começando a haver duras confrontações, inclusive com mortos na cidade”.
“São inúmeros setores sociais como os transportistas, os vendedores ambulantes, comerciantes e trabalhadores que, vindos dos locais mais distantes, passaram a realizar marchas e desbloquear essas barricadas erguidas pelos grupos paramilitares”, acrescentou.
Até o momento, informou Rodrigo Bustillos, “acumulamos mortos e feridos, e todo tipo de agressões a mulheres, idosos e a trabalhadores da saúde”. “Houve casos em que, até mesmo quem está levando os seus falecidos é barrado, algo completamente irracional. A situação é extremamente crítica, a economia está pelo piso e os direitos fundamentais vêm sendo permanentemente violados”, protestou.
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De acordo com o dirigente juvenil, “vale ressaltar que Santa Cruz é o motor da economia boliviana, o principal catalisador da economia nacional, com cerca de quatro dos 12 milhões de habitantes do país”. Conforme a Associação de Pequenas e Médias Empresas, apontou, “já perdemos 15% dos nossos empregos, um percentual expressivo da nossa mão de obra, porque os melhores meses para a produção e comércio são justamente outubro e novembro”.
“A principal bandeira de luta desta oligarquia foi o censo, que nada mais é do que a contagem estatística da população. O que fizeram foi transformar um simples trâmite administrativo em toda uma odisseia de lutas e confrontações terríveis, manejadas pela elite dominante”, disse, considerando que tudo não passa de falso pretexto, diante da falta de diálogo com o governo. A antecipação do censo para 2023, foi comprovado que é inviável por questões técnicas, tratando-se de uma jogada oportunista.
Ele explicou que, em reiteradas oportunidades, o governo de Arce convocou para que se reunissem no espaço em que, por lei, se deveria debater, no caso o Conselho Nacional de Autonomia. É este espaço que deve reunir o presidente, ministros, os nove governadores, os representantes de todas as 556 prefeituras do país, os membros da Federação dos Municípios e os representantes das autonomias indígenas e regionais.
“São estes que deveriam sentar e definir as questões relativas ao censo ou ao pacto fiscal de distribuição da riqueza, no que refere à democracia representativa, porque pelo voto foram eleitos”, declarou o assessor do MAS.
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Sabotagem de Camacho
Neste cenário de diálogo, relatou Bustillos, o governador de Santa Cruz, Luis Fernando Camacho, não esteve presente. “Este foi o primeiro ponto de inflexão e ruptura por parte do governador de Santa Cruz. Numa segunda convocatória realizada em Cochabamba, quando já nos encontrávamos em pleno bloqueio, Camacho também não compareceu.
Isso quer dizer que o Censo de População e Moradia nunca foi sua prioridade, mas interesses políticos de desestabilização para provocar a ruptura da Bolívia a partir de Santa Cruz. “Os golpistas manipulam abertamente para propagandear a ‘independência’ com o Estado plurinacional”, disse.
Bustillos avalia que hoje os divisionistas estão mais isolados, em relação à tentativa da implementação da chamada “Meia Lua”, quando buscaram fragmentar o país em 2008, para incorporar os Estados de Beni, Pando e Tarija.
“O fato é que estes setores corporativos são movidos por outras bandeiras de luta e que, à medida que vão sendo contemplados, apresentam outras reivindicações, mantendo o bloqueio indefinido”, diz o dirigente partidário.
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Ele compara o que ocorre na Bolívia com o neofascismo bolsonarista, que viola abertamente o direito dos demais. “O governo já se comprometeu a fazer com que seja criada uma lei para garantir a realização do Censo em 2024, mas, mesmo assim, seguem com a paralisação e o bloqueio, o que é uma agressão insustentável à liberdade e aos direitos da coletividade”, concluiu.