Há esperança cristalina de quem aposta em vida e solidariedade como caminho para o recomeço.
Publicado 16/03/2021 12:57
Além do vírus, que sufoca e mata, há esperança.
Faz um esforço.
Além do cheiro forte dos corpos em decomposição, em covas precárias e improvisadas, faz um esforço: há esperança.
É duro falar sobre isso. É difícil viver o pesadelo diário da vida real. Pessoas morrendo sem ao menos chegar a um leito de hospital, fome, desalento.
Por isso, alguém tem que falar que há esperança.
Primeiro, há que se fazer o resgate de uma verdade: eles não venceram.
Eles roubaram. Eles golpearam. Eles subverteram o fluxo dos ventos. Mas não venceram.
Prometeram um mundo novo e entregaram uma câmara de gás a céu aberto.
O mundo que prometeram tinha moralismos imbecis, verdades esculpidas em gelo sob sol de 40 graus.
O mundo que eles prometeram tinha promessas inviáveis e maldades indizíveis.
E entregaram corpos sem vida, armas, agrotóxicos, florestas incendiadas, fome.
Mas há esperança no ar.
Não respira fundo, ainda.
Há que se respirar suavemente.
Leva para os pulmões apenas o oxigênio possível para o momento. E leva junto a harmonia de uma música bacana, a dança que quase te fez levitar, a poesia que te embriagou após sorver cada verso, até o último gole/palavra.
Lembra: o martírio não tem tanto tempo. Vivíamos tempos de esperança, apesar de breves e efêmeros.
O martírio chegou e nós resistimos. O martírio intensificou e nós resistimos. Resistimos até quando chegou a asfixia.
E aprendemos a respirar nossas verdades e crenças indeléveis.
Agora, há esperança no ar. Há esperança/vacina. Há esperança/verdade, que rompeu grilhões das masmorras de Curitiba.
Há esperança cristalina de quem aposta em vida e solidariedade como caminho para o recomeço.
Respiremos suavemente a esperança, mantendo profundo respeito pelos que foram e pelos que ainda serão vitimas do genocídio.
E caminhemos em nossos isolamentos. Fiquemos juntos em nossos distanciamentos. Em multidões solitárias em nós mesmos.
Expiremos esperanças e inspiremos rebeldias.
Até que passe o pesadelo para que possamos respirar a plenos pulmões: o cheiro de um mundo novo.