Fepal: As inverdades e os erros da Declaração Conjunta Brasil-Israel
A Federação Árabe Palestina do Brasil divulgou, nesta terça-feira (9), um texto onde denuncia as “afrontas ao Direito Internacional”, cometidas pela chancelaria bolsonarista em visita a Israel. Leia, abaixo, a íntegra da nota.
Publicado 10/03/2021 19:20 | Editado 10/03/2021 19:21
Em visita a Israel, oficialmente a convite deste e iniciada domingo (7) e terminando hoje (9), o ministro das Relações Exteriores brasileiro, Ernesto Araújo, fez circular, já no primeiro dia, através do site do MRE, uma Declaração Conjunta Brasil-Israel. Diante de suas afrontas ao Direito Internacional e à sua imprecisão histórica e fática, bem como por macular a elevada reputação da diplomacia brasileira, esta Federação Árabe Palestina vem a público esclarecer o que segue:
1. Antes de mais, é dada como assinada em Jerusalém, levando o Brasil a tacitamente apoiar sua ocupação e anexação por Israel, que a dá por sua capital, quando para o Brasil Telavive é a capital israelense.
2. A Comunidade Internacional não reconhece Jerusalém como capital de Israel. Pela Resolução 181, Jerusalém é um corpus separatum, sob regime internacional especial administrado pelo ONU. A Resolução 303, de 1949, manteve esta posição, assim como relatório da ONU, acerca dos Direitos Inalienáveis do Povo Palestino, de 1979. Em 2009 a ONU aprova a Resolução 63/30, que diz que “todas as ações de Israel, a potência ocupante, de impor suas leis, jurisdição e administração na Cidade Santa de Jerusalém são ilegais e, portanto, nulas e sem validade, e exorta Israel a cessar todas essas medidas ilegais e unilaterais”.
3. Além das resoluções da Assembleia Geral (a 181 dentre elas), o Conselho de Segurança da ONU tem seis a respeito de Jerusalém, todas em igual sentido. A 478 do CSNU, de 20 de agosto de 1980, considera ilegal a chamada “Lei Básica de Jerusalém”, por meio da qual Israel proclamou a cidade sua capital.
4. A Resolução 2334, de 23 de dezembro de 2016, do CSNU, reafirmou que os assentamentos de colonos nos territórios ocupados por Israel em 1967, dentre eles a parte oriental de Jerusalém, “não tem validade legal e viola a lei internacional”, sendo, ainda, “enorme obstáculo para o alcance de uma solução de dois Estados e da paz na região”.
5. Quando a ONU adotou a Resolução 181, que recomendava – e apenas recomendava – a Partilha da Palestina, o ministro de Relações Exteriores do Brasil não era Osvaldo Aranha, e sim Raul Fernandes, que comandou a pasta no governo de Eurico Gaspar Dutra (1946/51). Aranha foi MRE no governo Getúlio Vargas (1939/44) e chefiou a delegação brasileira na ONU. Ele presidiu Assembleia Geral na aprovação da resolução 181, mas era crítico da partilha, que acabou imposta à delegação brasileira por Dutra e Fernandes.
6. É imprecisa a afirmação de que da Resolução 181 teria resultado no “estabelecimento do Estado de Israel” em 14 de maio de 1948. Além de só recomendar a partilha, ela jamais foi implementada. Os estrangeiros euro-judeus sionistas, recém-chegados à Palestina por imposição da dominação colonial britânica, autoproclamaram-se estado nesta data, quando expirava o mandato de protetorado lhe outorgado pela antiga Liga das Nações.
7. Não bastasse, a Resolução 181, injusta que fosse, outorgava ao imaginado “estado judeu” 56,5% da Palestina, quando os euro-judeus detinham apenas 6% do território, e à futura Palestina, em apenas parte de seu território histórico, a menor parte, 42,9% – os restantes 0,6% para a área de Jerusalém, internacionalizada. Mas Israel se faz em 76%, tomados à força a partir de 14 de maio de 1948.
8. A Resolução 181 não mandou matar e expulsar o povo palestino, mas os sionistas promoveram a limpeza étnica a partir de 15 de maio de 1948, quando 774 cidades e povoados palestinos foram ocupados, dos quais 531 destruídos; 70 massacres foram cometidos, com mais de 15 mil mortos, incontáveis feridos e mutilados e entre 725 mil e 800 mil palestinos expulsos, até 80% da população originária que habitava os 76% da Palestina tomados pela força e tornados Israel.
9. Daí resultam os atuais 6 milhões de refugiados palestinos, perto de 8% da população refugiada no mundo, mesmo os palestinos representando apenas 0,2% da população mundial.
10. E se de fato a ONU houvesse “criado” Israel, mito espalhado pela propaganda israelense, por qual razão somente em 11 de maio de 1949 foi admitido como seu 59º. estado membro (Resolução 273)? Israel não era admitido como estado membro porque constituíra-se ilegalmente. Israel foi aceito na ONU condicionado a acatar a Resolução 194, de 11 de dezembro de 1948, que determina o direito de retorno dos refugiados, devolução do que lhes foi tomado e compensações por suas perdas. É caso único neste sentido, sem que a condição tenha sido cumprida até hoje, já que Israel nunca acatou nenhuma das resoluções da ONU, nem mesmo a 181.
11. O Brasil é estado signatário do Estatuto de Roma e do TPI, promulgados pelo Decreto 4.388, de 25 de setembro de 2002, que já em seu Artigo 1º. afirma: “O Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, apenso por cópia ao presente Decreto, será executado e cumprido tão inteiramente como nele se contém”. Logo, devemos apoiar o TPI e suas investigações, não defender os crimes de Israel na Palestina.
12. A cooperação com Israel no campo da pesquisa para o desenvolvimento de vacinas e medicamentos de combate ao Covid-19 desmerece os institutos de pesquisa e universidades brasileiras, que já pesquisam neste campo, com excelentes resultados, seja nas parcerias com laboratórios internacionais, produzindo as vacinas no Brasil, seja na produção de vacinas nacionais.
Pelo exposto, esperamos que o Ministério da Relações Exteriores corrija os erros apontados e reposicione-se no que mais aludido, especialmente quanto a seu alinhamento acrítico a Israel, em prejuízo dos direitos internacional e pátrio, destacando-se os princípios que regem as relações internacionais do Brasil, contidas no Artigo 4º. da Constituição Federal.
Palestina Livre a partir do Brasil, 9 de março de 2021.
Fonte: Fepal