Governo Bolsonaro fracassa e plano nacional de vacinação está em xeque
Numa derrota política para Bolsonaro, é muito provável que a vacinação no Brasil se inicie com a CoronoVac – a “vacina chinesa”
Publicado 15/01/2021 20:14
A gestão Jair Bolsonaro fracassou em seu desastrado plano nacional de vacinação contra a Covid-19. Nesta sexta-feira (15), o governo da Índia afirmou que não tem condições de fazer a entrega imediata de um lote de imunizantes da Oxford/AstraZeneca ao País.
Além de pôr em xeque o cronograma do plano nacional, a negativa indiana frustrou uma operação montada às pressas pelo Planalto para buscar o material no país asiático ainda neste fim de semana. Agora, numa derrota política para Bolsonaro, é muito provável que a vacinação no Brasil se inicie com a CoronoVac – a “vacina chinesa”.
Na noite de quinta (14), o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, ligou para o chanceler da Índia, Subrahmanyam Jaishankar, e fez um último apelo pela liberação de 2 milhões de vacinas produzidas pelo Serum Institute. Antes disso, Bolsonaro havia enviado uma carta para o premiê indiano, Narendra Modi.
O imunizante da Oxford/AstraZeneca era a aposta do governo Bolsonaro na “guerra da vacina” travada pelo presidente com o governador paulista, João Doria (PSDB). O lote seria um adiantamento do imunizante que posteriormente será produzida pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz).
Mas Araújo ouviu de Jaishankar que a situação só seria resolvida “nos próximos dias”. Não haverá liberação no prazo desejado pelo Brasil, nem sequer compromisso com uma data específica. Segundo o governo indiano, não é possível autorizar a transação enquanto não começar a campanha de vacinação na sua própria população. Jaishankar disse que há “dificuldades logísticas”, uma vez que a Índia iniciará em breve a vacinação no país, que tem mais de 1 bilhão de habitantes.
A resposta frustrou os planos de Bolsonaro de enviar um avião a Índia para buscar a carga. Uma aeronave da Azul Linhas Aéreas, fretado pelo Ministério de Saúde, está no Recife (PE) pronto para decolar, mas permanecerá em solo enquanto não houver luz verde de Nova Délhi. O governo prometia a partida para a noite desta sexta (15), com retorno previsto para o domingo (17). Todo o calendário será atingido.
Em entrevista à rede Bandeirantes, Bolsonaro admitiu que a operação Índia seria atrasada. “Daqui a dois, três dias no máximo, nosso avião vai partir e vai trazer essas 2 milhões de vacinas para cá”, afirmou o presidente. Sem essa opção, o Brasil deve iniciar a imunização com a “vacina chinesa do Doria” – a forma pejorativa como Bolsonaro se referiu por diversas vezes à CoronaVac.
Diante de mais um vexame internacional do País, o Ministério da Saúde enviou nesta sexta-feira (15) ofício ao Butantan requisitando 6 milhões de doses do Coronavac. O texto, repleto de erros de digitação, evidenciou o desespero de Bolsonaro ante o risco de que o governo paulista inicie a vacinação antes do governo federal.
“Solicitamos os bons présmos (préstimos) para disponibilizar a entrega imediata das 6 milhões de doses importadas”, diz o ofício. “Ressaltamos a urgência na imediata entrega do quantavo (quantitativo) contratado e acima mencionado, tendo em vista que este Ministério precisa fazer o devido loteamento para iniciar a logísca (logística) de distribuição para todos os estados da federação de maneira simultânea e equitava (equitativa).”
O Instituto Butantan, em parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac, produz o imunizante CoronaVac. A outra vacina a ser analisada pela Anvisa neste domingo (17) é a produzida pela Fundação Oswaldo Cruz, em parceria com a empresa AstraZeneca e a Universidade de Oxford.
Doria afirmou que cerca de 4,5 milhões de doses serão enviadas na segunda-feira ao governo federal. Indicou que 1,5 milhão de doses restantes deve ficar em São Paulo por corresponder à quantidade proporcional que o estado precisa para vacinar seus grupos prioritários. Em nota, o Butantan informa ter perguntado ao Ministério da Saúde “qual quantitativo será destinado” a São Paulo” – o número de doses que devem ficar para cada estado ainda não foi definido pelo governo federal.
“Para todas as vacinas destinadas pelo instituto ao Programa Nacional de Imunizações (PNI), é praxe que uma parte das doses permaneça em São Paulo, estado mais populoso do Brasil. Isso acontece, por exemplo, com a vacina contra o vírus influenza, causador da gripe”, apontou o Butantan. “O instituto aguarda manifestação do Ministério também em relação às doses da vacina contra o novo coronavírus”, reforça o instituto.
Ainda na quinta-feira (14), o Palácio do Planalto preparava uma cerimônia na terça-feira (19) para marcar o início da imunização no País. Inicialmente, cogitou-se que uma pessoa idosa e um profissional de saúde seriam vacinados no evento, num gesto simbólico. A ideia foi abandonada depois.
Bolsonaro passou, então, a vislumbrar a cerimônia como a chance para transmitir a falsa ideia de que o governo federal é protagonista e está à frente da campanha de vacinação. Seria também uma oportunidade para Bolsonaro rebater as críticas de atraso e de falta de organização no processo.
No domingo, o Ministério da Saúde avaliava promover uma coletiva de imprensa na Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) para celebrar a chegada do lote de vacinas. O planejamento, porém, já foi abandonado. Porém, com o fracasso no plano “Índia”, a cerimônia e a coletiva deve ser canceladas – ou, na melhor das hipóteses, adiados por tempo indeterminado. E todas as críticas à condução bolsonarista da crise estão ainda mais confirmadas.
Da Redação, com agências e portais