De Olho no Mundo, por Ana Prestes

Donald Trump ainda não admite a derrota, mas dá início aos protocolos de transição e é um dos destaque da análise internacional de Ana Prestes nesta terça feira (24).

Foto: Win McNamee/Getty Images

Nos últimos dias houve uma mudança de patamar na transição presidencial nos EUA. Embora Trump ainda não reconheça a vitória do adversário Joe Biden, aos poucos tem dado passos no sentido de não obstaculizar a transição oficial. É forte a pressão sobre ele dentro do Partido Republicano.

Nas palavras do próprio Trump, via twitter, “nossa luta continua com força (…) e acredito na vitória! Ainda assim, pelo melhor interesse de nosso país, recomendei o início dos protocolos”. Isso significa liberação para a equipe de Biden dos escritórios, verba para pagamento de funcionários, dados do governo, relatórios de inteligência e etc. E desde ontem também começaram a surgir as primeiras indicações de Biden. Para secretário de Estado ele indicou Antony Blinken, que o acompanhou em sua trajetória como Senador e é um homem forte dos democratas nas relações internacionais desde o primeiro governo Clinton. Para assessor especial de segurança nacional ele nomeou Jake Sullivan. Para secretário de segurança interna (ministro do interior) ele nomeou Alejandro Mayorkas. Para diretora de inteligência nacional está nomeada Avril Haines. Para embaixadora dos EUA na ONU, Linda Thomas-Greenfield, Janet Yellen (ex-presidente do FED) para secretária do tesouro e para representante especial de políticas do clima o ex-candidato a presidência e ex-secretário de estado de Obama John Kerry.

Foi em um dia 24 de novembro, em 2016, há quatro anos, que a ONU reconheceu o avanço dos acordos de Paz para a Colômbia. Na época, o secretário geral da ONU, Ban Ki-moon felicitou as partes – Governo da Colômbia e as FARC – por colocarem fim a uma guerra de meio século. O acordo foi assinado nesse mesmo dia 24 pelo presidente Juan Manuel Santos e o líder das FARC Rodrigo Londoño, o Timochenko no Teatro Colón de Bogotá. Esta foi só a foto final de um processo que durou meses, com encontros em Havana, Cuba e mediação de organizações internacionais e governos como o da Noruega. A ONU também colocou à disposição do país à época suas agências, fundos e programas para ajudar na implementação do acordo. A Missão da ONU de Verificação dos Acordos de Paz ficou responsável por recolher todas as armas entregues pelas FARC como parte do acordo. Mas o desenrolar dessa história não é tão próspero como se poderia imaginar a princípio. Apesar da destruição de 9 mil armas de todos os calibres, de toneladas de explosivos e milhões de munições, da transformação das FARC em um partido político com funcionamento parlamentar e da integração de cerca de 13 mil guerrilheiros e guerrilheiras à vida civil, o governo colombiano, logo assumido pelas forças uribistas com Ivan Duque, não está cumprindo seus deveres constitucionais com os acordos e todos as semanas morrem líderes sociais e políticos na Colômbia. Pelo menos 243 ex-combatentes foram assassinados nesse período. A recusa do governo colombiano em acatar os dispositivos do acordo e buscar sua efetivação tem provocado inclusive a reorganização de grupos guerrilheiros no interior do país.

Os últimos dias tem sido de intensas manifestações no Chile. Ontem (23) houve mais uma marcha que terminou no palácio presidencial de La Moneda. As manifestações foram convocadas via redes sociais com a consigna #PiñeraQuiereSuGuerra e pedem a renúncia do presidente. Já há parlamentares da oposição que falaram em antecipação das eleições no país. Mais uma vez a repressão dos carabineros aos manifestantes foi bárbara, com a cavalaria avançando sobre manifestantes, assim como uso de carros com fortes jatos de água e bombas de gás lacrimogêneo. As manifestações e pedidos de renúncia se dão pela libertação de centenas de presos políticos desse um ano de protestos, mas também foram provocados por uma apelação feita ao Tribunal Constitucional por parte de Piñera para impedir a aprovação do projeto de “segundo retiro del 10%” da AFP (Administradoras de Fundos de Pensão) e caso aprovado (foi aprovado na Câmara e vai a votação no Senado ainda) que não seja efetivado. Trata-se de um recurso que as pessoas podem sacar para amenizar a condição econômica desesperadora que é a realidade de muitas famílias chilenas nesse ano pandêmico.

E hoje (24) haverá manifestações também na Guatemala. Os protestos estão sendo organizados para pedir a renúncia do presidente Alejandro Giammattei e dos 115 deputados que votaram com ele pelo projeto de Orçamento de 2021 que detonou uma convulsão social no país. Antes mesmo da marcha, a situação já está tensa pois o governador do departamento de Guatemala (capital), Enrique Cifuentes, se negou a receber o comunicado da ocorrência da manifestação. Enquanto isso, continuam as diferenças entre o presidente Giammattei e seu vice Guillermo Castillo. Para o vice, foi precipitada a decisão do presidente de invocar a Carta Democrática da OEA. Nas palavras de Castillo: “os golpes de Estado já não são dados pela população. Muitos golpes de Estado em vários países são dados pelos próprios governantes com com seus reiterados atos de corrupção, sua intolerância para poder dialogar com a população e por decisões equivocadas contra o bem comum”. Além da ONU, embaixadas da Alemanha, Canadá, Espanha, EUA, França, Itália, Reino Unido, Suécia, Suíça e a União Europeia apelaram para que o incidente do incêndio no parlamento ocorrido no sábado seja esclarecido. (infos: Nodal).

O novo presidente do Peru, Francisco Sagasti, fez um pronunciamento ao país na noite de ontem (23). O ponto principal foi o anúncio de um novo chefe para a Polícia Nacional do Peru (PNP), após a dura repressão às manifestações das últimas semanas, com mortos e feridos. Enquanto isso, organizações dos movimentos sociais, coletivos e sindicatos seguem em assembleia permanente para organizar os protestos para pedir uma nova Constituição. Clamam por uma “Nueva Constitución del Bicentenario”. O presidente interino tem insistido que não é o caso de discutir uma nova constituição no momento e disse preferir que um novo governo livremente eleito cuide dessa demanda. Só para recordar aos leitores dessas Notas, o último presidente eleito do Peru foi Pedro Pablo Kuczynski no ano de 2016. Em 2018 ele foi derrubado por acusações de corrupção e assumiu seu vice Martín Vizcarra, este por sua vez foi derrubado pelo parlamento também com alegação de envolvimento em corrupção há duas semanas. Assumiu então Manuel Merino que presidia o parlamento, mas seu governo durou 6 dias pela pressão das ruas e pelo flagrante golpe parlamentar que conduziu. Francisco Sagasti foi eleito presidente do parlamento e assumiu então interinamente a presidência. Sagasti tem uma longa jornada especialmente em organismos técnicos, como o Banco Mundial. Trabalho também na Cepal e nos governos de Velasco Alvarado e Alan García, como assessor do ministério de relações exteriores.

A Alta Comissária da ONU para Direitos Humanos, a chilena Michele Bachelet, se pronunciou sobre o assassinato de cunho racista do negro João Alberto no Brasil. Ela se referiu ao caso como um “ato deplorável que deve ser condenado por todos”. Ainda segundo ela, o incidente é infelizmente muito comum, de violência sofrida por negros no Brasil. E ainda fez uma chamada ao governo Bolsonaro ao dizer que o governo “tem especial responsabilidade de reconhecer o problema do racismo persistente no país, pois este é o primeiro passo essencial para resolvê-lo”.

Na Bolívia, tanto a ex-presidente de fato, Jeanine Añez, como ex ministros estão tentando fugir do país. Alguns conseguiram outros não. Añez não conseguiu. Ela tentou embarcar em uma aeronave no norte do país, na cidade de Trinidad em Beni, seu destino era uma cidade fronteiriça com o Brasil, onde pretendia ingressar. Mas os movimentos sociais e indígenas organizados impediram a decolagem e ela estaria agora em um condomínio de casas na região. Já seu ministro mais forte, Arturo Murillo, conseguiu escapar e se encontra agora nos EUA, segundo a Polícia Nacional da Bolívia.

O primeiro ministro israelense Benjamin Netanyahu pode ter feito uma viagem secreta à Arábia Saudita no final de semana passado. Ele teria viajado com Yossi Cohen, diretor do Mossad, segundo fontes da imprensa israelense, para se encontrar com o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman. O encontro teria se dado no contexto da presença de Mike Pompeo na região e seria uma última tentativa de avançar na negociação de um acordo entre os dois países na esteira dos acordos já firmados com os Emirados Árabes, o Bahrein e o Sudão.

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