Saneamento precisa de planos regionais entre municípios
Capacitação técnica é um dos desafios na elaboração de planos municipais de saneamento. Como aponta José Carlos Mierzwa, com o novo marco legal, convênios entre municípios podem ajudar na elaboração de políticas públicas
Publicado 28/07/2020 00:14 | Editado 28/07/2020 13:35
O novo Marco Legal do Saneamento, aprovado no Congresso, prevê oferta de coleta de esgoto para 90% da população brasileira até 2033. Antes do novo Marco Legal do Saneamento Básico, já era prevista, na Lei do Saneamento Básico de 2007, a criação de planos municipais de saneamento, que fundamenta e orienta a execução de políticas públicas no município relacionadas a serviços de água, esgotos, resíduos sólidos e drenagem das águas pluviais urbanas. Entretanto, no ano de 2017, menos da metade das cidades brasileiras possuíam um Plano Municipal de Saneamento Básico, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Para o professor José Carlos Mierzwa, do Departamento de Engenharia Hidráulica e Ambiental da Escola Politécnica da USP, a falta de capacitação técnica é um dos desafios para a elaboração do plano municipal. “Há diversos desses pequenos municípios que não dispõem de profissionais com capacidade técnica para desenvolver essa estrutura de planejamento complexo”, diz o professor.
No entanto, com o novo marco legal, na opinião dele, é possível formar convênios entre municípios, podendo inclusive contratar consultorias específicas para a elaboração dos planos de saneamento. Ele ainda acrescenta que “os municípios poderiam usar o apoio dos órgãos estaduais ou mesmo federais no sentido de ter uma melhor capacitação”. Ele sugere que a Agência Nacional de Águas (ANA) pode cumprir este papel de capacitação profissional.
O assunto é polêmico, pois opositores do atual Marco Legal defendem que a privatização do setor atomiza o sistema em empresas que não terão interesse em articular regionalidades ou elaborar planejamentos em larga escala. Por outro lado, a oferta de saneamento em áreas não contempladas ocorre justamente pela falta de interesse econômico nestas populações mais pobres, além do desafio de grandes obras em áreas irregulares que implicariam em deslocamento caro de populações para a urbanização adequada.
O marco legal prevê ainda a criação de planos regionais de saneamento básico, que prevalecerão sobre os planos municipais, quando eles existirem. Ainda assim, a formação dos planos regionais não retira a responsabilidade dos municípios elaborarem políticas públicas.
Como explica o professor, uma das questões relevantes no saneamento é que, a titularidade, ou seja, a responsabilidade, fica para os municípios. “O problema é que os recursos hídricos não são limitados ao município, então a ação de um município pode interferir em vários outros. Então, a abordagem de um planejamento regional é muito mais relevante porque ela contempla todo o efeito das ações de todos os municípios sobre uma região”.
O professor compartilha por exemplo o conceito de agencias de bacias, em que a gestão dos recursos hídricos é pensada para cada bacia hidrográfica. Assim, é possível priorizar as cidades que causam maior impacto sobre os recursos hídricos, como a contaminação por poluentes, garantindo mais investimentos e exigência de melhor tecnologia. “Essa prioridade é importante, porque beneficiaria a todos, inclusive os municípios com prioridade diferenciada”, disse.
O professor defende que a parceria entre municípios e empresas privadas poderia beneficiar o setor público, que economizaria recursos para investir em áreas mais pobres, que não atrairiam as empresas. Mas ele acredita que é possível criar mecanismos para que as empresas invistam também nestas áreas sem potencial econômico significativo, em áreas de ocupação irregular, por exemplo.
Ele diz que os planos regionais e nacional estabelecem padrões mínimos de serviço prestado em saneamento para cada município, por isso sua importância. Estes padrões mínimos e exigências sobre áreas desabastecidas de saneamento básico, no entanto, podem espantar empresas privadas de assumir o investimento, por não verem retorno lucrativo imediato em certas localidades.
“Na medida em que o setor privado se ocupa de algumas responsabilidades e consegue fazer as coisas funcionarem, obviamente, os governos podem atender a estas regiões que não seriam eventualmente contempladas. Possivelmente vai sobrar mais recursos para as prefeituras poderem atuar nestas regiões menos favorecidas, que não atrairiam o setor privado ou, criar mecanismos que induzam o setor privado a expandir a sua atuação para essas áreas”, defendeu.
Com informações de entrevista à Rádio USP