Bolsonaro e Moro poderiam sofrer derrota ainda maior no Congresso

O plenário do Congresso Nacional derrubou 18 itens dos 33 vetos feitos por Jair Bolsonaro ao projeto de lei sobre abuso de autoridade. Caso houvesse quórum, a derrota dos governistas poderia ser ainda maior, pois restaram 15 dispositivos a serem eliminados. A vitória da oposição se deve as lideranças do PT e PCdoB que retiraram os destaques, o que permitiu a votação no painel eletrônico.

*Por Iram Alfaia

Plenário do Congresso - Luis Macedo/Agência Câmara

A decisão impõe derrota ao ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, ex-juiz da Lava Jato que, em conluio com procuradores, teria cometido várias ilegalidades que a Lei agora pretende coibir. Moro se empenhou diretamente para edição e manutenção dos vetos.

Os 15 vetos mantidos na Lei do Abuso de Autoridade foram patrocinados pelo Senado.

Ainda houve um princípio de tumulto na votação por conta dos protestos do Novo que não aceitava a retira de destaque pela vice-liderança do PT.

O líder do PCdoB na Casa, Daniel Almeida (BA), lembrou que o destaque foi retirado porque considerava que havia o entendimento que levou a uma importante vitória, quando se permitiu derrubar 18 dos vetos que foram colocados no projeto pelo Governo.

“Nós achamos que ainda restam questões relevantes que precisam passar por deliberação e que devemos criar condições para derrubar os vetos que ainda persistem e que prejudicam a sociedade brasileira. No entanto, dada a dificuldade de termos quórum assegurado para derrubar esses vetos, concordamos com o encaminhamento no sentido de interromper a apreciação dos destaques em relação aos vetos e irmos para as demais matérias”, explicou o líder.

O deputado Carlos Zaratini (PT-SP), líder da Minoria no Congresso, disse que a bancada do PT retirou o seu pedido de destaque. “O deputado do Novo tem que reconhecer isso. É um absurdo ele não querer reconhecer aquilo que está manifesto por escrito. Nós consideramos uma grande vitória a derrubada desses vetos hoje. É uma vitória da democracia no Brasil, é uma vitória da Justiça”, afirmou.

“O parlamento reafirmou seu papel e sua independência. Ao mesmo tempo, deu um passo importante para a salvaguarda do Estado Democrático de Direito contra o avanço do arbítrio”, disse o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP).

O líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), diz que tem a convicção de que o projeto sairá do parlamento como o instrumento para coibir a prepotência, a arrogância, o abuso cometido no dia a dia contra a população brasileira.

“Aqui não estamos falando simplesmente dos chamados crimes do colarinho-branco. É o trabalhador que mora na favela, é o cidadão comum que no dia a dia é vítima dessa arrogância, dessa prepotência e desse abuso. Isso é também para aqueles que, ao longo desse último período, abusaram das suas prerrogativas para promover no Brasil a criminalização da política”, argumentou.

“Nós, mesmos, vamos derrubar vários vetos, e vamos manter vários. Temos independência, temos representação e, acima de tudo, a Constituição nos permitiu o direito de legislar. É por isso que nós estamos aqui, sem precisar apontar o dedo na cara de ninguém, respeitando, inclusive a maioria”, afirmou o senador Weverton Rocha (PDT-MA).

Votação

Na Câmara dos Deputados, o placar a favor da derrubada variou de 267 a 313 votos e, no Senado, de 41 a 56 votos.

Em relação a todos os crimes previstos na lei, os parlamentares retomaram a previsão de que eles são de ação penal pública incondicionada, admitindo-se a ação privada se a ação penal pública não for proposta no prazo legal.

O Ministério Público deverá aditar a queixa, recusá-la e oferecer denúncia substitutiva, intervir em todos os termos do processo, fornecer elementos de prova, interpor recurso e, a todo tempo, no caso de negligência do querelante (autor da queixa), retomar a ação como parte principal.

A ação privada subsidiária deve ser exercida no prazo de seis meses, contado da data em que se esgotar o prazo para oferecimento da denúncia.

Confira os vetos rejeitados

Com a derrubada dos vetos, retornarão ao texto da Lei 13.869/19 os seguintes crimes:

– o responsável pelas investigações que, por meio de comunicação, inclusive rede social, antecipar atribuição de culpa antes de concluídas as apurações e formalizada a acusação: pena de detenção de 6 meses a 2 anos e multa;

– decretar prisão sem conformidade com as hipóteses legais. Válido também para o juiz que, dentro de prazo razoável, deixar de relaxar a prisão manifestamente ilegal; deixar de substituir a prisão preventiva por medida cautelar ou conceder liberdade provisória, quando manifestamente cabível; ou deixar de deferir liminar ou ordem de habeas corpus, quando manifestamente cabível: pena de detenção de 1 a 4 anos e multa;

– constranger o preso ou o detento, mediante violência, grave ameaça ou redução de sua capacidade de resistência, a produzir prova contra si mesmo ou contra terceiro: pena de detenção de 1 a 4 anos, e multa, sem prejuízo da pena cominada à violência;

– violar direito ou prerrogativa de advogado como a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho e sigilo de comunicação; a comunicação com seus clientes; a presença de representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) quando preso em flagrante por motivo ligado ao exercício da advocacia; e prisão temporária especial: pena de detenção de 3 meses a 1 ano;

– deixar de se identificar ou se identificar falsamente ao preso quando de sua prisão. Aplica-se também para quem, como responsável por interrogatório, deixa de se identificar ao preso ou atribui a si mesmo falsa identidade, cargo ou função: pena de detenção de 6 meses a 2 anos e multa;

– prosseguir com o interrogatório de pessoa que tenha decidido exercer o direito ao silêncio ou de pessoa que tenha optado por ser assistida por advogado ou defensor público: pena de detenção de 1 a 4 anos e multa;

– impedir, sem justa causa, a entrevista pessoal e reservada do preso com seu advogado. Aplica-se a pena também a quem impede o preso, o réu solto ou o investigado de entrevistar-se pessoal e reservadamente com seu advogado ou defensor, por prazo razoável, antes de audiência judicial, e de sentar-se ao seu lado e com ele se comunicar durante a audiência, salvo no curso de interrogatório ou no caso de audiência realizada por videoconferência: pena de detenção de 6 meses a 2 anos e multa;

– dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa sem justa causa fundamentada ou contra quem sabe inocente: pena de detenção de 1 a 4 anos e multa;

– negar ao interessado, seu defensor ou advogado acesso aos autos de investigação preliminar, ao termo circunstanciado, ao inquérito ou a qualquer outro procedimento investigatório de infração penal, civil ou administrativa; ou impedir a obtenção de cópias: pena de detenção de 6 meses a 2 anos e multa.