Lênin, sempre!

Sobre o Manifesto da Sociedade dos Amigos de Lênin

A perigosa situação internacional [1] passa a exibir com extrema nitidez o problema crucial da decadência [2] imperial dos Estados Unidos da América. Sem dúvida, a grande crise capitalista iniciada nos EUA em 2007-8 acelerou vigorosamente seu declínio econômico relativo, fenômeno correlacionado essencialmente à veloz ascensão econômica e social da República Popular da China.

Aliás, essência era a categoria decisiva de V. Lênin – quem não a recusou de Hegel -, por significar a totalidade das manifestações (propriedades, relações e interações); a razão de ser das manifestações (fenomênicas imediatas) da aparência. [3]

Lênin, esse genial pensador revolucionário, autor da obra “O imperialismo, etapa superior do capitalismo”, que especialmente renovou às profundezas o arsenal teórico e prático da luta universal e contemporânea dos proletários pela derrocada e superação do capitalismo. Lênin, o imortal fundador da primeira Pátria Socialista!

Daí hoje assinalarmos a atualidade – e a urgência – de colocarmos na ordem do dia o gigantismo de suas reflexões e seu combate renhido e perene, sem tergiversações, pela sociedade superior, a sociedade socialista. Daí celebrarmos o nascimento da Sociedade dos Amigos de Lênin (SAL), cujo texto final do Manifesto e sua Coordenação Nacional designamos abaixo.

Notas:

[1] Observe-se com atenção o importante escrito de Lênin, pouco estudado, “Para o quarto aniversário da Revolução de Outubro”, logo após o fim da Primeira Guerra Mundial, onde o teórico russo insiste no caráter inevitável de: a) o patrocínio da “anceirpolitica internacional do capital fino” como gerador das guerras imperialistas; b) na igual inevitabilidade do estilhaçamento e exploração de países periféricos menores pelas potências imperialistas:
“A questão das guerras imperialistas, da política internacional do capital financeiro, política que hoje domina em todo mundo e que gera inevitavelmente novas guerras imperialistas, que gera inevitavelmente uma intensificação sem precedentes do jugo nacional, da pilhagem, da exploração, do estrangulamento de pequenas nacionalidades, fracas e atrasadas, por um punhado de potências ‘avançadas’, é uma questão que desde 1914 se tornou a pedra angular de toda a política de todos os países do globo terrestre”. Pravda, nº 234, 18 de Outubro de 1921, in: Obras Escolhidas, v. 3, Alfa Ômega, São Paulo, p. 347; grifos nossos.

[2] É suficiente para acompanhar a decadência indiscutível e multilateral dos EUA, apenas seguindo a literatura (da extrema-direita a esquerda democrática) na breve sequência: “A corrosão do caráter”, de Richard Sennett (Record, 1999); “Miséria à americana”, de Bárbara Ehrenreich (Record, 2004); “Colosso. Ascensão e queda do império americano”, de Niall Ferguson (Planeta, 2011[2004]); “A grande degeneração. A decadência do mundo ocidental”, de N. Ferguson (Planeta, 2013[2012]; em certa medida, “Strategic vision. America and the crisis of global power”, de Zbigniew Brzezinski (Basic Books, 2012; ver: Introduction); e o recentíssimo “Desagregação. Por dentro de uma nova América”, de George Packer (Companhia das Letras, 2014 [2013]).

[3] Ver: “Introdução” de “Cadernos sobre a dialética de Hegel” de Henri Lefebvre e Norbert Guterman, Rio de Janeiro, Editora UFRJ, 2011, p.62.

Manifesto da Sociedade dos Amigos de Lênin (SAL)

Este manifesto argumenta acerca da necessidade de criação de uma Sociedade dos Amigos de Lênin, no Brasil. Baseando-se em debates da Fundação Maurício Grabois, a ideia inspira-se na famosa sugestão de Lênin preconizando a formação de um “Clube de amigos de Hegel”. Essencialmente, nossa proposta pretende retomar as contribuições do grande teórico e político russo, em dimensões prospectivas e contemporâneas.

1. A inteligência revolucionária da nossa época

Em janeiro deste ano completaram-se 90 anos da morte de Vladimir Ilitch Ulianov, mais conhecido por Lênin. Diferentemente de anos passados, desta vez registraram-se iniciativas celebrando o legado desse gigante da luta revolucionária pelo socialismo. Entretanto, mesmo em crise sistêmica da sociedade burguesa, persiste uma visão negativa do legado teórico e político de Lênin e das épicas jornadas de Outubro 1917, das quais foi o grande inspirador e dirigente.

Sua firme oposição aos principais líderes da socialdemocracia europeia, que haviam capitulado perante a deflagração, em agosto de 1914, da Grande Guerra Mundial entre as potências imperialistas, tornou-o a maior referência, entre os marxistas revolucionários, no combate pela renovação e revigoramento do marxismo e pela construção de uma estratégia revolucionária adequada aos novos tempos caracterizados pela transformação imperialista do capitalismo. Assumiram a fundo, no combate pelo socialismo, a defesa da paz entre os povos, da independência nacional, contra a guerra e o colonialismo.

Quando a Revolução soviética triunfou, a maior parte da humanidade ainda vivia sob o domínio de potências coloniais, notadamente da Inglaterra, a França, a Alemanha e o Japão e Holanda etc. Foi ao influxo das ideais de Lênin que os marxistas passaram a defender o direito das nações à autodeterminação e conclamaram a luta os povos dos países dependentes e coloniais contra a opressão nacional.

Lênin era um radical inimigo do dogmatismo e das ideias estereotipadas no interior do marxismo: “A história em geral e a das revoluções em particular é sempre mais rica de conteúdo, mais variada de formas e de aspectos, mais viva e mais ‘astuta’, do que imaginam os melhores partidos, as vanguardas mais conscientes das classes mais avançadas”. Absorvendo ideias pioneiras de Engels, ele travou intenso combate à petrificação doutrinária da teoria marxista, que devia ser um “guia para ação”. Para ele, Marx e Engels apenas haviam colocado as pedras iniciais da construção naquele poderoso sistema teórico, cabendo às sucessivas gerações dar prosseguimento à grandiosa obra. Se o marxismo não conseguisse dar conta dos novos fenômenos que surgiam no movimento histórico, poderia degradar-se e transformar-se num dogma incapaz de intervir no curso dos acontecimentos.

Lênin sugeriu ainda que as revoluções tenderiam a eclodir nos elos mais fracos da cadeia imperialista, não necessariamente onde o capitalismo fosse mais avançado. Constatou que a lei do desenvolvimento desigual criava possibilidades de rupturas revolucionárias, sustentando firmemente que o início da construção do socialismo poderia ocorrer num único país ou num pequeno número de países localizados na periferia do sistema. Isso foi plenamente comprovado por revoluções ocorridas no século 20.

2. A força atual da teoria leninista

Quase um século depois de sua publicação, O imperialismo, etapa superior do capitalismo continua sendo um instrumento teórico indispensável à compreensão da lógica concreta do capital. Segundo Lênin, o capitalismo central, mais avançado, se reproduz em permanente tensão entre a “decomposição” e o “desenvolvimento”. “O imperialismo é a época do capital financeiro e dos monopólios, que trazem consigo, em toda a parte, a tendência para a dominação, e não para a liberdade. A reação em toda a linha, seja qual for o regime político. (…) Intensifica-se também, particularmente, a opressão nacional e a tendência para as anexações, isto é, para a violação da independência nacional”. A dialética materialista de Marx aponta os limites objetivos do modo capitalista de produção e suas rupturas recorrentes, mas abstém-se de especular sobre seu colapso final.

A lei do desenvolvimento desigual do capitalismo – para Lênin uma lei absoluta – é fundamental para entender as determinações que impulsionam a dinâmica do sistema atual de relações internacionais capitalistas.

A crise sistêmica do capitalismo que estamos presenciando inscreve-se num ciclo de agudas crises provocadas pelo predomínio do capital financeiro da época do imperialismo, que amplia o desenvolvimento desigual entre os países centrais e periféricos e estimula os conflitos e as guerras neocoloniais. Lênin elaborou um novo aporte teórico ao entronizar a questão nacional na revolução. Assim como a ideia de formação social a partir da própria experiência nacional mesclada por atraso secular e impulso industrializante.

A elaboração por Lênin de uma teoria da transição ao socialismo na Rússia Soviética, baseada na análise no capitalismo de Estado e que naquele período se expressa na construção da Nova Política Econômica (NEP), tem uma dramática atualidade. Para ele, a construção do socialismo em países periféricos deveria ser longa e conhecer várias etapas. Num primeiro momento, combinariam elementos socialistas e capitalistas; planejamento e mercado.

Outra importante ideia-força deixada por Lênin é que não existem modelos únicos de revolução ou de transição. Cada povo, a partir de suas condições históricas e consciência social, deverá construir os seus próprios caminhos. Nesse sentido, os partidos comunistas autenticamente revolucionários só poderiam consolidar sua influência junto ao inabalável trabalho de massas; intervindo nos acontecimentos políticos e não fugindo deles.

Questão universal e perene da luta de classes no capitalismo, o esquerdismo professava – e professa – rejeição a quaisquer compromissos com outras camadas sociais ou forças políticas não comunistas. Lênin, pelo contrário, advogava a necessidade de se estabelecer acordos e compromissos na luta política. A história do bolchevismo, antes e depois da Revolução de Outubro – dissertou ele em 1920 – realizou-se cheia de casos de manobras, de acordos e compromissos com outros partidos, inclusive burgueses. Mas, sublinhava: “há compromissos e compromissos”. Atuar e aprender no movimento com as massas, alterar quando necessário as posições táticas; não temer “ficarmos sós” dadas as circunstâncias.

3. A fecundidade da construção de Lênin nas adversidades hodiernas

Do legado teórico marxista em Lênin sublinhamos principalmente: a) a lei do desenvolvimento desigual do capitalismo, compreendendo assimetrias e disputas entre o núcleo dos países no estágio do imperialismo, e destes com os países periféricos; b) a análise da degeneração multiforme do capitalismo central, até as guerras; c) a elaboração sobre a evolução do declínio civilizatório deste capitalismo, às revoluções proletárias da nossa época; d) uma nova teoria da transição ao socialismo; e) a sistematização da teoria de conhecimento e a atualização da concepção de materialismo; f) os inusitados aportes culturais captados no nascedouro da nova sociedade, novos desafios da educação a partir de fundamentos epistemológicos profundamente transformadores.

De outra parte, sabemos que Lênin passou a ser “sacrificado”, muitas vezes em nome de um Marx “metodológico” ou quase inofensivo. Coincidentemente à derrota da experiência da construção socialista, configurada numa bipolaridade sistêmica mundial. Da omissão aos ataques a Lênin, setores da intelectualidade buscam eliminar o ineditismo histórico da Revolução de Outubro de 1917.

Em fidelidade à nossa história, elencamos entre as razões fundantes em nos dispormos a construir uma Sociedade dos Amigos de Lênin recordando igualmente o forte impacto obtido pelas ideias dele entre pensadores e revolucionários no Brasil. O que conclama reforçar em nossos dias a difusão de seu pensamento, de sua obra, de suas realizações políticas. Ademais do perscrutar os caminhos da ideia-força da transição socialista no Brasil.

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Coordenação Nacional: Lígia Maria Osório, Marly Vianna, Zoia Prestes, Rita Coitinho, João Quartim de Moraes, Augusto Buonicore, Walter Sorrentino, Fabio Palacio, e A.Sérgio Barroso (coordenador).

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