Minhas Meninas
Vejo minhas meninas banhando de bica sob o sol de Marabá.
Publicado 23/03/2011 12:16
Elas brincam, se desentendem, choram e voltam a sorrir.
É impressionante à forma como as crianças se comportam diante da vida, a tranquilidade das confusões em que se metem, sempre sob as vistas da mãe, bem mais severa que eu.
Vejo que minha mulher e as meninas, Anita e Sophia, têm uma forma própria de comunicação. Deve ser coisa de ventre, um código secreto que apenas as mulheres desenvolveram no curso da civilização.
Ontem, no dia internacional da mulher, presenteei-as com uma tartaruga. Nestes tempos, onde tudo é enlatado e uniformizado, não haveria melhor presente.
Com a "Dina" elas sentem a terra, o chão molhado, e vão sendo crianças mais felizes.
Elas saem das televisões e vão podendo perceber que a alegria está para além das barbies e das porcarias deliciosas que vendem os supermercados.
Já dei-lhes também um cão, o "Sozim"; metade fila, metade doberman.
O cão, de três meses, têm esse nome porque nasceu mesmo com a mãe tomando injeção para não parir mais. Nasceu só e cego de um dos olhos. Tal olho é vermelho.
Minha humanidade gostou do "Sozim" de graça.
Proponho, ainda, algumas galinhas para rompermos com os ovos de granja e as carnes brancas seriais na qual não sabemos procedência.
Minha mulher fica indignada com tais propostas e diz que não vai virar roceira. Diz que estudou e tal.
Concordo com tudo e resposto-lhe que bicho é coisa de gente culta.
Na infância tive cágados e o "Lambe-lasca", um vira-lata saltitante e heróico, verdadeiro lorde do mundo dos pulguentos.
Em meio a esse debate plenamente civilizacional, com Angelina, vou propondo outros absurdos como um bode.
"Não, bode não dá!", diz Anita, condenando-me.
Tudo bem se bode não dá, tudo bem. Não se fala mais em bode.
A Sophia assiste a celeuma mergulhada na lama e sob promessas de bronca feia, a mãe diz que vai pegar pira e eu digo que pira faz bem para a felicidade infantil. É claro que falo num contexto em que podemos cuidar.
Minha mãe que sempre incentivou-nos com bichos acharia um bode demais e já estou numa idade que não posso dar mais preocupações à minha genitora.
Mas sempre há outros bichos menos espalhafotosos para se criar sem que os seus pensem que estamos variando da cachola.
E também não posso ser sempre tão radical porque minhas meninas, criadas em apartamentos, estão agora brincando na lama perto das bananeiras.
O mínimo que posso fazer por elas é com que sintam, neste quintal, o valor da terra e da liberdade.
Certas coisas dessa vida se aprende em tenra idade.