As acusações sem provas mas cheias de interesse de Israel contra o Irã
O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, acusou na segunda-feira (30), em discurso na sede do Ministério da Defesa em Tel Aviv, o Irã de quebrar o acordo nuclear assinado com diversas potências mundiais, apresentando como prova um power point feito por ele mesmo. Em resposta, o Irã afirmou que as acusações foram para dar uma justificativa aos EUA para sairem do acordo nuclear
Publicado 02/05/2018 13:01
Segundo Netanyahu, o Irã manteve escondido o desenvolvimento de seu programa nuclear e planejou a construção de ao menos cinco bombas equivalentes àquela lançada pelos Estados Unidos sobre Hiroshima, no Japão. Netanyahu afirmou que o Irã violou o acordo porque, ao assinar o documento, não revelou todos os detalhes sobre seu programa. Segundo ele, os serviços secretos de Israel tiveram acesso a "55 mil documentos", incluindo fotos, que comprovariam o projeto atômico de Teerã. Além disso, o primeiro-ministro assegurou que, com seus mísseis, o Irã poderia atingir locais a "milhares de quilômetros" de distância.
Com o pacto, Teerã se comprometeu a limitar seu programa atômico e a usá-lo apenas para fins pacíficos, em troca da redução das sanções internacionais. Por outro lado, aceitou submeter suas atividades nucleares a inspeções regulares. Apesar do relatório da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) divulgado em fevereiro deste ano, que aponta que o Irã tem se mantido dentro das restrições impostas pelo acordo nuclear de 2015, Israel e Estados Unidos continuam procurando "pelo em ovo" para acusarem o Irã perante aos outros signatários e desmantelarem o acordo.
Sabe-se o real motivo pelo qual os dois aliados querem o fim do acordo nuclear. O Irã, hoje uma potência na região do Oriente Médio, incomoda e muito Israel, antes o único com destaque na região.
"O Irã é pragmático e não causa danos diretos aos EUA, mas é uma pedra no sapato de Israel por ser outra potência na região; além disso, o Irã apoia o Hamas, o Hezbollah e confronta a Arábia Saudita, país árabe que sempre foi parceiro de Israel. O lobby nos EUA é poderoso, e Israel pressiona os norte-americanos para que enfrentem o Irã" explicou Reginaldo Nasser em entrevista para o Portal Vermelho quando EUA, França e Reino Unido bombardearam a Síria, em abril desse ano. O professor de Relações Internacionais da PUC-SP lembrou também a crise interna vivida pelo país israelita. "Isso porque Israel já passa por uma crise moral, um porque Benjamin Netanyahu está sendo acusado de corrupção, e dois porque a violência dos israelenses contra os palestinos está chocando o mundo, incluindo países que antes não se envolviam no conflito", contou, o que explicaria o desespero de Israel em enfraquecer o Irã.
Em resposta, o Irã chamou Netanyahu de "mentiroso inveterado". Em nota divulgada pelo Ministério de Relações Exteriores iraniano, afirma-se que essas alegações são "velhas, sem conteúdo e vergonhosas". Segundo o governo iraniano, a acusação feita pelo primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu é uma “propaganda ridícula”: “Os líderes do regime sionista de Israel veem sua sobrevivência no uso de charlatanismo para mostrar outros países como ameaça”, e que as declarações de Netanyahu são as mais recentes de “uma série repetitiva de julgamentos não profissionais, vergonhosos e de esforços infrutíferos de um mentiroso escandaloso”.
A apresentação de Netanyahu de suas suspeitas acontece em um momento bastante propício: no dia 12 de maio, Trump deverá decidir sobre a saída de seu país do acordo nuclear com o Irã. O chanceler iraniano Mohammad Javad Zarif tuitou que o "garoto que gritava que o lobo está chegando" estava tentando convencer Washington a sair do acordo nuclear. Foi a mesma impressão de vários analistas, segundo informa o jornal espanhol El País, uma vez que o líder israelense usou o inglês em vez do hebraico, e também porque não parecia haver novos documentos além de seu PowerPoint.
Após as declarações de Netanyahu, como já era de se esperar, Donald Trump, que critica o acordo desde que entrou no cargo e tem procurado sair deste de qualquer forma, respaldou a denúncia feita por Israel. “O que aprendemos hoje sobre o Irã mostra que eu realmente tinha 100% de razão” sobre o acordo nuclear de 2015, afirmou Trump durante entrevista na Casa Branca. Segundo ele, “essa simplesmente não é uma situação aceitável”, como informou o Opera Mundi.
No início deste ano, Trump deu aos outros países signatários do acordo até 12 de maio para "consertar as falhas" do Plano Abrangente de Ação Conjunta (PAAC), seu nome oficial. Trump critica que o pacto não inclua o programa iraniano de mísseis balísticos, limite o acesso de inspetores aos centros militares e permita o enriquecimento de urânio ao término do acordo. Teerã, por sua vez, considera intolerável que Washington queira revisar unilateralmente um acordo multinacional.
A alta representante da UE para Política Exterior, Federica Mogherini, afirmou que "Se algum país tiver informações sobre qualquer violação de qualquer tipo, pode e deve encaminhá-las para os mecanismos apropriados", sublinhando que "O PAAC [Plano Abrangente de Ação Conjunta, nome oficial do acordo multilateral] não é baseado em suposições de boa-fé ou confiança, e sim em compromissos concretos, mecanismos de verificação e um controle muito rigoroso dos fatos realizados pela AIEA", em clara critica à apresentação das suspeitas de Netanyahu. Enfatizou, ainda, que a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) publicou, em 5 de março, dez relatórios certificando que o Irã cumpriu integralmente seus compromissos.
Líderes europeus também rejeitaram as alegações de Israel de que há novas evidências mostrando que o Irã viola o acordo nuclear assinado em 2015. A visão geral nas capitais europeias é de que os documentos revelados pelo premiê israelense na segunda-feira (30) apresentam novas evidências sobre a escala do programa atômico iraniano antes de 2015, mas nada que mostrasse violações recentes do pacto.