Dirceu: O fio da história do Brasil não é o fio das forças da direita
Em entrevista à jornalista Mônica Bergamo, publicada na Folha de S. Paulo desta sexta-feira (20), o ex-ministro José Dirceu afirma que “o país vive uma situação de insegurança e instabilidade jurídica, de violação dos direitos e garantias individuais".
Publicado 20/04/2018 11:27
"O aparato judicial policial se transformou em polícia política”, disse Dirceu ao comentar sobre as perspectivas que tem quanto as batalhas jurídicas. "Como a minha vida é o PT e o projeto que o Lula lidera, eu tenho que me preparar para continuar fazendo política. Eu não posso me render ao fato de que vou ser preso", enfatizou.
Para o ex-ministro, que também é advogado, a onda punitivista que impera nos processos penais contra lideranças políticas está alterando o ordenamento jurídico brasileiro. "Eles acabaram com a progressão penal. Você só pode ser beneficiado se reparar o dano que dizem ter causado. E como, se todos os seus bens estão bloqueados? Acabaram com o indulto. Vamos cumprir a pena toda", reforça.
Apesar disso, José Dirceu demonstra que essa perseguição não abala a sua determinação em luta r pelo país. "Não muda nada. Preso ou aqui fora, vou fazer tudo o que eu fazia: ler, estudar e fazer política.Eu tenho que cumprir a pena. Eu não posso brigar com a cadeia", destacou. O senhor conviveu com Antonio Palocci?
Sobre a perspectiva de Lula ficar preso, José Dirceu disse que "o pior para ele já aconteceu: a indignidade de ser condenado e preso injustamente".
Questionado pela jornalista se em algum momento dessas reflexões na prisão ele cogitava ter errado ou cometido de fato os crimes que foi acusado, José Dirceu reafirmou: "Eu não cometi crimes. Não há nenhuma prova, nenhum empresário ou diretor afirmando que eu pedi alguma coisa na Petrobras. O que eu errei? Na minha relação com [o lobista e delator] Milton Pascowitch. Eu comprei um imóvel, financiei, paguei a entrada. Ele reformou o imóvel. Eu não paguei. Foi um erro meu. Eu não poderia ter estabelecido essa relação. Era um empréstimo não declarado. Que virou propina. Foi uma relação indevida. Admito. Mas não criminosa".
Monica Bergamo então afirma que apesar de Lula ter seu governo aprovado por 83% dos brasileiros, os "desvios de milhões foram comprovados" e questiona: "O fato de vocês terem financiado campanhas com dinheiro de estatais e caixa dois não seria razão para um arrependimento, uma autocrítica?".
José Dirceu é enfático: "Nós temos que denunciar o que fizeram conosco, e não foi por causa de nossos erros. O legado do Lula, o nascente estado de bem-estar social que ele consolidou, está sendo todo desmontado. Estão desfazendo a era Lula como quiseram desfazer a era Getúlio".
Para ele, o balanço histórico demonstra que "estamos do lado certo e o saldo de tudo o que fizemos é fantástico" e lembra que erros muitos já cometeram. "Eu vou dizer uma coisa para você: a Igreja Católica Apostólica Romana tem uma história de crimes contra a humanidade", frisou. "Não vou nem falar das Cruzadas ou da Inquisição. Se eu for olhar para ela, vou mandar prender todos os padres e bispos porque a pedofilia é generalizada. Ou não é? Mas é a Igreja Católica Apostólica Romana. A vida é assim. O mundo é assim".
E completa: "O PT cometeu erros? Muitos. Mas tem uma coisa: o lado do PT na história, o nosso lado, é o lado do povo, do Brasil".
José Dirceu afirma ainda que há condições de mudar esse cenário. "Pode demorar dois, quatro, seis anos, mas temos. Você não desmonta a estrutura de bem-estar social que o país tem sem consequências. As forças políticas e sociais vão ganhando consciência. Vão surgindo novas lideranças, novos movimentos", disse.
Ele endossa a proposta de unidade das força progressistas nas eleições de 2018. "O país vai ter um longo ciclo de lutas. Mas primeiro é ganhar a eleição. No segundo turno, se as esquerdas se unirem, teremos força para isso", salientou.
Segundo ele, diferentemente de 2014, com o Lula preso, a direita se favorece com o fato de não poder viajar pelo país e fazer debate junto a população, enquanto que "o lado de lá tem a TV Globo, o aparato judicial militar e o poder econômico". "Mas está mais desorganizado e enfraquecido do que nós", frisou.
"Eu tenho confiança de que o fio da história do Brasil não é o fio das forças da direita. O fio da história do Brasil é o fio que nós representamos", concluiu.