Publicado 19/08/2017 20:01
Com a medida, a agência propõe mudanças na apreciação do desempenho das operadoras, que passarão a ser classificadas em cinco faixas de desempenho, de A a E. A forma de aplicação das penalidades também será alterada e haverá variação nos valores das multas. A proposta preocupa defensores dos usuários dos planos, que temem redução do papel fiscalizador da agência.
As operadoras classificadas na faixa A, mais positiva, não estarão sujeitas às medidas fiscalizatórias propostas na norma, sendo facultada a elas a elaboração e apresentação de um Plano de Correção de Conduta. Já as classificadas em B e C deverão apresentar o plano. O chamado Procedimento de Supervisão Fiscalizatória ocorrerá nos casos daquelas da faixa D. Já as piores na classificação, as da faixa E, é que serão objeto de Intervenção Fiscalizatória. Tal intervenção compreende, entre outras ações, a realização de diligência in loco e a elaboração de recomendações.
Hoje, a fiscalização acontece a partir da demanda apresentada à ANS. Cada reclamação é apurada individualmente e pode gerar um auto de infração. Na proposta feita, as reclamações relacionadas a determinada operadora vão ser agrupadas em um só processo, que será avaliado dentro de um período de seis meses. Adicionalmente, hoje as operadoras que estão nos patamares mais baixos de atendimento aos critérios adotados pela ANS são objeto de intervenção fiscalizatória.
A classificação proposta agora terá como base o cumprimento da obrigação de envio de informações à ANS e um indicador de desempenho correspondente à capacidade de solução prévia do conflito com os beneficiários e na estrutura de atendimento. Essa capacidade de resolução dos problemas considera as reclamações feitas pelos consumidores diretamente à ANS.
Consumidor
Para a pesquisadora em saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) Ana Carolina Navarrete, a proposta não ataca o principal problema da fiscalização, que é a “forma passiva de monitorar que a ANS tem, isso é, ela só atua sobre provocação”. Para ela, “a ANS precisa adotar posturas mais ativas de fiscalização”.
Entendimento semelhante foi manifestado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que, após auditoria, recomendou 1 uma ação mais proativa da agência. O tribunal observou, por exemplo, ausência de programa de fiscalização in loco sistematizado e estruturado e também que a ação da agência tem derivado das demandas dos beneficiários.
Embora considere que a junção de regras em uma só normativa possa contribuir para dar mais praticidade e facilitar a compreensão sobre a fiscalização, o Idec critica o fato de a agência continuar tendo como base da avaliação as notificações feitas pelos usuários dos planos que chegam diretamente a ela. “A pessoa que tem um direito violado na hora em que precisa de um plano de saúde está, muitas vezes, em vulnerabilidade, e ela procura diretamente a Defensoria Pública, o Ministério Público, por isso é preciso levar em consideração também os dados sobre processos que envolvem os planos”, disse Ana Carolina Navarrete.
Outra mudança que consta na proposta é relacionada à aplicação das multas e demais sanções. Atualmente, a multa base está fixada em R$ 80 mil, independentemente do caso específico. A nova norma cria uma variação desse valor, que poderá variar de R$ 20 mil a até R$ 160 mil. Casos relacionados à urgência e emergência continuarão a ser penalizadas individualmente, no valor de R$ 250 mil. Na nova proposta, a aplicação de sanções segue a seguinte lógica: quanto pior o desempenho das empresas, mais graves serão as ações e medidas adotadas.
Carlos Ocké-Reis, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e presidente da Associação Brasileira de Economia da Saúde (Abres), alerta sobre o risco de ampliação da concentração desse mercado em poucas e grandes empresas. Ele associa a proposta a projetos que estão tramitando no Congresso, a exemplo do Projeto de Lei PL nº 7.419/2006, que propõe o fim do limite de reajuste dos planos individuais, da definição das coberturas obrigatórias e da aplicação de direitos do consumidor em planos de saúde. “É um movimento de desregulação, no complexo mais amplo de ataque ao sistema público de saúde brasileiro”, avalia.
Planos de Saúde
Questionada sobre sua avaliação acerca da nova proposta de resolução normativa, a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) disse que “considera saudável todo e qualquer debate que tenha como objetivo propor melhorias, permitindo, assim, o contínuo aprimoramento da qualidade assistencial e expansão do acesso à saúde”. Apesar de considerar o tema importante, destacou que “atualmente há assuntos mais preponderantes para o país como, por exemplo, as propostas de reformas previdenciária, tributária, trabalhista e política”.
A associação disse que a saúde suplementar vem se aperfeiçoando continuamente. “Segundo o levantamento do Sindec – Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor, que reúne dados de todos os Procons do país, em 2016, o setor de planos de saúde recebeu 35.318 notificações dentre 1,4 bilhão de atendimentos realizados, o que equivale a uma reclamação para cada 40 mil atendimentos, apenas 0,003% do total”, diz a nota enviada à Agência Brasil. A associação também citou pesquisa recente do Ibope, feita a pedido do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), que indica que 80% das pessoas entrevistadas estão satisfeitas ou muito satisfeitas com o seu plano de saúde devido à qualidade do atendimento.
ANS
Questionada sobre a possível redução de seu papel, a ANS afirmou que “a remodelação da fiscalização exercida pela ANS perpassa pela deflagração de ações fiscalizatórias mais eficazes, inclusive com a previsão de mais atuações in loco”, além de Plano de Correção de Conduta e Procedimento de Supervisão Fiscalizatória, ações que, acredita, “induzem a efetiva mudança de comportamento das operadoras”. Isso porque ela avalia que as ações de fiscalização desenvolvidas atualmente não têm resultado em efetiva redução do número de reclamações.
“Assim, espera-se que as operadoras assimilem a lógica do novo sistema criado, o qual induz que, durante os sucessivos ciclos de fiscalização, aquelas que estiverem classificadas na melhor faixa de desempenho permaneçam na mesma faixa e aquelas que não estiverem, migrem para faixas de desempenho mais positivas. Espera-se, com isso, que, nesse ciclo virtuoso, mais conflitos sejam resolvidos de célere e eficaz para o consumidor consensualmente, por intermédio do programa de intermediação de conflitos da ANS”, destacou a agência em resposta à Agência Brasil.
Sobre uma possível concentração do mercado em decorrência da diferenciação das operadoras e das sanções por faixas, com foco naquelas localizadas na D e E, a ANS explicou que “as medidas intentadas nessas faixas visam corrigir as condutas mais recorrentes para conduzir as operadoras à zona conformidade e, com isso, garantir um melhor atendimento aos seus beneficiários e a ampliação do grau de satisfação no setor”.
A agência reguladora também defendeu a utilização do critério de Notificação de Investigação Preliminar (NIP), que considera as reclamações enviadas diretamente à agência, bem como os dados obtidos junto à Defensoria Pública, ao Ministério Público e aos órgãos de defesa do consumidor. “A resolutividade no âmbito da NIP reflete o sucesso do programa de intermediação. Só no ano de 2016, foram registradas aproximadamente 90.000 reclamações nos canais de atendimento da ANS. Desse número, cerca de 80.000 reclamações foram resolvidas em Intermediação Preliminar. Tais números demonstram a relevância da ANS como canal de contato com o beneficiário”, concluiu.