Militares nos presídios “é mais marketing do que solução”
Para especialistas, medida adotada pelo governo Temer é paliativa e de eficácia questionável para resolver a crise nas penitenciárias. “Decisão de chamar o Exército sempre ocorre quando não sabem o que fazer.”
Publicado 19/01/2017 11:28
Os especialistas veem com bastante ceticismo e preocupação a decisão federal de disponibilizar pelo menos mil homens das Forças Armadas para vistorias em presídios rebelados. “Sabemos que o Exército não funciona bem nessas situações de segurança pública. Vão fazer só varreduras? E por que a polícia não faz isso? Não acredito que seja eficaz. Fica parecendo que é só marketing. Como o Exército tem popularidade, trazem isso para rebater um pouco a agenda negativa que a rebelião dos presídios trouxe”, afirma o professor Claudio Beato, coordenador-geral do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública da Universidade Federal de Minas Gerais.
Resultados catastróficos
Já o professor José Vicente Tavares, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, afirma que a atuação excepcional do Exército em crises urbanas, como ocorreu na ocupação de morros e favelas no Rio de Janeiro, teve resultados catastróficos no passado. “Força Nacional, Exército e construção de novos presídios são apenas soluções paliativas e que já foram feitas no passado. Deu no que deu”, afirma o sociólogo, coordenador do Grupo de Pesquisa Violência e Cidadania da universidade gaúcha.
Segundo Tavares, as Forças Armadas têm funções constitucionais bastante específicas, e entre elas não está a atuação no sistema carcerário, o que requer qualificação e especialização. “O governo tenta tapar o sol com peneiras que já se mostraram furadas.” Para o professor, desde o início das rebeliões, o governo federal não apontou nenhuma medida efetiva que possa ter reflexo na raiz do problema, que é o encarceramento em massa. “Há uma visão muito errônea do que é segurança pública no Brasil”, acrescenta, criticando, ainda, omissões e visões conservadoras do Poder Judiciário.
Em último caso
De acordo com Roberto Dias, professor de direito constitucional da Fundação Getúlio Vargas-SP, o artigo 142 da Constituição prevê que, por iniciativa dos poderes constitucionais, o Exército seja destacado para uma ação excepcional para a manutenção da lei e da ordem. A lei que regulamenta esses casos excepcionais é de 1999.
De acordo com essa lei, invocar o Exército é algo que só deve ser feito quando “esgotados os instrumentos destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio”. Ou seja, “ou o presidente da República ou os governadores dos estados vão ter que reconhecer, formalmente, que há uma falência na segurança pública para a contenção e reversão do problema carcerário que estamos enfrentando”, avalia Dias.
Ainda que haja uma brecha constitucional, Dias questiona se a atuação do Exército nos presídios poderá contribuir de forma efetiva para a solução dos problemas. “Aí parece estar o grande equívoco. Mesmo que respeitados todos os requisitos legais e constitucionais para o emprego das Forças Armadas em situações pontuais e momentâneas, me parece que elas não são aptas para enfrentar um problema como esse.”