Movimentos somam forças contra a PEC e atos tomam conta do país
Apesar da aprovação em caráter terminativo da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 55 pelo Senado, movimentos sociais saíram às ruas para protestar durante toda a terça-feira (13). Manifestações organizadas por estudantes, profissionais da educação, da saúde, Frente Povo sem Medo e Frente Brasil Popular ocorreram em diversas capitais, como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Brasília, Fortaleza e Santa Catarina.
Publicado 14/12/2016 13:32
A intenção dos movimentos é manter o clima de resistência até o início do ano e levar a bandeira do referendo, para que a PEC 55 só possa ser validada se for aprovada por consulta popular.
São Paulo
O principal ato de São Paulo reuniu nesta terça dezenas de organizações. A movimentação começou no final da tarde na Praça do Ciclista e seguiu em marcha pela Avenida Paulista. O coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos, afirmou que a PEC é o maior retrocesso aprovado no país desde o fim da ditadura militar. "Congelar gastos sociais por 20 anos é inconcebível. Nenhum lugar do mundo fez isso. É deixar o Estado brasileiro de joelhos para o rentismo financeiro. Ainda mais de iniciativa de um governo totalmente lameado de corrupção, sem legitimidade, fruto de um golpe e de um parlamento desmoralizado, sem autoridade para decidir nada em nome do povo brasileiro", afirmou.
"Vai haver reação. Hoje, as pesquisas já mostraram que apesar de toda a propaganda do governo, a maioria do povo é contrário à PEC. O que o Parlamento decidiu vai em sentido contrário aos anseios da população", observou Boulos. "E a reação só vai se ampliar. O Brasil se encaminha para o aprofundamento do conflito social no próximo período, disso não há menor dúvida."
Foto: Mídia Ninja
O também coordenador da Frente Povo sem Medo enalteceu o papel das manifestações desta terça-feira como forma de deixar um recado de que a sociedade não deixará a resistência. "As pessoas estão começando a perceber que a alternativa é a mobilização. Vamos lutar para que haja um referendo para o povo decidir. Esses 53 senadores que votaram pela PEC não falam pelo povo brasileiro", defendeu Boulos.
O presidente da CUT, Vagner Freitas, afirma, em matéria no portal da central, que a situação caótica é o resultado de uma gestão ilegítima e sem projeto para o país. "A inabilidade do golpista Temer, mais acostumado a agir nas sombras, parece não fazer a menor ideia do estrago que está causando aos trabalhadores, especialmente os mais pobres", diz. Para ele, não resta outra saída senão eleições diretas para determinar qual caminho os brasileiros desejam para um país "em que a maioria se declarou contra a PEC 55, mas não foi ouvida".
Fiesp
O ato caminhava para o ponto de dispersão, no cruzamento das avenidas Paulista e Brigadeiro Luís Antonio, quando um pequeno grupo se descolou da manifestação e ocupou o saguão de entrada da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), uma das protagonistas do movimento que levou ao golpe parlamentar e ao impeachment de Dilma Rousseff.
Atirando rojões contra a sede da entidade e gritando "Fiesp, golpistas, não passarão", o grupo derrubou uma grade e tentou avançar para dentro do prédio, só sendo contido por seguranças locais, que fecharam os portões. A polícia não interveio. A ocupação durou poucos minutos e o grupo voltou à passeata.
Antes da dispersão, em coro, um jogral selou o compromisso das frentes de mobilização popular para seguir no enfrentamento dos ataques aos direitos civis, trabalhistas e humanos pelo governo Temer. "Nas ruas vamos lutar para revogar esta PEC. Esse congresso não tem legitimidade, não vamos deixar passar esse governo. Hoje em São Paulo, em Brasília, no Rio, é só mais um dia da resistência que está por vir. O povo está nas ruas e não tem medo. Fora Fiesp, Fora Temer. Diretas já!".
Foto: Mídia Ninja
Repressão em Pernambuco
Quarenta e oito anos após a decretação do AI-5, o Exército voltou a ocupar as ruas do Recife, reprimir e prender estudantes que protestavam contra o governo federal. Tudo aconteceu na dispersão da manifestação promovida nesta terça-feira (13) por movimentos sociais contra a PEC 55, que congela gastos sociais por 20 anos e havia sido aprovada horas antes em definitivo pelo plenário do Senado Federal.
Estudantes relataram à reportagem da Marco Zero Conteúdo que a maior parte dos manifestantes já tinha atravessado a ponte Duarte Coelho e chegava na Avenida Guararapes quando as forças de segurança que acompanhavam o fim do protesto (Exército e Polícia Militar) começaram a disparar tiros de bala de borracha. Pelo menos um dos estudantes foi atingido de raspão na cabeça. Um grupo de 50 jovens correu para se proteger pela rua Matias de Albuquerque e acabou encurralado na rua estreita por vários militares do Exército.
Os estudantes foram forçados a ficar ajoelhados e de costas por cerca de 40 minutos até que os primeiros advogados do Movimento Juristas pela Democracia e do Centro Popular de Direitos Humanos chegassem ao local para defendê-los por volta das 18h30. Após a intervenção dos militares do Exército, a Policia Militar se apresentou e substituiu as Forças Armadas, que foram dispensadas.
Repressão em Goiás
Em Goiás, organizadores da manifestação denunciam que a polícia parou todos os ônibus do estado e impedem que os estudantes, professores e sindicalistas participem do ato em Brasília
Os ônibus que saíram de Goiânia nesta terça, na parte da manhã, ficaram horas parados em uma barreira que a polícia militar do Distrito Federal fez em Brasília. Os manifestantes foram impedidos de prosseguir até que a PEC fosse votada, em segunda instância.
Entidades estudantis repudiam aprovação da PEC
A União Nacional dos Estudantes (UNE), União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) e Associação Nacional dos Pós Graduandos (ANPG) lançaram uma nota repudiando a provação da PEC.
Confira a íntegra da nota:
Não poderia ser pior a data para o Brasil reviver a condenação de toda uma geração a partir de uma medida arbitrária de um governo ilegítimo. Após o golpe de estado que instaurou a ditadura militar no Brasil, o 13 de dezembro de 1968 marcou a instalação do Ato Institucional número 5, o AI-5, que cassou as liberdades civis no país por mais uma década. Após o golpe de 2016, este mesmo 13 de dezembro trouxe a cruel aprovação, pelo Senado Federal, da Proposta de Emenda Constitucional 55, a PEC 55, que congela por 20 anos os investimentos públicos no país.
As estudantes e os estudantes repudiam completamente a medida, que vem sido fortemente combatida pela sociedade nos últimos meses, e que compromete fatalmente a educação pública do país, prevista como direito fundamental pela Constituição Federal de 1988. Sob a falsa justificativa de melhorar a economia nacional com um teto de despesas, a medida cai como um castigo para os mais pobres, atingindo também áreas como a saúde, os programas sociais, a segurança pública e o transporte.
A PEC 55 representa o assassinato do Plano Nacional de Educação, marco histórico desse setor no país, conquistado em 2014 no Congresso Nacional após anos de debate e mobilização de estudantes, especialistas, pais e professores, a fim de avançar nas carências da escola e da universidade pública. As duas décadas de vigência da medida ameaçam a qualidade do ensino, a remuneração dos professores e profissionais da educação, as políticas de acesso dos mais pobres às universidades, a assistência estudantil, as bolsas de pós-graduação, o desenvolvimento do conhecimento por meio da pesquisa acadêmica.
Um sinal da má fé e hipocrisia do atual governo com a área educacional é ter aprovado, também de forma abitrária, a Medida Provisória que prevê mudanças no Ensino Médio do país – o que demandaria diálogo e investimentos – e em seguida uma PEC que corta exatamente esses investimentos. Contra as duas medidas, estudantes secundaristas e universitários tem promovido a maior ação conjunta da história do movimento estudantil brasileiro, com as ocupações de mais de mil escolas e universidades. A resposta do governo tem sido unicamente a partir da repressão, com intimidação e violência policial, como a que aconteceu em Brasília, no dia 29 de novembro e que não pode ser repetida.
Segundo pesquisa divulgada pelo instituto Datafolha, a maioria da população brasileira é contrária à PEC, revelando seu caráter antipopular e excludente. A medida também foi duramente criticada por organismos internacionais como a própria Organização das Nações Unidas, que a definiu como um “erro histórico”. Trata-se, até o momento, do mais terrível e desastroso legado do governo golpista de Michel Temer, revelando a intenção de redução arbitrária do orçamento público a fim de transferir os recursos para o setor rentista interessado na criminosa especulação financeira e na os lucros da dívida pública.
A classe estudantil brasileira, assim como os demais movimentos sociais convocam a sociedade para resistir, nas ruas, à tentativa de desmanche do estado brasileiro e á retirada de direitos. Será necessária organização e mobilização de todos os setores para enfrentar a agenda conservadora autoritária e retomar as bases da nossa democracia. Esse é o papel que sempre coube à juventude organizada brasileira e não será diferente nesse momento crítico. Vamos à luta.