O fracasso das políticas econômicas de austeridade na Grécia
Tem ouvido falar sobre a crise na Grécia? Há quanto tempo não surge na tela da televisão, nos noticiários, analistas econômicos discorrendo sobre a Grécia? O país ainda está em crise? E as medidas econômicas adotadas? A austeridade funcionou? A resposta é "não". Não funcionou, pois o país encontra-se em uma espiral depressiva, a dívida só aumenta e a economia tem crescimento negativo e aumento no desemprego.
Publicado 24/10/2016 19:21
Em 2010, a previsão era de retorno ao crescimento em 2013 com as medidas de austeridade adotadas. Em um dado momento, dizia-se que em 2015 o país passaria a crescer se aprofundasse os cortes draconianos em despesas fundamentais. Agora se fala em fim da crise em 2018.
A economia grega está em crise há mais de 5 anos. Pesquisas recentes entre a população revelam que 69% dos gregos não terão meios para pagar os impostos este ano e que 89% acredita que as novas medidas vão agravar a recessão.
A enrascada econômica em que se meteu a Grécia tem causas externas: empréstimos com juros e prazos irreais, maquiagem de dados e as políticas adotadas pela Troika (formada pelo Fundo Monetário Internacional, o Banco Central Europeu e a Comissão Europeia). Nenhum país que pertença ao bloco tem soberania sobre sua própria economia e as políticas adotadas pela União Europeia para com a Grécia provocaram um endividamento impagável.
Os governos que conduziram a esta situação caíram, um breve período de caos político se estabeleceu até que os gregos puseram no poder o Syriza, um partido com várias formações de esquerda dentro de si, que se elegeu prometendo livrar a Grécia da austeridade, mas no fim foi obrigado a tomar as medidas que condenava.
Em 2015 o governo realiza um plebiscito. Diante do fracasso de mais uma renegociação da dívida, o governo recorreu ao povo. Nas urnas, os gregos rejeitaram a proposta de socorro internacional feita pela Troika. Um recado do povo de que estaria disposto a enfrentar as consequências do fim da "ajuda" econômica. Isso, segundo os analistas, levaria o país para fora da União Europeia.
O governo do Syriza, porém, decidiu dar continuidade às negociações e aceitou as determinações da Troika, que teve de reconsiderar algumas exigências. A manobra terminou com a renúncia do ministro das Finanças, Yanis Varoufakis.
Em agosto de 2015 o Banco Central da Grécia revelou as consequências do "estrangulamento econômico" imposto pela Comissão Europeia, concluindo que se não sucumbisse à pressão dos parceiros europeus, uma crise de enormes proporções seria detonada na Europa.
"A crise da dívida como a que estamos vivendo atualmente tornou-se incontrolável, com grande risco para o sistema bancário e para a estabilidade financeira", disse na época um relatório da instituição.
A mídia, na época, manipulou resultados de pesquisas para dizer que a população não queria deixar a União Europeia e, consequentemente, aceitava as restrições das autoridades europeias: a austeridade é o custo da adesão a área do euro.
O que a mídia não dizia é que a maioria dos gregos – nas mesmas pesquisas – também não queria as medidas que a Troika queriam impor.
O povo dizia que o programa de resgate original de 245 bilhões de euros só proporcionou dificuldades econômicas e isso não foi repercutido pelos meios de comunicação. As medidas foram tomadas e a economia não decolou. Ao contrário. A perda prevista do PIB para 2016 é de 1%, e o desemprego ainda supera os 25% da população em idade de trabalho.
O aumento da desigualdade e da pobreza, falta de moradia, doenças mentais e suicídios, são a prova da "crise humanitária" que os gregos sofrem diariamente.
Enquanto o governo insistia em resolver as necessidades imediatas (promoção de investimento, criação de emprego, maior distribuição de renda, etc.) e menos em questionar os termos da dívida, Bruxelas bloqueava qualquer possibilidade de recuperação, colocando o reembolso da dívida como a maior prioridade.
Alex Tsipras, o premiê grego, ficou praticamente "algemado", sem a possibilidade de implementar uma política econômica alternativa, uma situação contrária à sua vontade, diminuindo gradualmente a confiança em seu partido político, o Syriza.
A dívida e mais a tal "austeridade", acabaram por impor mais dívidas, mais cortes de investimentos (demissões no governo, redução das aposentadorias), uma situação que colocou a Grécia em uma "espiral depressiva" que parece interminável.
A vitória do Syriza sinalizou para os europeus a possibilidade de uma derrota do neoliberalismo, o que fez com que as aves de rapina, os credores, decidissem impor sua vontade a qualquer custo. O desgaste do governo de Tsipras seria interpretado como a impossibilidade de uma saída pela esquerda.
Em entrevista recente, o ministro das Finanças grego, Euclid Tsakalotos revela que a Grécia está longe de sair da crise.
"Fizemos muitas promessas, assumimos compromissos, mas também levamos este acordo às urnas. Nunca dissemos que íamos interromper o acordo, não mudamos de ideias. Este acordo, com tudo de bom e de mau que tem, fez parte da campanha eleitoral. Ganhamos as eleições com base nele", recorda.
Sobre o futuro, que ainda é bastante desalentador, ele diz que "se nós não formos eficazes numa altura em que não há crescimento e o desemprego está nos 25%, então ninguém votará em nós depois da recuperação. As pessoas escolheram o Syriza porque sabem que vamos aplicar o programa com a maior sensibilidade social possível. Foi isso que mostramos na reforma do sistema de pensões e do sistema fiscal".
Há quatro meses, em junho deste ano, ao ser questionado sobre quando os gregos poderão realmente ter a noção de que as coisas mudarão, não apenas nos números, mas na vida real, ele respondeu que "em um ano".
"Se dentro de um ano, me convidar outra vez e não houver sinais de recuperação, então aí sim, fracassamos. Espero que, no ano que vem, por esta altura, os fatores de desenvolvimento do nosso programa sejam notórios e o crescimento regresse. Acho que as coisas vão estar muito diferentes", disse.
No entanto, quatro meses depois, os sinais vitais da economia só pioram. Segundo economistas gregos, do instituto IOBE, a previsão de contração da economia é de 1% do PIB, após uma contração de 0,3% em 2015. A previsão é pior que a do FMI, que projeta queda de 0,6% do PIB.
De acordo com a Fundação para a Investigação Econômica e Industrial, o desemprego deve aumentar para 25,2% este ano, de 24,4% no último trimestre do ano passado.
Nas estatísticas do escritório governamental da área, o Elstat, os dados também são ruins. O consumo privado caiu 0,1%. Entre os meses de abril e junho, as importações caíram 0,4% , enquanto as exportações diminuíram 1,0%.
O Elstat reviu também as suas estimativas, apontando para uma queda do PIB de 0,9% entre abril e junho de 2016, diante do mesmo período do ano passado, contra os 0,7% inicialmente previstos.
O que se vê é que o remédio – ou seria veneno? – aplicado à Grécia debilitou ainda mais a sua economia e a lançou em um poço profundo. A exigência por parte dos credores de que a Grécia chegue a um superavit fiscal de 3,5% antes de 2018 é uma garantia de que o país seguirá vivendo sob uma depressão.
Ainda que a Grécia tenha sua parcela de culpa na situação, descoberta no fim do governo de direita que mascarou os problemas fiscais em 2010, a desastrosa situação em que o país se encontra desde então é de responsabilidade da Troika.
O fato de um terceiro pacote de resgate de 86 bilhões de euros ter sido aplicado há pouco mais de um ano, cinco anos depois da eclosão da crise, mostrou que as condições dadas e concretizadas não ajudaram. As receitas do Eurogrupo e do Fundo Monetário Internacional para a Grécia nunca tiveram o efeito anunciado. Em agosto de 2015, a mesma receita foi prescrita pela terceira vez. E mais uma vez não funcionou.