Dallari: Inquérito contra Dilma é “mais uma farsa jurídica”
Nos dias que antecedem a decisiva votação do processo de impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff, o ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, decidiu abrir um inquérito para investigar a presidenta e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, além de dois ex-ministros – Aloizio Mercadante e José Eduardo Cardozo.
Por Dayane Santos
Publicado 17/08/2016 12:43
Segundo Teori, o objetivo é apurar indícios da suposta tentativa de obstruir as investigações da Operação Lava Jato, apontando a nomeação de Lula como ministro com o suposto objetivo de dar a ele foro privilegiado.
Apesar de se tratar apenas da abertura de inquérito – um procedimento formal e frequente –, a grande mídia tratou como se o STF estivesse investigando algo confirmado e como se o procedimento fosse para reunir as provas. No entanto, a instauração do inquérito será para tentar provar se houve ou não obstrução. Depois dessa fase, a Procuradoria Geral da República terá que decidir se denuncia ou se pede arquivamento da apuração.
Vale lembrar que, quanto às gravações feitas pelo operador do PMDB no esquema da Lava Jato, Sérgio Machado, em conversa com o ex-ministro e amigo fiel de Michel Temer, o senador Romero Jucá (PMDB-RR), nenhum inquérito foi aberto. Na conversa, Jucá afirma que estava trabalhando para garantir votos pelo impeachment da Dilma e categoricamente reforça que era a saída para obstruir a Lava Jato. Isso é indício ou fato?
Entrevistados pelo Portal Vermelho, os juristas Dalmo de Abreu Dallari e Luiz Tarcísio Teixeira consideraram que a abertura do inquérito é uma demonstração de que as instituições brasileiras estão contaminadas pela crise política.
O professor de Direito Constitucional da PUC-SP e mestre em Direito de Estado Luiz Tarcísio Teixeira considerou a abertura da investigação “um absurdo”.
“A investigação é simplesmente um absurdo. Escuta-se a presidente da República e ao invés de apurar a escuta ilegal e imoral é a presidente que é investigada. É uma inversão absoluta”, disse Tarcísio. Para ele, esse movimento demonstra que “estão jogando todas as fichas no impeachment”. “É muito claro”, reforça.
O pedido de apuração foi formulado pelo procurador Rodrigo Janot ao Supremo com base nos grampos do juiz Sérgio Moro, responsável pela Lava Jato em primeira instância. Teori tinha enviado o pedido para nova análise do procurador depois de ter anulado o processo das conversas telefônicas entre Lula e Dilma feito ilegalmente. Em resposta ao STF, Moro confessou que violou a Constituição e não deveria ter autorizado a divulgação de escutas telefônicas, mas chamou o abuso à Constituição de “equívoco” e o STF, aparentemente, encerrou o assunto.
Além de violação da competência do STF, admitida pelo próprio juiz, Moro violou também a Lei 9296/96, que estabelece em seu artigo 8º que os grampos telefônicos e suas respectivas transcrições são sigilosas, prevendo pena de dois a quatro anos de prisão por quebra de segredo da Justiça.
Grampo ilegal
Em março, após a divulgação do grampo ilegal feito por Moro, a presidenta Dilma denunciou o abuso e enfatizou que em qualquer lugar do mundo, grampo ilegal dá cadeia.
“Presidente do Brasil ou de qualquer país democrático do mundo tem o que se chama de garantias constitucionais. Não pode ser grampeado, a não ser com autorização expressa da Suprema Corte. Em qualquer lugar do mundo qualquer um que grampear um presidente vai preso”, enfatizou Dilma.
Dalmo Dallari também concorda que há uma contaminação política e classifica a decisão de abertura de inquérito como “mais uma farsa jurídica”.
“Um faz de conta. Para atingir objetivos políticos ou vinganças pessoais estão agredindo escancaradamente a Constituição. Isso é muito ruim para o povo brasileiro”, frisou o professor emérito da USP. “É na verdade uma tentativa de criar mais volume nas acusações à presidenta Dilma e ao Lula”, acrescenta.
De acordo com Dallari, a abertura da investigação “não tem uma justificativa jurídica porque não há nenhum fundamento, motivo, nenhuma base jurídica que justifique”.
O jurista reforça ainda que essa contaminação política das instituições afeta frontalmente a democracia. “É altamente negativo. É falta de vocação democrática e de respeito pela Constituição. Temos uma Constituição rigorosamente democrática, feita pelo povo, e que deveria ser respeitada”.