Meirelles quer mudar Constituição para limitar gastos sociais
Em entrevista à GloboNews, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, reforçou o mantra neoliberal e antipopular de que os gastos sociais garantidos pela Constituição de 1988 não cabem no orçamento. Segundo ele, o problema da despesa pública no país decorre dos gastos obrigatórios definidos na Carta, que estipula percentuais mínimos a serem investidos em saúde e educação, por exemplo. “Ou mudamos a Constituição, ou não resolveremos a dívida da União”, disse, sem pudores, na noite de terça (21).
Publicado 22/06/2016 17:32
É com este argumento que o governo tem proposto ou apoiado uma série de mudanças constitucionais, que atropelam direitos e garantias sociais e trabalhistas.
A principal delas é a Proposta de Emenda Constitucional (PEC), que limita o crescimento de gastos públicos – exceto os de natureza financeira – à variação da inflação do ano anterior, por um período de 20 anos.
Significa que, durante duas décadas, não poderá haver aumento real dos gastos públicos, independentemente da situação da economia ou da proposta de governo eleita nas urnas.
Meirelles também falou sobre a renegociação das dívidas dos estados, que incluiu um acordo para que eles também se comprometerem a fixar um teto para o crescimento de suas despesas.
“Devemos olhar os gastos públicos e a questão fiscal não só do lado do governo federal, mas também dos estados. Houve um ganho importante nessa negociação, que foi o acordo [com os governadores], limitando o crescimento dos gastos dos estados pelo mesmo percentual da União, que é crescimento da dívida limitado à inflação do ano anterior”, afirmou.
Depois da saraivada de críticas sobre a contradição entre o discurso da austeridade e a prática do governo, que aprova reajustes de funcionários e abre mão de receitas, Meirelles fez questão de frisar que esse acordo com os estados – que trará um impacto de pelo menos R$ 50 bilhões até 2018 aos cofres da União – já está incluído na previsão de deficit primário de R$ 170 bilhões este ano.
Alguns políticos e economistas já vinham anunciando que a estimativa de deficit tão elevado poderia servir ao governo para negociar com setores importantes apoio a seus projetos e mesmo ao impeachment.
De acordo com o ministro, mesmo que a PEC que limita os gastos não seja aprovada no Congresso, pelo acordo da renegociação, os estados terão uma obrigação contratual de seguir este teto para os gastos.
“É um projeto de lei que ‘amarra as duas pontas’, isto é, o acordo da dívida e a questão de limitação de gastos. Além disso, o contrato prevê essa limitação por 20 anos e com cláusulas de violação contratual, caso isso não seja seguido pelos estados durante esse período de 20 anos. Em caso, por exemplo, de não aprovação da emenda constitucional, eles continuam com a obrigação contratual”, disse.
Ainda sobre a PEC que estabelece a nova regra fiscal, Meirelles disse que a proposta definirá o valor mínimo para os gastos com saúde e educação, a ser corrigidos pela inflação, “por ser prioridade nacional”. E “as outras despesas terão de se acomodar dentro do limite”, assinalou.
O ministro também defendeu mudar a Constituição no que se refere à previdência, “para que esse teto tenha funcionamento harmônico, para que o crescimento dos gastos da previdência não empurre as outras despesas”.
Ele reforçou seu apoio à ideia de estipular a obrigatoriedade de uma idade mínima de 65 anos para a pessoa possa se aposentar. “O trabalhador pode se aposentar antes, mas quem paga a conta? É a sociedade. Tem que ter evolução das despesas que sociedade brasileira tenha condição de pagar, temos que controlar isso para que o aumento das despesas não seja financiado pelo aumento dos juros”, defendeu.
O ministro também repetiu o discurso de que, com o ajuste fiscal, os problemas econômicos devem ser superados – argumentação rebatida por diversos economistas. Segundo Meirelles, a primeira causa da recessão é a “desconfiança” sobre a dívida pública. “Se o problema fiscal tiver trajetória que dê mais confiança, a taxa de juros pode começar a cair e a dívida ficar mais controlada, o que aumenta a confiança e reverte esse círculo vicioso para um virtuoso”, comentou o ministro.
Questionado sobre o fato de pertencer a um governo provisório, que impõe uma restrição fiscal para 20 anos, ele afirmou: “Esta proposta não é deste governo, é para o Brasil. Ela vai muito além de um governo. É um processo que vai durar vários governos, por isso é importante a mudança da Constituição, porque vai vincular os governos à frente. (…) O menos relevante é quanto tempo dura este governo ou quanto tempo vou ficar nesta cadeira”.
Afinal, depois de promover o desmonte da Constituição, a gestão interina já terá garantido que a maior parcela do orçamento seja destinada a atender aos seus interesses, como o pagamento de juros aos rentistas, por exemplo.
Diversos economistas têm feito críticas à política de austeridade fiscal, à PEC que limita os gastos e à reforma da previdência propostas pelo governo interino de Michel Temer. Apontam que se trata de um ajuste seletivo, que retira direitos sociais, prejudicando a população mais pobre, enquanto mantém privilégios daqueles que estão no teto da pirâmide.