Diógenes Júnior: 2015 – o ano em que a democracia foi colocada à prova
"Foi o melhor dos tempos, foi o pior dos tempos. Foi a idade da sabedoria, foi a idade da tolice. Foi a época da fé, foi a época da incredulidade. Foi a estação da luz, foi a estação das trevas. Foi a primavera da esperança, foi o inverno do desespero. Tínhamos tudo diante de nós, não havia nada antes de nós.Todos íamos direto para o céu, todos íamos direto para o outro lado.”
Um Conto Sobre Duas Cidades — Charles Dickens
Por Diógenes Júnior *
Publicado 23/12/2015 10:58
Vão se fechando as cortinas e se aproxima o último ato deste ano de 2015. Um ano de muitas lutas, e que ficará marcado para sempre em nossas memórias como o ano em que os brasileiros saíram às ruas em defesa da democracia, como em poucos momentos se viu na história republicana do Brasil.
As forças conservadoras antidemocráticas, incapazes de aceitar os resultados das urnas, se organizaram por diversas vezes na intenção de golpear nossa jovem democracia como não se via desde 1964.
Aliás os paralelos entre o ano de 1964 e 2015 são inúmeros.
Em artigos anteriores alertei: “não estamos em 1964, mas já chegamos em 1962”.
2015 foi o ano em que estivemos muito próximos de vivenciarmos outro 1964, embora dessa feita sem tanques tomando as ruas, sem soldados insurretos saindo de seus quartéis.
De um lado uma parcela da população que, alimentada diuturnamente por uma mídia compromissada com os interesses estrangeiros, se apresentou disposta a tentar derribar do poder uma presidenta honrada, contra a qual não há sequer a menor suspeita de ter praticado algum crime.
Tal parcela da população foi cooptada pelos representantes do que há de mais sórdido, violento e antidemocrático no cenário político nacional.
Fantasmas da ditadura, fascistas, pessoas que outorgaram a si mesmas o título de “intervencionistas”, saudosos dos tempos das trevas.
Gente que – ironicamente – saiu às ruas respaldadas pela democracia para pedir justamente por menos democracia.
Por diversas vezes essa parcela da população, que se identifica com discursos protofascistas, se organizou em espetáculos dantescos, manifestações com direito à presença de mulheres nuas em busca de holofotes, políticos de extrema direita portando armas, desequilibrados mentais travestidos de personagens de histórias em quadrinhos e toda uma fauna de pessoas confusas não apenas politicamente, mas também com relação ao seu papel como cidadãos.
2015 foi o ano dos linchamentos, o ano dos justiceiros.
O ano onde o autointitulado “cidadão de bem” vociferou o senso comum “bandido bom é bandido morto” sem corar de vergonha, antes orgulhando-se de assumir essa vergonhosa posição.
Nunca tantos se juntaram para falar tanta bobagem.
2015 foi o ano em que policiais militares de São Paulo e do Ceará praticaram chacinas, sendo que os de São Paulo espancaram estudantes que tentavam evitar o fechamento de escolas e professores que lutavam por melhores condições de trabalho naquela que foi a mais longa greve de professores da história do estado: 92 dias.
2015 ficará para sempre marcado na memória dos habitantes do Paraná como o ano em que mais de 200 professores foram massacrados pela ação da sempre truculenta Polícia Militar, a mando do seu comandante em chefe, o governador tucano Beto Richa.
2015 foi o ano em que policiais militares do Rio de Janeiro executaram covardemente cinco jovens inocentes com mais de 100 tiros de fuzil.
2015 foi o ano no qual por diversas vezes ficamos prostrados diante de um panorama político dos mais conturbados e seguimos, ora perplexos, ora indignados, reféns de uma situação que colocou muitas vezes em xeque a reputação e a biografia daqueles que detinham o poder para desatar nós, lançar luz sobre as sombras ou no sentido inverso, mergulhar o país em um processo que nos jogaria novamente em trevas sem fim.
2015 foi o ano em que o tema da redação do ENEM trouxe para os holofotes da mídia, para o centro do palco das discussões um assunto o qual a sociedade tem de dedicar com mais empenho: a questão da violência contra a mulher.
Sete milhões e setecentos mil candidatos fizeram aquela prova.
Eu fui um deles.
2015 foi o ano em que os jovens estudantes de São Paulo tomaram o protagonismo e ocuparam o que é seu por direito: as escolas, radicalizando a democracia como há muito não se via e fazendo com que o governo fascista e autoritário do tucano Geraldo Alckimin tivesse que voltar atrás e revogar o fechamento das escolas por ele planejado.
2015 foi o ano em que meninos e meninas escreveram uma linda página na história do país, fortalecendo a promessa de uma revolução que continuará em curso, a construção de um novo mundo e de uma nova sociedade, onde a participação popular nas decisões governamentais será cada vez maior.
2015 foi o ano em que as mulheres saíram às ruas em defesa de seus direitos, contra as forças conservadoras e reacionárias, lutando contra a PL 5069, aos brados da palavra de ordem, uníssonas: FORA CUNHA!
2105 foi o ano em que as forças de esquerda estiveram em alguns momentos dispersas e desunidas, mas que no momento crucial, onde urgia a defesa da democracia, uniram-se na construção da Frente Brasil Popular e organizaram manifestações em mais de 40 cidades que não apenas se contrapuseram à manifestação fascista e golpista da direita, mas que conseguiriam mostrar sua musculatura, tomando de volta o que sempre foi tradicionalmente nosso e havia sido sequestrado pelos golpistas: as ruas.
2015 vai chegando ao final, e seu legado reputo como positivo para as forças progressistas.
Combatemos o bom combate, defendemos a democracia, nos organizamos, nos mobilizamos, lutamos.
Respondemos aos golpistas e a uma oposição desqualificada, extremamente desleal e raivosa sempre nos valendo de argumentos sólidos, baseados em fatos, alicerçados na verdade e pautados pela democracia que lutamos para conquistar e que temos aprimorado na manutenção do dia a dia, dia após dia, luta após luta.
Que venha 2016!
E que possamos dele dizer:
“Será o melhor dos tempos.
Será a idade da sabedoria.
Será a época da fé.
Será a estação da luz.
Será a primavera da esperança.
Teremos tudo diante de nós.”
*Estudante de Ciências Sociais, pesquisador independente, militante do PCdoB, ativista dos Direitos Humanos e Jornalista Livre