Renato Rabelo: Dilma retoma iniciativa e a oposição se desmascara
A crise chegava ao impasse político. Estava em xeque a própria governabilidade. Antes, no mês de agosto, de vaticinados agouros, até que a presidenta conseguiu certa trégua, inesperada, mas passageira.
Por Renato Rabelo*
Publicado 05/10/2015 11:40
O mês de setembro já começou em labaredas, cuja senha utilizada pelas oposições e porta-vozes do dito mercado, extremando a crise, foi o rebaixamento do Brasil, segundo decisão da agência norte-americana de risco Standard & Poor’s.
O golpismo chegou açuladamente a formalizar um “roteiro do impeachment” na Câmara dos Deputados, à revelia do fato e sem base jurídica. E numa tentativa ostensiva de detonar o governo e complicar a crise econômica, a oposição, em aliança com oportunistas de vários matizes, no Congresso, se encaminhava para derrubar os vetos da presidenta Dilma Rousseff, que neste ato de resistência impedia a vigência das “pautas-bomba”.
É nesse auge de tormenta política que a presidenta Dilma, na vivência de incessante instabilidade e ameaça crescente, empreende maior esforço de diálogo e debate, levando-a a assumir a recomposição e reorganização de seu governo, na busca de abrir caminho diante de pesada cerração.
A presidenta, desde meados de setembro, foi à luta a fim de conseguir uma maioria parlamentar, decisiva para a governança neste momento. Desse modo procurou recompor e ajustar seu governo que estava defasado diante do contexto da relação de forças políticas, que compunha a própria base do governo, nas condições dadas pelas eleições de 2014, nas quais cresceram as tendências conservadoras, sobretudo na Câmara dos Deputados.
O “presidencialismo de coalizão” é mais complicado e adverso em tal situação para formação de um governo dirigido pela esquerda. E quando tem sido declinante a confiança da população na presidenta.
Mudar a correlação de forças, resultante de um pleito recente, expressando uma realidade política mais profunda e enraizada, não se muda pela simples ação da vontade política, ou mesmo através de ações maiores, massivas, em tempo breve. Mais ainda, na circunstância de esgotamento de um ciclo e tentativa de transitar para novo ciclo de desenvolvimento nacional, num contexto de grande e prolongada crise econômica mundial impactando o país.
Que por sinal, nesse curso de crise, num primeiro momento dá vazão às tendências conservadoras, de direita e de ultradireita, como vem acontecendo na Europa e nos Estados Unidos. E em nosso país, situação que corresponde à esquerda a responsabilidade para sair da crise, porquanto se encontra no centro do poder desde 2003. Em contrapartida o conservadorismo e o reacionarismo extremado se reaglutinam assim, servindo-se dessa situação, para sua volta ao centro do poder.
É óbvio que a busca do êxito nos acordos para nova recomposição do governo tinha que passar, principalmente, pela participação do maior líder do partido da presidenta – Luiz Inácio Lula da Silva – e do maior partido aliado, o PMDB, seu presidente e suas lideranças. Nas condições dadas não há outra via para restabelecer a coalizão governamental. A presidenta já ganhou a primeira batalha no Congresso para sustentação dos vetos.
O mês de outubro já começa com o abrandamento da crise. A presidenta Dilma assumiu a iniciativa política, alcançando seu principal objetivo: sustentar a governabilidade e possibilitar a estabilidade política. As forças da oposição interessadas tão somente na desconstrução do governo, diante dos primeiros sinais que demonstravam ser a iniciativa presidencial bem-sucedida, já afirmavam que Dilma procurava arrastar Lula e o PMDB para o seu meio, no qual estava enredada.
E agora pelas indicações de que o empreendimento aglutinador pode dar certo, a oposição refaz o discurso: diz, a presidenta se manterá sob a “regência do PMDB e tutela lulista”. E o ideólogo-mor da oposição, FHC, numa tirada de puro cinismo, afirma que a presidenta “entregou sua alma ao diabo”, para “salvar seu mandato”. FHC “esquece” sua conhecida trajetória, que é quem, realmente, vendeu sua alma aos interesses alienígenas.
Este momento de distensão da crise se completa, por outro lado, pelo contínuo desmascaramento da oposição golpista: exibe uma fachada moralista, mas na sua essência é tudo pelo golpe visando sua volta ao governo da República.
Mesmo porque a maioria dos condutores na operação golpista está comprometida, de uma forma outra, nas investigações da Policia Federal e do Ministério Público, em curso, tudo sendo visto com inteira complacência pela mídia dominante, sendo o caso mais saliente, do pretendido aliado de quem eles esperam mais, continuamente citado nas investigações dentro e fora do país, o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha. Revelando assim qual o verdadeiro “fundamento” do ansiado impeachment – uma saída política à direita, sem base jurídica, que justificasse “institucionalmente” a derrubada da presidenta.
Pois é certo começar pela estabilidade política. Este é o objetivo imediato, para superar o impasse e sustar a ameaça golpista permanente. Por isso é também a premissa para a estabilidade na economia, e transição de novo ciclo político, econômico e social, compreendido pela estratégia de retomada do projeto de desenvolvimento nacional, democrático e soberano, garantidor do progresso do social, na etapa atual.
Nesse sentido, esse é o caminho que se impõe para recomposição e reforço do liame com ampla base social que respalde o governo.
Em tal situação de crise geral e de acirramento político, dá-se um embate, por um lado, onde as forças conservadoras e antidemocráticas detêm importantes parcelas de poder de Estado e procuram manter uma linha ofensiva e agressiva pela blindagem de seus privilégios.
Por outro, para virar a disputa para o lado do avanço democrático e defesa de maiores conquistas sociais, depende de crescente organização dos trabalhadores e camadas populares por seus direitos, não bastando somente isso, mas indo além, na elevação da consciência política por um Estado realmente democrático e avanço da nação por maior conquista civilizacional.
A alternativa que possa concretizar esse propósito deve resultar pelo diálogo constante e o debate, que passa pela mobilização popular e impulso à presidenta da República.
Tem esse sentido a organização da Frente Brasil Popular (FBP). É uma importante iniciativa que congrega partidos, organizações sindicais e sociais, lideranças de vários setores, intelectuais, que comungam de afinidades de esquerda e progressistas. É justo que essa Frente debata e apresente alternativas para a crise, ou busque “mudança da política econômica”. O que não podemos confundir é o que é emergencial, e merece ação imediata para barrar a avalanche golpista em curso. As divergências não devem estar no primeiro plano agora. Derrubar a presidenta somente ganha as forças conservadoras e toda direita, seria um grande retrocesso para o avanço civilizacional do país.
No entanto a questão de uma alternativa viável, um projeto para um novo ciclo de desenvolvimento nacional, diante do patamar alcançado pelo país, envolve um conjunto de questões que demandam reformas estruturais democráticas e justa estratégia de crescimento econômico para o Brasil de hoje, domínio dessa realidade própria.
Deve constar de uma saída financeira e econômica soberana em relação ao domínio da oligarquia financeira global, voltada para os interesses do povo e da nação. Por isso, exige duro e, provavelmente, prolongado embate político e econômico, não cabendo assim, por mais bem intencionada que seja guinada rápida e voluntarista, ou pretensas soluções definitivas para alcance do êxito.