Rio de Janeiro recebe a Copa do Mundo em clima de confraternização
A cidade será palco da final do mundial no Estádio do Maracanã e apresenta recordes de faturamento no setor de turismo e hotelaria. Durante a Copa do Mundo, o Rio de Janeiro, uma das sedes do Mundial, se transformou em uma verdadeira Babel, um caleidoscópio, uma pintura mural, uma orquestração sonora, formando um mosaico de cores, vozes, línguas, etnias e culturas. O clima na cidade com fama de cartão postal é de confraternização.
Por Sheila Fonseca, especial para o Vermelho*
Publicado 17/06/2014 15:55
Para o estudante de Administração Felipe Cardoso, o futebol tem a virtude de unir as pessoas: “Acho que quando o futebol ajuda a unir o povo em torno de um pensamento de amor ao país é interessante, pois o povo brasileiro sempre se diminui muito e é bom que tenha algo que ajude a fortalecer a identidade nacional. Gosto desse movimento de turismo. Acho que assim como foi dito na imprensa internacional, os turistas consideram que o melhor do Brasil é o brasileiro. O nosso povo tem uma capacidade de receber bem e confraternizar muito grande, logo essa verdadeira reunião internacional acaba virando uma grande festa.” conta.
Felipe se diz um torcedor apaixonado e afirma que o nível dos jogos desta Copa do Mundo está se revelando bastante elevado até o momento: “Os jogos estão sendo muito bons! Tanto aqui quanto no exterior se fala em um dos melhores inícios de Copa na História.”, diz otimista.
O publicitário e empresário Marcelo Gorodicht, diretor executivo da agência de publicidade carioca “X-Tudo”, também se diz animado com o mundial e aponta o futebol como uma característica da formação da identidade do povo brasileiro: “O futebol, que é apenas um esporte em outros países, no Brasil é muito diferente. É mesmo uma manifestação cultural, como a música, por exemplo. O brasileiro já nasce jogando bola. Além disso, o futebol mostra um país vencedor, ajuda a lidar com as mazelas do dia a dia. Infelizmente, em muitos momentos da nossa história recente, foi utilizado para se obter vantagens financeiras, o que é uma pena, pois se trata de explorar a emoção do povão para beneficiar poucos. Acho que o clima desse mundial está divertido. O brasileiro recebe naturalmente bem e não sei se chega a haver troca de manifestações culturais, mas tenho a certeza de que está rolando uma grande confraternização.”, diz.
Marcelo, que também é torcedor fanático do Flamengo, conta que compareceu ao estádio do Maracanã na estreia da seleção da Argentina e ficou surpreendido com a paixão dos argentinos “Estou torcendo para o Brasil, claro, mas torço mais ainda por bons jogos, como aliás tivemos em sua imensa maioria na primeira rodada. Confesso que em matéria de futebol, sou mais rubro negro que brasileiro, então , uma eventual eliminação do Brasil antes da final, me faria sofrer muito, mas muito menos que o meu Flamengo perder um mero Campeonato Carioca… Eu adorei a experiência de assistir a um jogo de Copa do Mundo. É mesmo um grande espetáculo, muito bem produzido e ainda vi bem de pertinho, um golaço do Messi. Mas sem dúvida, o que mais me impressionou foram os argentinos e sua forma alucinante de torcer. Eles são realmente bons nisso”, conta.
O empresário e escritor Eldes Saullo, sócio-fundador da agência Brainter e autor do livro “49 dicas de Planejamento e Marketing de Aplicativos”, sucesso de vendas deste ano na Amazon, ressalta o clima positivo e diz que o mundial é fonte de inspiração criativa “O futebol certamente é fonte de inspiração. Às vezes sonho que estou jogando ao lado do Zico. Fiz grandes amigos jogando peladas e jogos sérios de campeonato. O futebol está em nosso DNA, como o Samba e o Carnaval. Faz parte da marca Brasil. O brasileiro é muito receptivo. Somos todos muito acolhedores.”
Arnaldo Vieira, compositor e diretor do Centro de Arte Maria Teresa Vieira, também acredita na importância do futebol como manifestação cultural: “O futebol tem grande importância, assim como o Samba e a Capoeira. Por essas formas de interação e integração coletiva desenvolvemos e expressamos nosso gestual identitário e brasilificamos o mundo.”
Loucuras de torcedor
A paixão pelo futebol combina com verdadeiras loucuras para e
O mineiro da cidade de Passa Quatro, Eldes Saullo, já morou no Rio, hoje mora em São Paulo, é torcedor do Flamengo e conta que já correu fantasiado pelas ruas do Rio para comemorar a vitória do seu time: “Vestido de UltraMengo, com uma capa e máscara, corri pelo Túnel Rebouças, na Zona Sul do Rio, no meio dos carros quando o Flamengo foi campeão brasileiro em 1992”, conta Eldes.
Marcelo Gorodicht, carioca e também torcedor do Flamengo, não fica atrás e conta que já vendeu o carro dado de presente pelo pai para assistir ao jogo do seu time no Japão: “A maior loucura que fiz, e foi loucura mesmo, foi aos 18 anos, vender a Brasília usada que meu pai havia me dado com muito sacrifício no meu aniversário pra comprar passagem e ir assistir ao Mengão ser campeão Mundial no Japão em 81. O meu velho pai, Botafoguense de carteirinha, ficou seis meses sem falar comigo. Mas sinceramente, não me arrependo nem um pouquinho…” conta Marcelo, bem-humorado.
O carioca Felipe Cardoso, torcedor do Fluminense, diz que já enfrentou até enchente pelo seu time de coração: “Quando meu time foi campeão, caiu um verdadeiro dilúvio aqui no Rio, e eu atravessei a Praça da Bandeira, no Centro do Rio, com enchente na altura da cintura. Isso foi uma loucura mesmo…(risos)”, diz Felipe.
A Copa do Mundo e o Brasil no exterior
Em decorrência da Copa, o país é o centro das atenções no mundo, seja pelo futebol, pela política, economia ou ainda pela cultura. Segundo analistas, o momento é propício para a consolidação de novos investimentos na área econômica e intercâmbios de cunho sociocultural.
O pintor, artista plástico e ativista de direitos humanos brasileiro, radicado na França, Antônio Veronese, é um dos maiores representantes da arte do Brasil na Europa e reforça o coro dos que apostam em um bom momento do país. Para o artista, alguns setores da sociedade brasileira disseminam uma imagem excessivamente pessimista com fins políticos e afirma que o Mundial é uma pauta positiva no exterior: “A imagem do Brasil hoje só é ruim nas páginas de parte da imprensa brasileira, que semeia o pessimismo. Aqui só se fala no sucesso econômico do Brasil em meio a uma crise maior que afeta todo o mundo. Os números do crescimento e do desemprego são altamente favoráveis ao Brasil, se comparados com os números europeus e, por isso, eles não entendem o mau-caratismo de parte da imprensa brasileira. O Brasil hoje é sinônimo de admiração e esperança, não só na França, mas em toda a Europa. E não sou eu que acho, são agencias internacionais importantes que avaliam em torno de 120 bilhões de reais o lucro para o Brasil. É preciso acabar com essa conversa fiada de ‘não vai ter copa’, esse viralatismo crônico. A Copa traz investimentos e coloca o país na pauta do mundo. Se o Brasil abandonasse a realização da Copa, haveria imediatamente três ou quatro países prontos a se candidatarem.”, opina.
Paulista da cidade de Brotas, Veronese já morou no Rio, onde desenvolveu um trabalho social junto a crianças e jovens carentes, em situação de risco. O engajamento é uma das características de suas obras e antes de deixar o Rio deu aulas de arte para menores infratores no Instituto João Luiz Alves, na Ilha do Governador. Com uma carreira de sucesso no Brasil e no exterior, em 2002 o artista passou a sofrer ameaças de morte devido ao seu ativismo e a denúncias feitas sobre a violência no país, indo morar definitivamente na França. Sua obra Just Kids (Apenas Crianças) é usada pela Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) para simbolizar os dez anos do Estatuto da Infância e da Adolescência (ECA), enquanto a obra Save the Children (Salvem as Crianças) é símbolo dos 50 anos da ONU.
Apesar da distância geográfica, Veronese se mantém ligado à cultura do país e confessa ser um aficcionado por futebol: “Adoro futebol e o maestro Tom Jobim , que detestava, dizia que só gostava de conversar de futebol comigo, pois só eu falava e ele só escutava. Eu visto a camisa e os amigos franceses vêm aqui em casa para acompanhar os jogos do Brasil, com cerveja e caipirinha. Há um grande interesse na França por tudo o que se passa no Brasil, o francês é louco pelo país”, conta.
Com forte tradição turística e já habituada a receber grandes festas como o Carnaval e o Réveillon, que estão entre os maiores do mundo, a estrutura da cidade do Rio de Janeiro foi ampliada para abrigar o recorde histórico de migração e ocupação hoteleira.
Segundo dados da Secretaria Municipal de Turismo do Rio de Janeiro, após o primeiro jogo na cidade, no último domingo (15), a taxa de ocupação de hotéis de cinco estelas é de 90% e estima-se que para a partida da final do torneio, no dia 13 de julho, essa taxa de ocupação chegue a 98%.
As praias e pontos turísticos também registram recordes de acesso. O Cristo Redentor recebeu mais de 50 mil visitantes desde o começo do Mundial na última quinta-feira (12), e a metade desse público acessou o monumento via Trem do Corcovado. No Pão de Açúcar, foram registrados mais de 5 mil visitantes por dia, representando aumento de 75% em relação à semana anterior.
De acordo com a projeção da agência Zenith Optimedia, o mercado global de publicidade deve crescer 5,4% este ano, alcançando 524 bilhões de dólares, impulsionado em parte pelos comerciais na TV durante a Copa do Mundo. Estimativas da agência de investimentos Magna Global também apontam um cenário de crescimento na receita publicitária impulsionado por maiores investimentos na mídia digital e em comerciais de TV associados à Copa do Mundo.
Para 2014, a estimativa do Interactiv Advertising Bureau Brasil (IAB) é que o investimento em publicidade online deva crescer cerca de 25%, divididos em R$ 4,679 bilhões de buscas e classificados e R$ 2,518 bilhões em display e redes sociais. Já a expectativa de crescimento para todo o mundo é de 27,9%, gerando um total de R$ 137,53 bilhões em investimentos, segundo dados do e-marketer. A taxa de crescimento é quase duas vezes maior do que a esperada para 2015, mas estima-se que em 2016 deve ser maior novamente por causa das Olimpíadas no Rio de Janeiro.
Contudo, o publicitário Marcelo Gorodicht avalia que o crescimento de mercado é sazonal vinculado à agenda: “O mercado publicitário brasileiro já é reconhecidamente um dos mais maduros e premiados do mundo, e acho que a Copa , assim como acontecerá nas Olimpíadas, foi um momento em que algumas das grandes marcas envolvidas no evento aumentaram seus investimentos, mas em seguida tudo volta ao normal.” O publicitário aponta ainda a necessidade de planejamento de longo prazo e de implementação de políticas de estrutura e continuidade.
O empresário Eldes Saullo também salienta a importância de maior investimento em ações estruturais para viabilizarem um crescimento duradouro: “Não arrisco uma previsão, mas muita coisa precisará mudar: saúde, educação, tributação, políticas trabalhistas e reforma política”, sentencia.
Antônio Veronese ressalta que houve crescimento significativo na última década e que as medidas de redução da desigualdade precisam avançar: “Registramos diminuição de 75% da mortalidade infantil, redução absurda da repetência escolar, acesso sem precedentes às universidades. O Brasil, assegurando escola e alimentação, quebrou a espiral de produção de bandidos que existia. A criminalidade ainda está alta, mas ela diminuirá porque, simplesmente, o Brasil está dando a meninos carentes oportunidades e condições que eles antes não tinham nos governos que precederam a Lula.”, prevê o artista.
*Sheila Fonseca é jornalista, colaboradora do Vermelho