Ato político marca lançamento de livro de Aldo Arantes no Rio
Um ato político cultural marcou o lançamento do livro de memórias do comunista Aldo Arantes, Alma em Fogo – Memórias de um militante político. O evento aconteceu na sede da OAB, no Centro do Rio de Janeiro, na noite desta segunda-feira (19). Na ocasião, o presidente nacional do PCdoB, Renato Rabelo fez um pronunciamento sobre fatos marcantes da história do Partido em decorrência do histórico de militância do autor.
Publicado 20/08/2013 12:58
Leia abaixo, o discurso de Renato Rabelo, no ato político:
Revelado em seu novo livro — Alma em Fogo — Aldo Arantes através da sua autobiografia discorre de forma fluente e flamejante quase seis décadas de vida e de incessante militância, com presença destacada em acontecimentos marcantes de nossa história. Percorre assim, do final dos anos 1950, passando pela luminosa década de 1960, até nossos dias, um período importante da história do Brasil muitas vezes como protagonista e, também, como autor da interpreção deste rico período histórico, a partir da visão de um ativo militante de esquerda de feitio revolucionário.
Com esta concepção, escassa nas diversas interpretações existentes dessa etapa, produz por meio de seu livro significativa contribuição para compreensão dessa quadra de nossa história.
A década de 1960 condensa, como epicentro de uma época, a fronteira de um período histórico e o limiar de um novo tempo. O cenário mundial se apresentava como de grande revolvimento político e social com o ocaso do velho colonialismo e o desenvolvimento de revoluções democráticas e nacionais, com massivas mobilizações. No Brasil, a renúncia de Jânio Quadros em agosto de 1961, levara os generais das três armas a perpetrar um golpe de direita, impedindo a posse legal, constitucional, do vice-presidente da República, João Goulart. Leonel Brizola — então governador do Rio Grande do Sul — liderou bravamente a célebre Campanha da Legalidade. Aldo Arantes, recém-eleito presidente da UNE, protagonizou a ação dos estudantes de denúncia do golpe e de resistência que atingia os estudantes de todo país.
Essa campanha liderada pela UNE, com Aldo presidente, galvanizou a ação estudantil sendo um despertar que iria contribuir para projetar o ascenso democrático pelas reformas de base no governo Goulart, levando à ira a direita e as forças conservadoras, promovendo uma verdadeira clivagem política no país. A direita, desesperada, barrou este movimento democrático recorrendo às armas. Desfechou o golpe militar em 1º abril de 1964, contando inclusive com apoio logístico e político dos Estados Unidos.
Destaco este aspecto inspirado na narrativa de Aldo. A minha própria militância política ganha impulso neste momento. O impacto da Campanha da Legalidade desperta em mim entusiasmo e convicções políticas atraído pelas acesas e combativas assembleias e mobilizações estudantis. Tinha recém ingressado na Faculdade de Medicina da UFBA, e assim como em muitos jovens dessa época, adquiri convicção e descortinamos horizontes, com a “virada” alcançada, na posse de Jango, em defesa de uma nação soberana, democrática e justa.
Também nessa formação avançada contribui para a brilhante iniciativa configurada no CPC (Centro Popular de Cultura) da UNE. Com o golpe militar de 1964, grande parte dessa juventude que despertava desde então — ávida por transformar o país, de forma decidida e generosa — deixa a universidade em levas para se dedicar de corpo e alma à luta pela democracia contra o regime ditatorial. Por isso os jovens eram o alvo principal da perseguição e violência dos governos militares.
Outro destaque quero sublinhar impulsionado pela exposição de Aldo em seu livro. Aldo foi um dos fundadores e artífices da Ação Popular, que veio a se tornar uma destacada organização revolucionária, ampliando sua influencia além dos estudantes, que era hegemônica, até aos meios dos operários e camponeses. Eu ingressei na Ação Popular em 1964, após o golpe militar. Foi na AP que eu e Aldo trilhamos a mesma trajetória de resistência à ditadura militar. Nos identificamos com a mesma orientação e rumo ao lutarmos para transformar a AP de uma organização de ideais cristãos libertários em uma organização revolucionária, chegando a se constituir numa organização revolucionária marxista. E num vivo processo de luta de ideias e de embate político lideramos — Aldo, eu e Haroldo Lima — a incorporação da ampla maioria desta organização ao Partido Comunista do Brasil.
O PCdoB era produto da reorganização do Partido Comunista do Brasil em 1962, vertente que superava o revisionismo e o reformismo do PCB. O partido reorganizado é que vingou na luta contra o regime militar, e se junta em 1972, auge da resistência anti-ditatorial, com a AP, importante organização de origem cristã, que se forjava na resistência à ditadura avançando para uma concepção comunista.
Duas correntes de origens distintas, produto do Brasil da resistência democrática e popular, se encontraram então na mesma concepção ideológica e política, permitindo o fortalecimento, a continuidade da legenda comunista de maior influencia no Brasil nos dias atuais. Tenho sentido orgulho, junto com Aldo e Haroldo de termos tido um papel de artífices desse empreendimento unificador que vincou um pensamento ideológico e partidário avançado, que teve papel protagonista pelo fim do regime militar, pela democratização do país, pelo novo ciclo político — aberto em 2003 — com a eleição presidencial do líder operário Luiz Inácio Lula da Silva, e começar a governar pela primeira vez o Brasil.
No final do regime militar a Anistia conquistada pelo movimento democrático libertava os presos políticos das prisões. Os anistiados voltavam, os que viviam na clandestinidade reapareciam. Aldo, saído da prisão, juntamente conosco tem relevante papel na reestruturação do PCdoB, que tinha sido atingido seriamente pela repressão da ditadura. Dirigentes destacados foram assassinados nos cárceres do regime militar. Inúmeros quadros foram trucidados na resistência armada do Araguaia.
Aldo compõe conosco a reorganização do coletivo dirigente da terceira geração do Partido Comunista do Brasil, liderada pelo saudoso João Amazonas, e compreende hoje a quarta geração do Partido. Aldo, com seu elevado compromisso partidário e com o povo brasileiro, passa a desempenhar intensa atividade parlamentar, exercendo desde 1983 o mandato de deputado federal varias vezes, e de vereador em Goiânia. Teve papel destacado na Constituinte de 1987/88, notabilizando-se na luta antilatifundiária pela reforma agrária e pelos direitos dos trabalhadores e em defesa da soberania nacional. Compôs sucessivamente o núcleo da campanha presidencial de Lula, sendo o Secretario Executivo da importante jornada em Defesa do Brasil, da democracia e dos direitos do povo que deu a marca à campanha liderada por Lula. Aportou valiosa contribuição em seu livro sobre “O FMI e a nova dependência brasileira”.
Aldo Arantes tem uma característica saliente na sua militância. Sempre atento às questões candentes do curso transformador, se empenha profundamente e de forma consequente em torno das causas que configuram a pedra de toque das mudanças. É precursor no desenvolvimento da compreensão dos fundamentos da questão ambiental na concretização de um Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento, exposto no programa do PCdoB. Procura aprofundar uma consciência ambientalista no seio do PCdoB e entre aliados, num esforço persistente à luz da teoria marxista e em face da defesa da soberania dos países em vias de desenvolvimento.
Hoje, ele participa com ardor em viabilizar a persistente tarefa do PCdoB e das forças democráticas e de esquerda, acerca da concretização de uma Reforma Política democrática. Agora mais ainda, em resposta aos clamores das ruas. Faz parte e dá destacada contribuição na Comissão de Reforma Política da OAB.
O seu livro Alma em Fogo — hoje lançado neste evento composto de muitos amigos, militantes, e lideres representativos de vários setores da nossa sociedade — traz uma riqueza e variedade de conhecimentos da História do Brasil contemporâneo e apresenta uma atualização para nós próprios da mesma geração e, sobretudo para referência imprescindível das novas gerações. Em conversa com a presidenta Dilma Rousseff ela me perguntou o que mais poderia destacar da nossa geração (Ela é da mesma geração). Respondi que era o orgulho que tinha da geração de lutadores de nossa época. Aldo Arantes tem papel saliente entre estes lutadores.
Aldo Arantes se distingue como exemplo de elevada e longa militância devotada, ardorosamente comprometida, leal e solidária na sua experiência de vida. Sempre coerente com sua opção ideológica e política. Penso que Alma em Fogo vem ocupar um lugar na historiografia do curso político contemporâneo brasileiro. Em nome da Direção e de toda militância do PCdoB, parabenizo Aldo Arantes por mais esta fecunda contribuição.