Lei Magnitsky, as verdadeiras intenções dos Estados Unidos
Quando se esperava justamente um alívio nas tensões entre Estados Unidos e Rússia depois da reeleição de Barack Obama, o Congresso dá um passo atrás e desvela a cara oculta na célebre frase de "reinício" das relações bilaterais.
Por Odalys Buscarón, na agência Prensa Latina
Publicado 17/12/2012 18:24
A aprovação da lei sobre a lista de "Magnitsky" foi tão inesperada como desagradável para Moscou, ainda que tenha sido sancionada pela maioria dos votos de republicanos e democratas, contrários a uma melhoria nas relações russo-estadudinenses.
Obama não esperou o fim do mês para dar sua assinatura e o fez "considerando a proposta legislativa um passo importante" nas relações bilaterais, em referência à anulação da emenda Jackson-Vanik, que normaliza os vínculos comerciais entre os dois países.
O Senado aprovou o projeto – em um pacote único com a lei da lista de Magnitsky – em 6 de dezembro, depois de ter recebido a aprovação na Câmara de Representantes, duas instâncias onde os ânimos antirrussos têm forte influência entre os setores mais conservadores, apontam analistas.
O regulamento, com efeitos no campo dos direitos humanos, com toda a intenção leva o sobrenome do auditor do Fundo de Investimentos Hermitage Capital, que faleceu na prisão em 2009 acusado de estelionato e evasão fiscal.
Segundo a redação final, a ata concede faculdades ao Departamento de Estado para adotar represálias contra aquelas pessoas que, segundo critério de Washington, violam os direitos humanos na Rússia, por isso que autoridades e políticos russos a veem como ingerência.
O texto essencialmente proíbe a entrada a território estadunidense de funcionários públicos russos, culpados pela morte de Magnitsky, sobretudo aqueles vinculados com os órgãos de segurança e o sistema penitenciário, além de congelar suas contas em bancos norte-americanos.
Foram poucas as ocasiões na alta política nas quais conincidiram o oficialismo russo e a oposição parlamentar; e no vetor russo-estadunidense muito menos, motivo pelo qual o Kremlin tem sido alvo de críticas das forças contestatárias.
Guennadi Ziuganov, líder do Partido Comunista da Federação Russa (PCFR), afirmou que a lei estadunidense desrespeita os cidadãos russos. "É uma arbitrariedade, que dá luz verde à ingerência em nossos assuntos internos, o que é totalmente inaceitável", sentenciou o político.
Em sintonia com o resto dos dirigentes de outras organizações, Ziuganov prometeu que o projeto preparado pela Duma estatal (câmara baixa) como contra-resposta à ata de Magnitsky será aprovado em breve, "com o voto de todos", no Parlamento.
Segundo o titular da câmara baixa, Serguei Naryshkin, o documento em forma de lei foi proposto pelos quatro líderes das frações parlamentares: o governante partido Rússia Unida, o Comunista, Liberal Democrático e Rússia Justa.
O presidente da comissão de Relações Internacionais da Duma, Alexei Pushkov, assegurou que a maioria dos deputados tende a favorecer um contra-projeto mais severo que a versão estadunidense.
A Duma durante a plenário de sexta-feira aprovou em primeira leitura a resposta legislativa à lista de Magnitsky, na mesma linha que proibições de visto a estadunidenses e sanções financeiras aos envolvidos na violação de direitos humanos de cidadãos russos.
Verdades ocultas vêem à tona
Para a politóloga russa Veronica Krasheninnikova, o verdadeiro sentido da Lei "Magnitsky" é outro, e não o que seus autores pretendem usar: o alegado pretexto de defender os direitos humanos e de condenar a Rússia por supostas violações.
Criaram com isso um instrumento adicional de pressão política sobre a Rússia e outra frente na guerra propagandística contra nosso país, afirmou a diretora geral do Instituto de Investigações e Iniciativas de Política Exterior.
Ao mesmo tempo querem mobilizar, "demonizando a Rússia", o Congresso dos Estados Unidos e toda a opinião pública estadunidense contra nós.
É sintomático também que a lei seja aprovada em um contexto interno de protesto social, exacerbado pela chamada oposição não sistêmica, depois da reeleição do presidente Vladimir Putin, observou a especialista.
Por isso que não é um equívoco afirmar que foi um sinal de apoio aos elementos antigovernamentais e pró-ocidentais.
Estas medidas são uma amostra de que Washington mudou da retórica "do reinício" nas relações, assumida por Obama, por um cenário de medidas e ações drásticas, alertou Krasheninnikova, para ilustrar como a lei tem um reflexo direto e indireto na interação russo-estadunidense.
A especialista lembrou do extenso prontuário que os Estados Unidos têm como o maior violador dos direitos humanos no mundo.
Citou as torturas a prisioneiros sem devido julgamento, as prisões ilegais da Agência Central de Inteligência (CIA) na Europa, os voos secretos, os sequestros e assassinatos seletivos com aviões teleguiados (drones). A Casa Branca utiliza o tema dos direitos humanos como instrumento de pressão política e desestabilização da situação interna dos Estados que tomam um curso independente de Washington, explicou a politóloga russa.
O titular da comissão parlamentar de Relações Internacionais da Duma, Alexei Pushkov, disse que esse "enfoque seletivo dos Estados Unidos merecia uma resposta nossa".
A Rússia, expressou o deputado e analista internacional, pode tomar medidas de represália com pleno direito, inclusive mais severas para as pessoas que violam não só os direitos dos cidadãos russos no exterior, mas os conceitos universais de direitos humanos.
A medida, para muitos entendidos da matéria, aponta de qualquer maneira a uma mudança nas relações, o que ficou evidente nas ásperas declarações de funcionários públicos da Casa Branca sobre a Rússia, e nas réplicas de Moscou, ainda quando o diálogo Obama-Putin aparenta o contrário.
O chefe do Kremlin parabenizou o mandatário democrata por sua reeleição de novembro e o convidou a visitar Moscou no próximo ano, em uma data a ser decidida pelas instâncias diplomáticas, segundo anunciado.
Enquanto isso, para a Chancelaria e as duas câmaras do Parlamento russo, os legisladores estadunidenses "continuam vendo a Rússia não como um sócio, mas como um inimigo", o que nos faz pensar nas verdadeiras intenções da Lei "Magnitsky".
*Chefa da sucursal da Prensa Latina na Rússia