Chile: governo é criticado por tolerância à tortura policial

Casos de sequestros e de nudez forçada de jovens manifestantes ocorreram em grande número no Chile em 2012. A falta de vontade política para combater os casos de tortura por agentes policiais contra a população civil foi o tema de dois documentos divulgados nesta segunda-feira (10).

Por Victor Farinelli, de Santiago

protestos no Chile

O INDH (Instituto Nacional de Direitos Humanos do Chile) e o grupo de observadores Fundação Casa da Memória escolheram o Dia Internacional dos Direitos Humanos para a divulgação de seus relatórios. É a mesma data celebrada por grupos de apoio à ditadura por ser o aniversário do falecimento do ditador Augusto Pinochet (1973-1990), morto em 2006.

Entre muitos aspectos levantados pelos dois informes, o dos casos de tortura por policiais contra manifestantes, ou dentro de delegacias durante controles de detenção, foi o que recebeu destaque negativo especial por ambos os organismos.

Em seu terceiro informe anual, o INDH celebrou que pela primeira vez o governo de Sebastián Piñera enviou um representante para o evento de apresentação do documento (o ministro do Interior e vice-presidente da República, Andrés Chadwick). O INDH chamou a atenção do representante do governo para o crescimento no número de denúncias de casos de abusos policiais em manifestações populares. Além do uso de armamento letal, como balas metálicas, na repressão a manifetações, também foram denunciados casos de tratamentos humilhantes contra civis, inclusive menores de idade, como nos casos de nudez forçada de estudantes secundaristas, denunciado pelo instituto em agosto de 2012.

A presidenta do INDH, Lorena Fries exigiu que o governo modifique com urgência os procedimentos policiais, sobretudo os das tropas de Forças Especiais, ligados a controles de manifestações. “Os casos que pudemos analisar este ano revelam que a polícia chilena ainda está marcada internamente por visões que não permitem o reconhecimento dos direitos humanos do cidadão como algo fundamental e inatacável”, defendeu Fries.

Ela também lamentou o fato de que tanto os casos de nudez forçada quanto os dos chamados “sequestros express” de estudantes, denunciados também em agosto de 2012, tornam urgente a criação de um mecanismo nacional de prevenção da tortura. Vale lembrar que, em fevereiro de 2009, a ex-presidente Michelle Bachelet (2006-2010) assinou o protocolo da Convenção Internacional Contra a Tortura, o que obriga o país a criar esse procedimento e a oferecer capacitação permanente de suas forças de segurança pública para evitar os excessos policiais.

Segundo Fries, “a falta de uma politica específica contra a tortura nos faz pensar que carecemos de uma vontade maior por parte do governo de gerar as transformações que essas instituições de controle da ordem pública estão necessitando há muito tempo”.

Abusos contra menores

O informe da Fundação Casa da Memória, o segundo entregue pela instituição criada e administrada por observadores de direitos humanos, traz maiores detalhes sobre a quantidade de casos de manifestantes feridos e agredidos durante marchas estudantis e regionais, como as de Aysén e de Freirina.

Segundo a organização, este ano foram realizadas em todo o país 292 manifestações sociais, sendo que somente 48 foram autorizadas pelo governo, o que também evidencia, segundo os observadores, uma política de criminalização dos protestos sociais por parte de Sebastián Piñera.

Um dado agravante, segundo a Casa da Memória, é o fato de que tanto os casos de nudez forçada, como os de sequestros express, tiveram estudantes menores de idade como vítimas preferenciais.

Segundo Marta Cisternas, coordenadora dos observadores da Casa da Memória, não foi possível levantar uma cifra confiável do número contra menores neste ano, porque não existe uma instituição que atue nesses casos.

Marta explica que o próprio menor não pode fazer uma denúncia por abuso sofrido, pois “é preciso que seus pais tomem a iniciativa de denunciar, e que esses muitas vezes não o fazem por medo ou porque tampouco existe uma instituição capaz de respaldar a família, combatendo também o medo a represálias”.

Fonte: Opera Mundi