Patinhas: homenagem ao companheiro de luta Sérgio Miranda
Sua imagem de lutador pelas causas populares, em defesa da democracia e de uma sociedade socialista, de um companheiro sempre sorridente, solidário, de ampla visão de mundo permanecerão na memória de seus companheiros de luta, familiares e amigos.
Publicado 05/12/2012 12:10 | Editado 04/03/2020 16:28
Conheci Sérgio Miranda na década de 60 quando éramos estudantes da Universidade Federal do Ceará (UFC) e atuávamos no movimento estudantil. Eu presidia o Diretório Acadêmico de Engenharia e o “Zó,” como Sérgio era chamado carinhosamente pelos amigos, liderava o Diretório Acadêmico de Matemática. Junto com Bergson Gurjão, Pedro Albuquerque, João de Paula, José Genoíno e Assis Aderaldo e outros formávamos o Comitê Universitário do PCdoB na UFC. Naquele período Zó destacou-se como uma das mais queridas e respeitadas lideranças estudantis.
Em 1969, ele foi impedido pelo Decreto 477 – espécie de AI-5 da educação – de efetuar sua matrícula na UFC e passou a se dedicar mais ainda ao trabalho de organização do PCdoB no Ceará. Com o recrudescimento da repressão mudou-se para a Bahia onde eu já estava e, na clandestinidade, atuamos juntos na estruturação do Partido naquele estado. Era o início da década de 70 quando conheci e comecei a namorar a então estudante de enfermagem Noélia Ribeiro, minha companheira até hoje, e o Zó conheceu a estudante de engenharia Cristina, a quem amou até seus últimos dias de vida.
Nos meados de 1972, após o início da Guerrilha do Araguaia, Zó segue para São Paulo para se integrar a Comissão Nacional de Organização ao lado de Pedro Pomar e Haroldo Lima. Sua tarefa era fazer a ligação entre o núcleo central do PCdoB e os quadros partidários que atuavam em vários estados. No final de 1973 Noélia e eu fomos deslocados para São Paulo e lá reencontramos Zó exercendo o seu novo papel junto à Direção Nacional. Eram tempos muitos difíceis em que o Partido foi duramente perseguido e perdeu vários quadros assassinados pela repressão e aquela era uma tarefa muito arriscada, que exigia firmeza e coragem, qualidades que não faltavam ao Zó.
Em 1975 fui morar na região amazônica e somente voltaria a encontrar a camarada e amigo querido após a anistia ao buscar contato com a Direção Nacional. Em 1981, Noélia e eu o escolhemos para ser o padrinho de nosso primeiro filho, Carlos Ângelo.
No início dos anos 80, Zó passou a morar em Belo Horizonte e logo se tornaria uma liderança política na cidade e em Minas Gerais. Foi eleito vereador pelo PCdoB em 1988 e entre 1993 e 2006 foi eleito seguidas vezes deputado federal. Por duas ocasiões exerceu com destaque o papel de líder do PCdoB na Câmara dos Deputados, deixando marcas de excelente parlamentar, de relacionamento cordial com deputados de todas as correntes partidárias, de bom articulador e profundo conhecedor dos assuntos que debatia, em especial sobre questões orçamentárias, tema em que se tornou uma das referências no parlamento nacional.
Em 2005 afastou-se do PCdoB, mas sempre manteve contato com os nossos parlamentares federais, com a Direção Nacional e com muitos militantes comunistas, num relacionamento respeitoso e de troca de ideias sobre a conjuntura política nacional e internacional.
Nosso último encontro foi em outubro de 2009 nas homenagens feitas ao nosso camarada Bergson Gurjão, sepultado muitos anos depois de tombar nas matas do Araguaia. Na ocasião, junto a José Genoíno pude abraçar o velho amigo e relembrar o nosso convívio de amizade e de companheiro de luta.
No último dia 21 de novembro, Sérgio Miranda e eu fomos agraciados com a Medalha do Mérito Legislativo da Câmara dos Deputados, em Brasília. Ao reencontrar Cristina, que o representava na solenidade, soube que o seu quadro de saúde tinha se agravado e as esperanças de sua recuperação já eram muito pequenas. Na oportunidade, por solicitação da bancada federal do PCdoB, gravei uma mensagem ao Zó em nome dos comunistas cearenses relatando a nossa luta em comum e relembrando as inúmeras batalhas por ele vencidas e o desejo que superasse o enorme desafio de derrotar o câncer.
Infelizmente Zó não conseguiu reunir forças suficientes para vencer esta última batalha. No entanto, sua imagem de lutador pelas causas populares, em defesa da democracia e de uma sociedade socialista, de um companheiro sempre sorridente, solidário, de ampla visão de mundo permanecerão na memória de seus companheiros de luta, familiares e amigos. Todos sentiremos sua falta.
Carlos Augusto Diógenes (Patinhas) é presidente do PCdoB/CE
Este texto foi feito publicado no livreto da celebração religiosa em homenagem prestada em Fortaleza por familiares e amigos de Sérgio Miranda.