Mário Augusto Jakobskind: Para não esquecer jamais

Com o apoio de dezenas de entidades, entre as quais a ABI, o Grupo Tortura Nunca Mais, o CREA e o Clube de Engenharia, o Sindicato dos Economistas, foi lançada nestes dias, na Ordem dos Advogados do Brasil-RJ (OAB-RJ), campanha em favor do tombamento dos Centros de Tortura e apresentado o projeto Marcas da Memória.

Por Mário Augusto Jakobskind*

A iniciativa, proposta inicialmente pela OAB-RJ, defende a transformação em centros culturais e de preservação da memória dos principais locais usados no Rio para a tortura de presos políticos na ditadura militar: o DOI-CODI, no quartel da Polícia do Exército, na Tijuca, o DOPS, à Rua da Relação e a Casa da Morte, em Petrópolis.

Na justifica do projeto é assinalado que “nesses lugares, milhares de opositores do regime militar foram torturados e, muitos deles, assassinados”. Foi ressaltada que “não se deve deixar que as barbaridades lá cometidas caiam no esquecimento e isso é um imperativo para que elas jamais se repitam”.

Estão abertas sugestões para os projetos. Quem as tiver deve encaminhá-las para o endereço eletrônico gt.comissaodaverdade@oabrj.org.br.

Na justificativa dos projetos, a OAB lembrou também que na Argentina, Uruguai, Paraguai e Chile foram tomadas iniciativas semelhantes e os antigos locais de torturas hoje abrigam museus e centros de memória sobre os anos de chumbo.

Em relação ao Projeto Marcas da Memória, os apoiadores conclamam os candidatos a Prefeito do Rio que se comprometam com o mesmo, a exemplo do existente em Porto Alegre, fruto de um convênio entre a Prefeitura local e o Movimento de Justiça e Direitos Humanos.

O projeto Marcas da Memória consiste na instalação de placas e monumentos, com um símbolo padronizado identificador da iniciativa, em ruas, calçadas ou prédios que tenham sido prisões ou centros de detenção de tortura e desaparecimentos ilegais, tornando público que ali ocorreram graves violações aos direitos humanos ou que esses locais foram palco de relevantes acontecimentos na luta pela democracia e pelos direitos humanos.

Nada mais justo do que apoiar as iniciativas. Além dos vizinhos do Cone Sul em muitos outros países foram adotadas medidas como as propostas. Em Varsóvia, capital da Polônia, por exemplo, quase todas nas principais esquinas do centro encontram-se placas em bronze mencionando pessoas que tombaram vítimas dos ocupantes nazistas na Segunda Guerra Mundial.

Os campos de concentração onde milhões de seres humanos foram assassinados pela barbárie nazista foram transformados em museus. Jovens dos mais variados quadrantes visitam esses museus que têm por objetivo impedir que o acontecido naquela época seja esquecido.

E isso é necessário para que os brasileiros, sobretudo os jovens, sejam informados sobre os mais de 20 anos de ditadura. Para complementar não se pode deixar de lado a necessidade de serem abertos todos os arquivos daquele período hediondo.

Somam-se a isso, as mobilizações populares que devem ser feitas para ser tornarem efetivas todas as sugestões. Na apresentação da campanha em favor do tombamento dos Centros de Tortura e o projeto Marcas da Memória, o jovem estudante Rafael de Almeida, do Centro Federal de Escolas Técnicas do Rio de Janeiro (CEFET-RJ), apresentou a receita ao lembrar que no ano passado os estudantes ocuparam a sala da direção do Centro exigindo que fosse retirada a placa com o nome de uma das salas em homenagem ao Almirante Augusto Rademaker, golpista de 64. A exigência foi atendida.

Rafael revelou ainda que os estudantes do CEFET organizaram a Copa de esportes Osvaldão, em homenagem a Osvaldo Orlando, ex-jogador do Botafogo, morto pelos militares na guerrilha do Araguaia nos anos 70, e que prossegue a mobilização em apoio a Verdade, Memória e Justiça, segundo ele, “fundamental para que os jovens brasileiros conheçam a história do país”.

E cá entre nós, não tem sentido que algumas ruas, pontes e avenidas continuem com nomes de ditadores ou figuras notórias que tiveram responsabilidade nas violações dos direitos humanos durante a época da ditadura.

Por que continuar denominando Costa e Silva a ponte Rio Niterói? Por que manter o nome de Garrastazu Médici em um viaduto no Rio de Janeiro ou próximo ao Forte do Leme a estátua do general Castelo Branco, quando hoje se sabe que os generais de plantão que se revezavam no poder após a derrubada do Presidente constitucional João Goulart foram, em última instância, os responsáveis pelos desrespeitos aos direitos humanos?

Em Belo Horizonte havia uma rua com o nome Dan Mitrione, um agente da CIA que veio ao Brasil, a convite do então governador de Minas Gerais, Magalhães Pinto, para ensinar agentes policiais a torturar opositores do regime. Para a retirada do nome foi necessária mobilização popular.

Deu certo, por que então não continuar a mobilização?

*É correspondente no Brasil do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador do Pasquim, repórter da Folha de São Paulo e editor internacional da Tribuna da Imprensa. Integra o Conselho Editorial do seminário Brasil de Fato. É autor, entre outros livros, de América que não está na mídia, Dossiê Tim Lopes – Fantástico/IBOPE.