CPI incluirá trabalho escravo urbano nas investigações
O relator da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Trabalho Escravo, deputado Walter Feldman (PSDB-SP), afirmou que o grupo investigará a fundo também os casos de trabalho escravo no meio urbano. A declaração foi dada ao final da primeira audiência pública realizada pela comissão nesta quarta-feira (18).
Publicado 19/04/2012 14:35
Os participantes do debate concluíram que o trabalho escravo ocorre em todos os estados do Brasil, tanto em áreas rurais quanto urbanas e geralmente em atividades de mão de obra intensiva e não qualificada.
O Ministério do Trabalho informou ter resgatado 2.271 trabalhadores explorados em condições análogas à de escravidão em 320 estabelecimentos, ao longo do ano passado. A maior parte dos casos é registrada em atividades agropecuárias, em carvoarias e em práticas de desmatamento.
Casos graves
Na audiência pública, o ex-ministro do Trabalho e professor de Economia da Unicamp, Walter Barelli, disse que uma das características do trabalho escravo é a sua invisibilidade. Ele explica que essa prática ocorre principalmente nas fronteiras agrícolas, em pontos inacessíveis ou em porões de centros urbanos. Segundo Barelli, as vítimas nesse último caso seriam sobretudo migrantes.
Autor de vários livros sobre o tema, o sociólogo da Universidade de São Paulo (USP), José Martins afirmou que, depois de índios e negros, a vítima atual da escravidão são trabalhadores submetidos a um modelo fundiário concentracionista, que ainda usa mecanismos primitivos de acumulação de capital, apesar de o Brasil ser a sexta maior economia do mundo.
Martins fez um histórico dos casos mais graves desde as primeiras denúncias, na década de 1970. "Em 1986, em uma fazenda de Rondônia, trabalhadores eram surrados com vergalhos de boi, pedras amarradas nos testículos, amarrados a troncos de árvores, mãos sangrando mergulhadas em rios com piranhas. Em 1987, um jovem trabalhador foi queimado vivo em um canavial do Mato Grosso do Sul. Em 1989, em Rondônia, um casal de trabalhadores foi amarrado à cauda de um cavalo, arrastado na disparada e morto. Em 1990, em um fazenda do Pará, a polícia encontrou, no cocho do chiqueiro de uma fazenda, o corpo carbonizado de um trabalhador servido como ração aos porcos".
PEC do Trabalho Escravo
Para enfrentar essa situação, o coordenador-geral da Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae), José Armando Fraga Diniz Guerra, pediu a imediata aprovação da PEC que trata da expropriação de terras onde tais crimes são constatados. A matéria aguarda a votação em segundo turno na Câmara dos Deputados.
Guerra disse que o governo tem focado suas ações em prevenção, reinserção dos trabalhadores e repressão econômica aos empregadores, que não tem sido suficiente para acabar com a prática do trabalho escravo.
A secretária nacional de Inspeção do Ministério do Trabalho, Vera Lúcia Albuquerque, também reforçou o apelo dos convidados pela aprovação da PEC do Trabalho Escravo. Ela lembrou que a Organização dos Estados Americanos (OEA) e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) têm pressionado o Brasil a adotar normas claras de punição para os empregadores que se aproveitam desse tipo de mão de obra.
Definição de trabalho escravo
Vários deputados da bancada ruralista presentes na audiência reclamaram da subjetividade na definição de trabalho escravo. Para o coordenador da Frente Parlamentar do Agronegócio, deputado Mendes Moreira (PSD-RO), falta objetividade.
Para Vera, não há dúvida quanto aos critérios de trabalho forçado, jornada exaustiva e condições degradantes que definem o trabalho escravo. Mesmo assim, ninguém foi preso por isso até hoje.
"A legislação no Brasil é tão cuidadosa em dar oportunidades de defesa que a única pessoa punida pelo crime de trabalho escravo até hoje recebeu a pena de fornecer cestas básicas. Não adianta definir trabalho degradante: tem que se ver. E quando se vê, não se tem dúvida de que aquele trabalho é degradante. A jornada exaustiva é a que exaure o trabalhador. Já aconteceu morte de trabalhador no corte da cana, em São Paulo, porque eles trabalham por produção e o trabalhador se exaure para dar comida para a família dele".
De Brasília
Com Agência Câmara