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Novo salvamento grego: apenas um apaziguamento da crise

De acordo com a narrativa oficial, o euro foi salvo (mais uma vez) impedindo um descumprimento grego "desordenado" e contra o pano de fundo do "ativismo" do Banco Central de Mario Draghi.

Por Yannis Varoufakis, em Resistir.info

Chega de narrativa oficial. Pois, na minha avaliação, a visão dos nossos líderes proclamarem uma tal vitória contra a Crise tem um forte cheiro do momento em que Neville Chamberlain retornou de Munique, a contar a um aliviado público britânico que o acordo fora encontrado e a prometer-lhe "Paz no Nosso Tempo".

Naturalmente, tudo o que ele havia conseguido fora comprar tempo para que a guerra se tornasse mais forte, mais ameaçadora, de uma letalidade para além da compreensão. Analogamente, nossos líderes europeus apenas cederam a uma forma de apaziguamento. Não da Alemanha (uma vez que estes líderes são, para ou melhor ou o pior, alemães), mas sim da crise. Uma crise que, sob a cobertura de celebrações inócuas de "resoluções" e "salvamentos", está a tornar-se cada vez mais forte, mais desagregadora e eficiente no modo como corrói os próprios fundamentos da eurozona.

Se bem que baste declarar a afirmação de que o euro foi salvo para que se perceba a sua fragilidade, apresentarei três considerações:

Primeiro, o próprio estudo de sustentabilidade do FMI em relação à dinâmica da dívida da Grécia, que torna perfeitamente claro que para domar a crise da dívida grega, sob o plano atual, seria preciso uma cadeia de milagres – da espécie que o mundo pós-2008 está um tanto carente.

Segundo, enquanto os spreads têm estado a declinar (devido à espetacular ambidestreza do sr. Draghi para com os bancos, isto é, a LTRO [1] ), a verdadeira natureza da combinação de aumento dos desequilíbrios internos da eurozona e de uma ruptura completa do sistema inter-bancário da eurozona pode ser rastreada a partir do florescente montante do Objectivo 2 do Sistema Europeu de Bancos Centrais.

O Börsenzeitung informa que é de €511 mil milhões a soma agora devida pelos Bancos Centrais dos países em déficit àqueles países com excedente (essencialmente os Bancos Centrais da Alemanha e da Holanda). Uma ruptura do euro pode ter sido adiada pela LTRO do BCE, mas o crescimento do montante do Objectivo 2 é um sinal de que tudo o que estamos a testemunhar é um apaziguamento da crise.

Terceiro, num momento de recessão pan-europeia (a qual está distribuída de forma desproporcional) a total e absoluta falta de qualquer política para transformar poupanças ociosas em investimentos produtivos (especialmente nas regiões deficitárias) é o equivalente moderno de imaginar que a Paz pode ser obtida quando os Deuses da Guerra capturarem os detentores do poder. Não aceite a minha palavra quanto a isto. Aqui está a Der Spiegel a chamar a atenção de modo sucinto.

[NT] LTRO: Ionger-term refinancing operation, operação de refinanciamento a longo prazo