Para Cid Gomes Dilma está "na mão" do PT e do PMDB
A presidente Dilma Rousseff "fica na mão" de decisões tomadas por PT e PMDB no Congresso, afirmou o governador do Ceará, Cid Gomes (PSB), nesta quarta-feira (24), em entrevista concedida ao programa "Poder e Política – Entrevista". "Ela está absolutamente condicionada a decisões que PT e PMDB tomem", disse.
Publicado 25/08/2011 12:13 | Editado 04/03/2020 16:31
Para o governador, Dilma resolverá o problema se estabelecer "contrapontos" e colocar o PMDB "no seu devido lugar". Gomes sugere que a petista fortaleça o PSB, o PDT e o PC do B. Ele chama essas siglas de "terceira força". O político falou sobre o governo Dilma no programa conduzido pelo jornalista Fernando Rodrigues no estúdio do Grupo Folha em Brasília.
Na entrevista, Cid Gomes ainda defendeu o presidente do Senado, José Sarney (PMDB), que usou helicóptero da Polícia Militar do Maranhão em viagem particular. Ele também revelou pretensão de lançar o irmão mais velho, Ciro Gomes (PSB-CE), como candidato ao Senado em 2014.
Leia a seguir a íntegra da entrevista:
O governador do Ceará, Cid Ferreira Gomes, do PSB, cumpre seu segundo mandato no cargo.
Aos 48 anos, Cid Gomes é casado e tem dois filhos. É irmão mais novo do ex-candidato a presidente da República Ciro Gomes, que também foi governador do Ceará.
Cid Gomes formou-se em engenharia pela Universidade Federal do Ceará. Foi duas vezes deputado estadual e duas vezes prefeito de Sobral, cidade na qual nasceu.
Antes de se eleger governador em 2006, morou em Washington, nos Estados Unidos. Lá trabalhou como consultor do BID, o Banco Interamericano de Desenvolvimento.
Folha/UOL: Olá internauta. Bem-vindo a mais um "Poder e Política Entrevista".
O programa é uma realização em parceria da Folha de S.Paulo, do portal UOL e da Folha.com. O programa é sempre gravado aqui no estúdio do Grupo Folha em Brasília.
E o entrevistado desta edição do "Poder e Política" é o governador do Ceará, Cid Gomes.
Folha/UOL: Governador, muito obrigado por sua presença. O sr. teve uma convivência forte com o ex-presidente Lula e agora convive com a presidente Dilma. Qual dos dois é melhor na política?
Cid Gomes: Bom, depende do que se queira classificar como política. É claro que o Lula é um líder muito mais popular, é um líder de massa. É um líder forjado nisso. O Lula começou como líder sindical, trabalhou a vida inteira… O lula identifica aqui uma plateia e fala para a plateia, tem isso como instinto. A Dilma é uma política no sentido da administração. O Lula é mais político no sentido de contato com as pessoas, de carisma. E a Dilma é política no sentido de administração, centrada, com foco. Ambos acho que se completam.
Ela tem ido bem nos últimos episódios que resultaram na queda de vários ministros?
Acho que sim. Esse momento é um momento de você aprofundar objetivos. Certo? O Lula assumiu o Brasil numa condição absolutamente diferente que a Dilma assumiu. O Lula assumiu sem maioria no Congresso, assumiu depois de uma eleição disputada. O partido dele era praticamente único no primeiro turno e teve que formar uma maioria, com as características que já regiam a política brasileira nos oito anos de Fernando Henrique Cardoso.
A Dilma… a condição em que ela se elegeu, com uma maioria no parlamento muito mais forte, com a base de partidos muito maior, permite que ela agora apure um pouco mais. Ou depure um pouco mais, nessa linha do que se está fazendo, pela cobrança da imprensa, reduzindo concessões que foram feitas à política.
A presidente tem de fato protagonizado todos esses fatos ou tem reagido aos fatos que apareceram na imprensa? Eu pergunto porque os três ministros que caíram apareceram primeiro os fatos ou mal feitos na imprensa.
Eu quero concordar com você. Quem tem cobrado mais, certamente, é a mídia. Eu estou falando desses fatos recentes. Mas a composição do ministério da Dilma… não propriamente do ministério, mas a composição de governo, principalmente de segundo escalão, tem sido muito mais numa linha de quadros técnicos do que de quadros políticos. Isso, aspas, é um certo avanço para como estava, ou como vinha sendo a tradição Fernando Henrique e Lula. Ela concedeu menos à política no segundo escalão. O ministério, o primeiro escalão, é um ministério absolutamente político, com cotas partidárias etc etc.
O que impedia o presidente Lula ou até o seu antecessor, Fernando Henrique, de agirem da mesma forma?
A necessidade de uma maioria política, né. E, bom, veja bem, isso depende da fase de governo. O Lula no começo, mesmo precisando compor uma maioria… porque, repito, ele foi eleito num segundo turno enquanto no primeiro [turno] praticamente todos os partidos tiveram candidatos a presidente. [Estou] falando do primeiro mandato. Mas mesmo assim ele conseguiu e fez menos concessões. A partir do momento em que se fragiliza e o tempo desgasta o poder, é natural, é consequência natural, ele teve que conceder mais. O Lula viveu momentos dramáticos com aquele episódio de 2005, né. E ele teve que fazer concessões à política para que se mantivesse no poder. Alguns partidos de oposição protagonizavam e desejavam o impeachment do presidente.
Quando o senhor fala "concessões à política" posso entender que é um eufemismo, em certa medida, à concessão à fisiologia?
Você pode conceder à política e repartir o poder, que é uma coisa natural você repartir o poder num governo que não tem uma maioria parlamentar única. O PT tem, de 513 deputados, 70, 70 e poucos deputados. Então, para ele formar uma maioria, ele tem que governar com os partidos. Isso é absolutamente natural da política aqui e, talvez, só não na China, mas…
…ou em Cuba…
Nas democracias é necessário, é… Em Cuba a maioria se faz no processo. Aqui a democracia acaba fatiando o poder no que diz respeito ao parlamento. Então, é necessária essa composição. Daí a você, a um político que tem a prerrogativa de indicar, de participar da governança em uma área fazer fisiologia, ou fazer clientelismo ou, enfim, deturpar o exercício do poder é outra história.
Hoje, o Brasil, na esfera governamental, tem mais ou menos corrupção do que tinha há cinco, 10, 20 anos?
Eu acho que tem muito menos. Embora, aparentemente, ao grande público, você tem a impressão pela notícia, pela repetição da notícia, de que a palavra "corrupção" aparece muito mais no noticiário.
Por que isso acontece?
Porque nós estamos amadurecendo a nossa democracia. Nós estamos vivendo um processo de amadurecimento da nossa democracia. No passado, a gente viveu uma ditadura, saiu de uma ditadura em que os meios, Ministério Público, Tribunal de Contas estavam ainda muito vinculados ao poder. A própria imprensa no Brasil… a nossa economia fazia com que boa parte da imprensa dependesse de verbas publicas e isso acabava silenciando os mecanismos de controle. Hoje nós, com o amadurecimento da democracia, com o crescimento da nossa economia, os instrumentos oficiais, Ministério Público, Tribunal de Contas têm conquistado mais independência pelo amadurecimento da democracia e eu acho que a imprensa também, pelo crescimento da nossa economia, tem conseguido ter mais liberdade e mais independência dos recursos públicos para posicionar-se e, certamente, denunciar aquilo que há de…
O sr. falou de denunciar. Há alguns meses o sr. mencionou o então ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, como responsável pelos mal feitos que seriam cometidos na pasta dele. Alfredo Nascimento acabou saindo do cargo, houve uma substituição, mas, como é que se garante que isso não vai se repetir? Porque a impressão que se tem é que se trocam os ministros, mas o esquema montado por debaixo continua igual.
O que eu disse, lembro bem, são três adjetivos. Foram os seguintes: inepto, incompetente e desonesto. Eu não falei corrupto, que é diferente. Desonesto foi muito no sentido de que eu estive com ele algumas vezes, tratando de interesses do Estado do Ceará, de ações do Dnit, do Ministério dos Transportes no Estado do Ceará. Ele se comprometia comigo de resolver problemas apresentados por mim e no final das contas não fazia nada. Então eu disse que desonesto nesse sentido. Eu nem disse que ele era corrupto. Só repondo: eu podia agora depois que já saiu me alvorar… "ah, o danadão, fui que iniciei…". Eu não gosto disso, tá certo? Agora, é… O que garante que a "faxina", um termo que está muito em voga aí, ela tenha consequência é a imprensa, são os órgãos que têm competência constitucional e institucional para isso.
A presidente da República sucedeu ao presidente Lula. E o presidente Lula continua muito ativo na sua vida política, o que é um direito que ele tem. Mas o sr. não acha que, em certa medida, algumas ações do ex-presidente acabam colocando em cheque a credibilidade, a responsabilidade da presidente atual?
Limite entre o que o Lula vai fazer como figura pública, líder de um partido, um partido importante no Brasil, e a relação disso com possível interpretação de que ele está se intrometendo em coisas do governo é um limite muito tênue…
Qual é o seu ângulo de visão sobre isso?
Eu, olha… A liderança do Lula e o papel dele na democracia brasileira será ainda muito forte. O papel de deixar bem claro o limite entre ser uma liderança e ter uma possível interpretação de que ele continua agindo em coisas de governo, atuando como se presidente fosse, está na presidenta Dilma.
Eu digo isso porque eu convivi assim muito, muito próximo de algo muito semelhante. O Ciro [Gomes] era uma liderança emergente no Ceará e foi eleito governador pelo apoio indiscutível e pela força do ex-governador, que o antecedeu, Tasso Jereissati. E o Ciro respeitou sempre o Tasso. Até foram… preservaram aí uma relação até… dias atrás, deixando muito claro o que era o papel do Tasso enquanto líder do partido a que ele pertencia, que é a mesma situação Lula e Dilma, e o papel de governante. Então eu tenho tranquilidade, eu conheço a Dilma, conheço a Dilma bem e sei que o limite disso é muito demarcado para ela. E, enfim, tudo o mais não passará de… vão ficar notícias… mas o tempo se encarregará de mostrar que quem lidera o governo é, de fato, a presidenta Dilma.
Ela tem a ambição de em 2014 concorrer à reeleição ou o ex-presidente Lula vai tentar também concorrer ao cargo?
Eu disse publicamente, mas antes tinha dito para ele, Lula, e tinha dito para ela, reservadamente, Dilma. Se eu fosse a Dilma o que é que eu faria? Eu faria tudo para estar bem, para que o governo fosse um governo com a avaliação positiva, para que as coisas acertassem, para que o Brasil avançasse. Mas, como deferência… Isso é uma coisa minha, é uma coisa minha, é uma característica minha de valorar princípios éticos, entre os quais eu coloco gratidão como um dos mais importantes. Eu procuraria o Lula, às vésperas [da definição do candidato], estando bem… Tanto mais bem estivesse, mais à vontade estaria, para dizer para ele o seguinte: "Olha presidente, eu sou muito grato pela oportunidade, eu não seria presidente sem o seu apoio, é… e eu quero demonstrar essa gratidão… eu estou bem aqui, as pesquisas mostram que eu poderia ser candidato à reeleição, mas eu quero, acho que essa faculdade deveria ser sua". Eu faria isso. Se estivesse no lugar da Dilma. Se estivesse no lugar do Lula, eu diria para ela: "Não, você deve ir. Se você está bem, você deve ir. Eu ficarei aqui como alternativa para, se o projeto corresse algum risco. Mas você deve ir, a reeleição é um instituto natural de quem está bem e tal". Enfim, eu…
Como que ela reagiu quando o sr. disse isso a ela?
Não, nada. Ouviu. Ouviu.
E o Lula?
Também [risos]. Isso tudo é muito precário. Pode acontecer tanta coisa daqui pra lá… e tudo isso é muito precário. Só serve assim pra gente que está no dia a dia da política e está sempre pensando no futuro e tal…
O sr. foi eleito governador duas vezes, pelo PSB, agora não pode mais concorrer à reeleição… Pretende manter a aliança que teve com o PT lá no seu Estado ou o sr. acha que está muito longe para fazer essa previsão?
Não, nós temos uma eleição já no ano que vem para prefeito. Tudo o que eu puder fazer para preservar uma aliança no Ceará que vem conquistando vitórias, eu farei. Essa aliança inclui o PT, PMDB, incorporou alguns partidos aí, PDT, PP, enfim… são 15 partidos que compõem lá uma aliança. Então o que eu puder fazer para preservá-la… e o emblema maior disso certamente será Fortaleza. Porque cada outra cidade tem a sua característica. Vai ter lugar em que o PT vai concorrer com o meu partido, o PSB, isso é absolutamente…
O cabeça de chapa hoje em Fortaleza hoje é o PT…
Eu acho natural que permaneça o PT. Agora, acho que o PT… Uma coisa… a reeleição da Luizianne [Lins, do PT], a prefeita lá… né… é natural do processo que quem é candidato à reeleição tem a primazia. Isso não existe mais [ela já foi reeleita em 2008]. Então vai depender do poder de diálogo do PT com os demais partidos, entre os quais o PSB, o meu partido, e encontrar um nome que, em primeiro lugar, ofereça à população de Fortaleza a expectativa e a esperança de que haverá algo novo.
Houve um rumor recente sobre os esforços do prefeito de Sã Paulo, Gilberto Kassab, que está montando um novo partido, PSD, no Ceará e teria contado com a ajuda do sr., do seu irmão Ciro Gomes para estruturar esse novo partido no Estado do Ceará. Procedem essas informações?
O Ciro está cumprindo uma tarefa lá a meu pedido, para o PSB, Partido Socialista Brasileiro, que é o nosso partido, o dele e o meu, de estruturação e montagem do partido com vistas às eleições municipais. PSB. Alguém pode ter ouvido: "o Ciro está trabalhando lá ajudando a formação do PSB nos municípios". Como tem essa coisa, PSD, telefone sem fio, acabou então sendo veiculada essa notícia. Não procede em relação ao Ciro.
Eu estive com o prefeito Kassab e estamos lá de alguma forma sintonizados, fazendo, ajudando a formar o novo partido que é o PSD. Para nós era importante porque eu tenho sido muito procurado por lideranças de outros partidos que desejam sair do partido, muitos deles estão inclusive ameaçados de expulsão dos partidos em que estão e querem um partido novo. E a legislação brasileira é muito clara e diz que quando a pessoa sai para um partido novo, isso não coloca em risco o seu mandato. Então nesse objetivo, a gente tem procurado. Coisa que acho que o Kassab fez também com o Eduardo [Campos, governador] em Pernambuco, fez com o governador Ricardo Coutinho, na Paraíba, que também é do PSB. Enfim, o PSB… A história do PSD se você rememorar um pouco, ela nascia porque o Kassab pensou em ir para o PSB. Como a legislação colocaria em risco o mandato de pessoas, principalmente pessoas, deputados federais que estavam em início de mandato, que o iriam acompanhar, aí então criou-se o PSD para mais na frente fundir. Eu ali cantei a jogada e acho que é o que vai acontecer. Esse partido vai ficar com um número [de deputados] aí talvez equivalente ao PSB e aí depois eles não vão fundir. Mas de qualquer forma ele procurou… ele ao longo do processo sempre teve uma relação com o PSB.
O sr. já está antecipando que acredita que seja difícil essa eventual fusão no futuro?
Eu acho que sim, eu acho que sim. Se o partido ficar com essa faixa aí de 40 deputados como se está falando, vai estar equivalente ao PSB. Vai fundir por que, se ele é uma liderança incontentável nesse novo partido, vai dividir o espaço. Eu estou aqui vaticinando…
Na montagem do governo Dilma, o seu partido, o PSD, Partido Socialista Brasileiro, foi bem tratado de acordo com o tamanho que tem, com o apoio que deu?
Bom… se você olhar friamente quantos deputados federais [o PSB elegeu], o partido foi bem tratado. Dois ministérios [foram passados a políticos do partido: Integração Nacional e Portos]. Eu à época defendi: a gente tem um partido que tem 40 deputados, mas tem um partido que tem o Ciro Gomes. Por acaso é meu irmão, mas é o Ciro Gomes. Uma liderança nacional, uma das poucas lideranças nacionais. Você não enche duas mãos com nomes nacionais no Brasil. E o Ciro tinha saído do processo [de formação de alianças para a eleição de 2010] de forma enviesada, para encontrar um adjetivo aqui que agrade a todos…
Deixa só eu fazer uma pergunta: o PT tratou mal o Ciro Gomes ao forçar o PSB não deixá-lo ser candidato a presidente?
Olha, isso é natural na política. Na política não existe concessão. Quem fica falando essas coisas de gratidão, não sei o que, sou eu que coloco isso na política, mas a política é fria, por natureza é fria. O PT cumpriu o seu papel. Queria compor uma aliança o mais ampla possível logo no primeiro turno. O Lula pensava, a sua estratégia era ganhar no primeiro turno. E então, nessa estratégia, eles fizeram o que tinha que fazer. Procuraram e conseguiram convencer a base do PSB de que era melhor se aliar logo no primeiro turno. E essa coisa teve bônus e ônus.
O bônus foi: a gente acabou sendo o partido que elegeu o segundo maior número de governadores do Brasil. Nós elegemos cinco governadores. Só perdemos para um partido que elegeu oito. Nós estamos acima do PT, estamos acima do PMDB em quantidade de governadores. Temos o governador do Espírito Santo, o governador de Pernambuco, o governador da Paraíba, o governador do Ceará, o governador do Piauí…
Mas voltando, o sr. estava falando sobre ter sido bem ou mal tratado, daí o sr. achava…
Não, veja bem… Essa coisa… Eu é porque conheço a coisa friamente, mas conheço pessoalmente. Porque, no final das contas, o enviesado, quem saiu enviesado na história foi meu irmão, o Ciro. E eu vi isso, eu vi o seu drama, vi o seu sofrimento. O Ciro achava… eu estava dizendo do bônus e ônus, porque se a gente tivesse lançado… É muito difícil até fazer essas especulações, mas se a gente tivesse lançado um candidato a presidente, a gente talvez tivesse eleito menos governadores, mas teria eleito mais deputados. Assim penso eu. Nós sacrificamos a bancada federal, em nome de eleger, de fortalecer nossas bases regionais, com o não lançamento de uma candidatura própria. Se o Ciro tivesse sido candidato, era o nome natural do partido, acho que a gente talvez tivesse feitos menos alianças por governo e, consequentemente, talvez, eleito só três e tinha eleito mais deputados federais. O que é mais importante? Deputado federal ou governador? Isso, de novo, fica o questionamento…
…depende…
Pois é, depende pelo ângulo pelo qual você enxerga.
Agora, e na montagem do governo?
Eu estava dizendo, eu estava dizendo… bom, esse é um processo. Então o partido, por sua maioria, preferiu não lançar candidato. A forma como foi feito, é… machucou o Ciro. Eu participei de uma reunião em que estavam as principais lideranças do partido. Estavam lá o Eduardo [Campos, governador de Pernambuco], Casagrande [Renato, governador do Espírito Santo], o França [Márcio, líder do PSB na Câmara dos Deputados], enfim… várias lideranças do partido. E o Ciro disse: "olha, nesse ambiente aqui, discutido, conversado e tal, se o partido entendesse, se a gente conversar e entender que é melhor que eu não seja, tudo bem. Eu topo, me engajo, não sei o que e tal… Então eu só peço isso, que a gente converse".
E acabou saindo a decisão sem que houvesse essa conversa. Houve uma reunião… uma consulta aos diretórios, houve reunião da Executiva e anunciaram. E depois foram comunicar ao Ciro que ele não seria candidato. Então, isso machucou, né? Machucou o Ciro pessoalmente. Então, em função dessas coisas todas é que eu estava dizendo, na composição do ministério, eu tentei muito, foi oferecido… A Dilma o convidou, ligou para ele pessoalmente para ele vir para o Ministério da Integração. Mas no Ministério da Integração ele já tinha sido [ministro], não é, ele já tinha sido. Então, eu tentei que o partido, eu acho que o partido, se tivesse tensionado um pouco, no bom sentido, que é coisa natural da política, a gente acho que teria conquistado um espaço maior, com o Ciro participando. Até porque ele tem qualificações para isso.
O presidente nacional do seu partido, o governador Eduardo Campos, de Pernambuco, tem aspirações futuras na política. Ele deve tentar um voo mais alto como candidato a presidente já em 2014?
Acho que a conjuntura da época é quem vai dizer. Nós vamos viver de novo essa situação. Nós temos uma aliança com o PT, participamos do governo da presidenta Dilma e, enfim… O Ciro, quando cogitou ser candidato ele teve o cuidado de fazer aí a abstinência do poder. O que eu quero dizer: nos quatro primeiros anos do Lula ele foi ministro do Lula. Então ficaria muito feio se ele, tendo sido ministro do Lula até o final de 2006 ele saísse na última hora para ser candidato à Presidência. Mas então ele ficou quatro anos fora e trabalhou abertamente, publicamente, eticamente, a nosso juízo, para ser candidato à Presidência. Todas essa questões serão levadas em conta para efeito da decisão se, na sucessão da Dilma, a gente [o PSB] vai ter um candidato e se esse candidato é o Eduardo [Campos, governador de Pernambuco]. O Eduardo é certamente um nome credenciado.
E Ciro Gomes?
O Ciro, repito, é um dos dez nomes, continua sendo um dos dez nomes cogitados para uma empreitada nacional. Eu penso, e estou defendendo publicamente, que ele deva ser candidato ao Senado nessas eleições. O Ciro ainda é novo, tem 52 anos e pode no futuro cogitar.
Candidato ao Senado [Ciro Gomes], se for pelo Ceará, o sr. teria de renunciar ao seu mandato?
Isso. Eu teria.
E ele teria de voltar a ter de ter o título de eleitor registrado no Ceará…
Não. Ele acho que já fez isso. Já voltou o domicílio [eleitoral] dele para Fortaleza.
E nesse caso seria candidato ao Senado em 2014?
É o que eu tenho defendido.
E o que ele diz?
Ele acha que eu devo ser.
E ele quer ser o quê?
Se eu ficar… O Ciro já foi deputado federal. Não gostou da experiência…
A gente viu aqui em Brasília…
Pois é… Então, governador está impossível. Deputado federal, impossível. Senador, é só uma [vaga]. Então, se eu não for, seria vice-presidente ou presidente da República. Eu acho que, enfim [risos]… Eu vou defender a tese de que ele deva ser candidato ao Senado.
O sr. deseja ser o que em 2014?
Em 2014 eu quero ajudar no processo de sucessão, da minha sucessão, que já não será mais minha. Eu terei renunciado, obviamente, quero ajudar na campanha. Quero ajuda na campanha do governador, quero ajudar na campanha do senador, que ajudar a fazer uma bancada de deputados federais. E depois de 2014 eu quero ir para onde já estive, que é o Banco Interamericano [de Desenvolvimento]. Eu estive lá. Eu fui oito anos prefeito e fiquei dois anos sem mandato. Isso não mata ninguém. Você ficar dois anos sem mandato, ou quatro anos sem mandato, é até bom para arejar, para você sair um pouco. Às vezes você fica muito enfronhado nisso e perde um pouco a referência do olhar comum da vida pública.
A gente ouve muitas vezes aqui em Brasília que o sr., seu irmão, a família Gomes, não tem se dado muito bem com a cúpula atual do PSB. Procede?
Olha, nós tivemos momentos de tensão, principalmente nesse processo de composição aí do ministério da Dilma. Nós tivemos muitas reuniões e enfim… Mas eu acho que é uma coisa superada. Um dia desses o Eduardo [Campos, presidente nacional do PSB] aniversariou, eu liguei para ele, a gente tem tido uma boa relação. O Ciro também tem conversado com ele. Enfim, nós entendemos como natural do processo. A gente tem discordância em relação a algumas coisas. Eu acho, por exemplo, e defendi muito isso que a gente valorizasse o [deputado federal Gabriel] Chalita, que era um quadro, a meu juízo, o quadro em melhores condições competitivas para o principal mandato que vai ser disputado no ano que vem, que é a Prefeitura de São Paulo. E o partido, por cartorialismo, acabou perdendo, deixando que o Chalita saísse do partido. Então, eu contestei muito isso. E acho que isso é bom. A gente… Essa coisa da unanimidade tranquila demais não é bom não. A gente deve ter aqui e acolá umas divergenciazinhas que é isso que a maturar.
A presidente Dilma, alguns consideram que fica, às vezes, um pouco manietada na atuação do dia a dia por conta do gigantismo de PT e PMDB no governo. [Ela fica] refém, alguns diriam. O sr. concorda?
Concordo. Concordo e, se eu estivesse no lugar dela, analisando as dificuldades e naturalmente as oportunidades eu fortaleceria um terceiro pólo. Uma terceira força. E essa terceira força para mim é muito clara, que seria PDT, PC do B e PSB. Esses três partidos já têm aí uma tradição de atuação muito próxima, já compuseram um bloco na Câmara. Eu ajudaria a fortalecer [esse bloco].
O PSD é um caminho também para contrapor a PR, PP e outros partidos menores que acabam também criando problemas.
O sr. já disse isso à presidente?
Eu já disse publicamente isso.
Quando o sr. conversa com ela…
Não, não. Sobre isso eu não conversei com ela. Sobre isso eu não conversei com ela.
Por quê?
Acho que eu não tive a oportunidade.
O sr. acha então que ela deveria reforçar esse bloco…
E pode parecer também que eu estou legislando em causa própria, porque o meu partido é o PSB. Mas, sinceramente, não é por isso. Porque eu acho que é importante, na política, e no Executivo principalmente… No momento em que você fica na mão de alguém isso é ruim. Isso é ruim. Na hora em que você tem maioria…
A presidente está na mão do PT e do PMDB?
Absolutamente. Absolutamente. Absolutamente… No Congresso eu estou falando. No Congresso. Isso não quer dizer que ela esteja como um todo. No Congresso ela está absolutamente condicionada a decisões que PT e PMDB tomem.
E isso poderia ser mitigado…
Com o estabelecimento de contrapontos.
Dê um exemplo de como se estabeleceria esse contraponto.
Você tentar compor maiorias independentemente do PMDB.
O sr. acha que o PMDB deveria sair do governo?
Não. Não estou dizendo isso. Eu estou falando que você compondo a maioria independente do PMDB, você relativizaria o poder do PMDB. Colocaria no seu devido lugar. Eu acho que o PT… o PT é o partido da presidente. Então fica difícil… Como é que ela vai se contrapor ao partido dela? Isso aí é uma relação doméstica que eu não vou querer entrar. Mas os demais partidos, na hora em que ela tem alternativas, ela então relativiza o poder e a influência de cada um individualmente. Inclusive do PSB também, porque não… se é o PSB, o PC do B, o PDT que está criando dificuldade então o PMDB vai ser o contraponto para isso.
Recentemente, o ministro da Agricultura, Wagner Rossi, por uma sucessão de episódios que foram relatados. E o último foi ele ter viajado em um avião particular de um empresário que tinha interesses na pasta da Agricultura. O sr. citado em um episódio em que utilizou o avião de um empresário com negócios no Ceará para fazer uma viagem. É correta esse tipo de atitude?
Olha, eu não me vendo por uma viagem nem por nada. A minha consciência é tranquila. Se você for ver a relação do Estado com empresários que têm incentivos etc. etc. é uma relação absolutamente transparente. E essas relações não são feitas a partir de decisões pessoais. Os incentivos que a empresa, no caso aí a do Alexandre Grendene, tem não foram dados no meu governo. Já vêm de governos anteriores. Mesmo assim, alguma prorrogação que natural que tenha sido feita no meu governo é feita por órgão colegiado. Então não hã uma decisão pessoal. Esta viagem eu estava de licença do governo. A Alexandre passou… Ele ia para os Estados Unidos. Eu tenho uma relação com o Alexandre de 25 anos, pelo menos. Ele é meu amigo pessoal. E eu não tenho muitos amigos. A minha vida é fácil de ser pesquisada. Eu não tenho um rol de amigos muito grande. Tenho poucos amigos, Nesse meio empresarial, então, se eu tiver dois ou três é muito. Então, com ele [Alexandre Grendene] eu tenho uma relação muito antes de ser governador. E já viajei com ele em outras oportunidades. A viagem que fiz, ele estava indo aos EUA, para lá em Fortaleza naturalmente. Se eu não fosse ou se eu fosse. E eu fui com ele nessa viagem. Então eu sinceramente não vejo problema nisso aí.
Não está em discussão aqui se há ou não há favorecimento por conta da viagem. Mas a viagem em si. Não seria mais prudente quando ocupar o cargo de governador não aceitar esse tipo de carona?
Eu não aceitaria uma carona de quem eu não tenho relação e amizade. E se não tiver a convicção pessoal de que aquilo não será usado… ou pelo menos a pessoa… Usar, podem ter certeza todos que, eu repito, eu não sou comprável por viagem nem por nada. Tenho consciência tranquila em relação a isso. O Alexandre para mim não é um empresário, ele é um amigo. E eu não fui como governador. Se eu fosse aos EUA enquanto governador, eu iria em voo normal, custeado pelo Estado. Agora, ali foi uma viagem pessoal. Eu estava licenciado do cargo. Então, eu sinceramente eu não vejo problema em relação a isso.
No outro episódio anterior que o sr. fez uma viagem para a Europa e daí deu carona para sua sogra, o sr. também considera que não houve nenhuma impropriedade?
Eu pedi desculpas pelo fato. Não repetirei o fato. Agora, esse foi um caso que foi analisado e julgado pelo Tribunal de Contas do Estado. E eles chegaram à conclusão de que não houve recurso público gasto com o deslocamento dela. A aeronave já ia, ela ocupou um lugar e a sua hospedagem foi paga pessoalmente.
No que diferem esses casos [carona em jatinho de empresário e levar a sogra em viagem oficial], por exemplo, desse recente que nós vemos em Brasília agora do presidente do Senado, José Sarney, que se utilizou de uma aeronave, um helicóptero da Polícia Militar do Maranhão para ir até a sua ilha particular no Estado dele?
O que difere? Eu acho que fica ao juízo de cada pessoa diferir.
O senhor acha que no caso do presidente Sarney, do Senado, ele se encaixa também nessa categoria de que não cometeu nenhum ilícito?
Olha… isso é uma coisa… eu não gosto… dificilmente o papel de promotor, de acusador… não casa com a minha personalidade. Definitivamente não é o meu estilo. Mas veja bem, vamos, vamos tentar aqui fazer simulações. Eu fico me colocando no lugar das pessoas. Se o presidente do Senado chegasse ao Ceará e a sua segurança procurasse o governo do Estado do Ceará e dissesse: "O presidente do Senado está vindo aqui em tal dia e ele está pedindo a possibilidade de uma aeronave do governo o levar para outro local"…
A passeio? Digamos que a passeio, que foi o caso.
Que seja… que seja… Eu estou sendo franco e absolutamente sincero. Abstraia Sarney, abstraia Roseana. Comigo e o presidente do Senado… vamos lá, para botar quem foi o anterior a ele… Renan Calheiros. Presidente Renan, presidente do Senado está vindo ao Ceará e está pedindo que haja um deslocamento dele do aeroporto até…
…até Canoa Quebrada.
… até Cumbuco. Salvo engano, onde, não sei ele, ou enfim, já andou. Eu faria. Tá certo? Eu faria. Eu no governo do Estado faria isso. Sim.
Cederia uma aeronave da Polícia Militar?
Não, bom… Aí é aquela história. O Estado… bom aí… de novo… o que é que eu faria… o Estado tem contratos com aeronaves fretadas. Eu não iria tirar uma da Polícia Militar para fazer isso. Polícia Militar é chamada para urgências e tal e poderia alegar-se isso: "Olha, uma urgência deixou de ser atendida porque a aeronave estava sendo usada com outra finalidade". Tá certo? Agora, o Estado… eu estou falando especificamente do Estado do Ceará, que tem contratos com aeronaves fretadas e faria esse deslocamento. Eu já fiz isso. Tá certo? Eu já fiz isso. Pessoas me procuraram, autoridades e tal e já foi feito deslocamento. Sinceramente, eu já fiz, enquanto governador.
O senhor não vê nada mais grave então nesse episódio envolvendo o presidente José Sarney?
Olha, isso, de novo, fica ao juízo da população. Cada um faz o seu juízo, está certo? Eu, na situação, abstraindo aí essa questão Polícia Militar… se fosse uma autoridade vindo ao Ceará e pedindo do governo do Estado um deslocamento, o Estado já fez isso. Não vou nem dizer que faria. Já fez em outras oportunidades.
Governador Cid Gomes, do Ceará, muito obrigado por sua entrevista.
Obrigado, Fernando.
Fonte: UOL