Marcha das Margaridas reivindica em Brasília “um Brasil justo”
As milhares de mulheres que encheram as ruas de Brasília, nesta quarta-feira (17), na 4º Marcha das Margaridas, demonstraram organização e unidade na luta pelo desenvolvimento sustentável com justiça, autonomia, igualdade e liberdade, contra o modelo de produção rural vigente no país, que favorece o latifúndio, destrói o meio ambiente e expulsa as comunidades rurais. Do alto do carro de som, as oradoras faziam denúncias, apresentavam reivindicações e gritavam palavras de encorajamento.
Publicado 17/08/2011 14:50
A caminhada, que saiu às sete horas da manhã do Parque da Cidade, na área central da cidade, chegou pouco depois das 10 horas no Congresso Nacional, onde três carros de som comandaram a manifestação. Além dos discursos de lideranças dos movimentos sociais e parlamentares, as mulheres, acompanhadas por um bom número de homens, dançaram ao som do Canto das Margaridas: “Brasília está florida/ Estão chegando as margaridas”.
O sol e o ar seco – a umidade relativa do ar em Brasília nesse período do ano fica em torno de 20% – não desanimaram as manifestantes. A pedido da oradora, “para demonstrar a parceria nessa luta pela construção de um mundo com amor, solidariedade, igualdade e esperança no futuro”, as mulheres deram as mãos e dançaram o Canto das Margaridas ao som de tambores.
Representantes de cada uma das regiões discursaram. Elas destacaram que a concentração de terra no Brasil é a maior do mundo. E defenderam a democratização da terra como medida fundamental para garantir direitos do povo do campo e da floresta e o “desenvolvimento sustentável com justiça, autonomia, igualdade e liberdade”, mote da manifestação.
As manifestantes também lembraram que o modelo de produção vigente no Brasil favorece as grandes propriedades, o latifúndio, e destrói o meio ambiente, com o uso de muito agrotóxico, que envenena a terra, a água e os alimentos. E denunciaram ainda que os grandes projetos agrícolas expulsam as populações rurais, quilombolas e indígenas e aumentam índice de violência e prostituição.
Esperança e dignidade
O presidente da Contag, Alberto Broch, saudou as entidades organizadoras do evento “que traz esperança e dignidade para a mulher do campo, que tem dupla e tripla jornada”. E destacou as principais reivindicações das mulheres do campo, que vão desde a democratização dos recursos naturais, em defesa do agroextrativismo, da terra, da água e da floresta viva, até a ampliação da participação das mulheres do campo e da floresta nos espaços de poder e decisão política no país.
Para Liége Rocha, secretária Nacional da Mulher do PCdoB, que se misturou às manifestantes, “essa quarta edição da Marcha das Margaridas é uma demonstração de que as mulheres continuam avançando, avançando, avançando em busca da construção de um mundo de igualdade, garantia de seus direitos e desenvolvimento deste país. E disse ainda que “essa manifestação de mulheres do Brasil inteiro, que se mobilizaram, se organizaram e aqui estão, demonstra a vontade de transformar este país e ser protagonistas da história”.
A atriz Letícia Sabatela, da ONG Humanos Direitos, fez chorar as manifestantes ao prestar homenagem “a todas as mulheres que já morreram, mas cuja luta permitiu que hoje estejamos aqui, após séculos de opressão, confinação, exclusão, nós sabemos que hoje estamos aqui podendo protestar por um mundo mais justo e igualitário, por mais terra e água”, disse.
Novatas e veteranas
Quem veio pela primeira vez, se encantou. Quem já participou das outras edições também se maravilhou com a evolução do movimento. Todas prometem voltar na próxima edição. Elas acreditam que a manifestação consegue alterar a realidade que vivem em suas regiões, marcadas ainda por grandes dificuldades.
Antônia Martins da Silva, de Tamboril, no Ceará, que participa pela primeira vez, disse estar adorando. Ela considerou a manifestação muito bonita e acredita que ajuda a mudar a realidade da sua cidade, onde o acesso à terra é muito difícil. Aliado a isso, ela queixou-se da falta de assistência médica no campo. Antônia obedece ao perfil das manifestantes. Tem 55 anos, é solteira e mãe de três filhos.
Do outro lado do Brasil veio Waldemila Correia dos Santos, que mora em Presidente Epitácio, no Pontal de Paranapanema, em São Paulo. Ela, que participa pela segunda vez do evento, também se maravilhou com a manifestação e percebeu que está mais “evoluente” (sic). Na cidade dela, o problema não é a falta de terra. Ela diz que é assentada da reforma agrária, mas reclama da falta de assistência técnica. Waldemila, de 56 anos, separada, mãe de um filho, afirma sobre o resultado da manifestação que “não vamos conseguir 100%, mas vamos mudar”.
Evaneide Vieira Ribeiro, 51 anos, solteira, mãe de três filhos, veio do interior da Bahia. Ela também participa pela segunda vez do evento e manifesta o desejo de continuar participando. Em Canarana, na Bahia, onde vive, ela diz que tem terra, mas não tem recursos para investir na agricultura. Com a manifestação, que ela considera que melhorou muito desde a última vez, espera ver melhorar também a situação de vida na sua cidade.
No Sul, a situação das mulheres do campo já está mais evoluída. A queixa de Josefa Bolinski de Moura, 58 anos, casada, mãe de um filho, é de atraso no pagamento da Compra Direta. “A gente vive na Vila Rural e faz parte do Compra Direta. A gente produz e vende ao governo que distribui com creches, escolas, etc. Este ano, nós estamos com essa dificuldade (de receber o pagamento)”, conta ela. A manifestante que veio de Cidade Gaúcha, no Paraná, acredita nos resultados positivos da Marcha. “A gente tem esperança e fé para mudar, por isso a gente está aqui”, avalia.
O que faz um homem na Marcha das Margaridas? “Como em tudo na vida, ajudo e apoio a mulher”, diz Edimilson Fraga, 46 anos, casado, pai de duas filhas, que veio de Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, para participar pela primeira vez da Marcha das Margaridas. “Um movimento como esse não só altera (a realidade), como já alterou colocando mais mulheres nessa direção”, afirma.
Vários parlamentares também estiveram na Marcha das Margaridas. O senador Inácio Arruda (PCdoB-CE) e o deputado Assis Melo (PCdoB-RS) conversaram e posaram para fotos com as manifestantes. Na opinião deles, a Marcha das Margaridas representa “a reivindicação justa do povo brasileiro, muito mais que a dos banqueiros, que é a da usura”, resume o senador Inácio Arruda.
Com a presidente Dilma
A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), usando um chapéu igual ao das manifestantes, disse que “essa Marcha é especial porque é a primeira vez que ocorre com uma mulher presidindo nosso país”, destacando que é preciso avançar nas conquistas.
“Se por um lado temos a presidente Dilma Rousseff no Planalto, ainda temos no Congresso Nacional uma representação de mulheres muito pequena e essa realidade tem que ser mudada”, defendeu.
Os parlamentares, assim como as manifestantes, acreditam no poder de pressão do evento para ver atendidas suas reivindicações. “Consegue tanto que a presidente da República vai até elas, no Parque da Cidade, no ato de encerramento das ‘Margaridas’, porque considera importante o trabalho das mulheres brasileiras que produz, mas também cuida da mente”, afirmou o senador comunista.
A presidente Dilma já confirmou, por meio da Secretaria-Geral da Presidência da República, que encontrará as mulheres no ato de encerramento da Marcha das Margaridas, às 16 horas de hoje, no Parque da Cidade. O retorno das delegações aos seus respectivos estados acontece a partir das 17 horas.
De Brasília
Márcia Xavier