A Copa do Mundo dos Direitos Humanos, por Manuela D'Ávila

A imprensa brasileira lembrou, na última semana, que há um ano se iniciava a Copa do Mundo da África do Sul. Ao som de vuvuzelas, relembraram os melhores momentos e mostraram o que o evento representou, entre erros e acertos, para o país e para seu povo. Como não poderia deixar de ser, o tema teve repercussão no Brasil, afinal, em pouco mais de três anos seremos nós a receber o mundo em nossas terras.

Muito se tem falado sobre obras, licitações, mudanças de legislação, prazos, mobilidade urbana, infraestrutura (responsabilidade dos municípios) e tudo o mais que envolve sediar o maior evento esportivo do planeta. Os desafios não são poucos. E não dizem respeito apenas a essas grandes obras e investimentos. A Copa do Mundo atinge, também, áreas que, embora nem sempre estejam em evidência, afetam o mais importante dos envolvidos na Copa: o povo brasileiro.

Para além da dúvida – real e justificada – do nosso povo sobre os grandes investimentos, sobre segurança pública e sistemas de transporte, por exemplo, existe a preocupação da garantia dos direitos humanos em muitas das ações referentes à Copa. Alguns podem se perguntar: mas o que os direitos humanos têm a ver com a Copa do Mundo?

Dois temas, em especial, podem exemplificar: as desapropriações e a exploração sexual. A nossa Copa do Mundo pode ser a Copa que vai mudar, para sempre, a imagem do Brasil como país de turismo sexual e de exploração sexual de menores. A nossa Copa pode ser, também, a Copa que vai tornar exemplo a relação do Estado com seu povo, ou seja, um Estado que respeita o direito à moradia – quando da desapropriação de casas para a realização das grandes obras (especialmente as de mobilidade urbana).

Preocupa-me, nesse sentido, o caso da desapropriação das moradias para a duplicação da Avenida Tronco, na zona sul de Porto Alegre, uma das obras prioritárias, segundo a administração municipal. Mais de 1,7 mil famílias, que moram em quatro vilas, serão removidas. Para onde vão essas famílias, não está definido. Sabe-se que devem ser realocadas em áreas que ficam a três quilômetros de onde vivem hoje. Não se sabe, também, como se dará a remoção de escolas e creches, fundamentais para toda comunidade. Segundo cronograma, a obra se inicia em março de 2012. Há pouco tempo para o diálogo nesse caso.

Eventos como a Copa do Mundo têm, acima de tudo, um alto poder de transformação social. Foi assim na África do Sul – com a retomada do orgulho do seu povo, com geração de emprego e renda. Tem de ser assim no Brasil. Temos de nos organizar para que a marca da Copa seja de combate ao racismo e ao preconceito; de guerra ao turismo e à exploração sexual de menores; de assistência real às famílias removidas para a implantação de obras de mobilidade urbana que beneficiarão milhões de pessoas em todo o país.

O grande legado da Copa tem de ser para o povo brasileiro, assim, mudaremos as cidades para que os turistas vivam por alguns dias aquilo que queremos – os que aqui vivemos – todos os dias.

*Artigo publicado no jornal Zero Hora de 22/06/11